OPINIÃO

PEC dos precatórios: risco de suspender pagamentos em 2022

Muitas pessoas que ganharam ação na Justiça contra o governo federal (inclusive contra o INSS), e que achavam que iriam receber em 2022, correm o risco de tomar um tipo de “calote”.

Por Tiago Faggioni Bachur | 30/10/2021 | Tempo de leitura: 4 min
especial para o GCN

Muitas pessoas que ganharam ação na Justiça contra o governo federal (inclusive contra o INSS), e que achavam que iriam receber em 2022, correm o risco de tomar um tipo de “calote”. Ou seja, o governo pretende usar esse dinheiro para financiar um novo benefício, chamado de Auxílio Brasil (ou Renda Brasil) e também em favor de gastos com Emendas Parlamentares. Assim, quem ganhou ação contra a União poderá ficar esperando mais tempo do que já esperou até agora.

A luta para conseguir receber um direito por aqui no Brasil, não é fácil. Imagine, por exemplo, que o cidadão faz o pedido de seu benefício no INSS. A Previdência nega. Depois, esse mesmo cidadão recorre e o INSS torna a negar. Na sequência, quase sempre, contrata um advogado e ingressa com ação na Justiça (que já está “abarrotada” de outros processos). Às vezes nesse processo tem perícia, outras vezes ouve-se testemunhas. O INSS se defende. Junta-se provas. Pode ser que haja recursos para instâncias superiores. Depois de um certo tempo, sai a decisão, concedendo o almejado benefício. Após anos, o trabalhador vence todas as etapas e PENSA que vai receber os atrasados – que são os valores que não foram pagos na época própria. Ledo engano... Após fazer os cálculos (algumas vezes depois de muita discussão com INSS), esse crédito vai entrar em uma espécie de “fila” para receber, juntamente com outros credores que também possuem crédito para receber.

Se o valor for de até 60 salários mínimos, na prática, costuma demorar de 60 a 180 dias para ser pago. Nesse caso, chama-se Requisição de Pequeno Valor (ou simplesmente, RPV).

Se o valor a receber superar os 60 salários mínimos, chama-se PRECATÓRIO e vai ter que entrar no orçamento do governo para ser pago. Se a informação desse crédito chegar até 1º de julho, seria pago no ano seguinte. Se chegar depois dessa data, só no outro ano.

Em outras palavras, em regra, os governos (fala-se aqui no plural, porque são todos os governos – não só o atual, mas também os anteriores, e possivelmente até os futuros) são ótimos cobradores, porém péssimos pagadores. Quantos beneficiários que teriam que ter recebido desde o começo, acabam por esperar durante anos para ser pago o seu direito, gerando gastos públicos de toda ordem. Há aqueles que, infelizmente, nem conseguem receber em vida. É um verdadeiro absurdo.

Para piorar, como ressaltado inicialmente, está tramitando no CONGRESSO uma Proposta de Emenda à Constituição, encaminhada pelo governo chamada “PEC dos Precatórios”.

Nessa proposta encaminhada pelo Presidente da República, que encontra grande apoio dos Senadores e Deputados, pretende-se fazer uma espécie de SUSPENSÃO dos pagamentos desses PRECATÓRIOS, que seriam pagos no ano de 2022. É isso mesmo... Quem ganhou alguma ação contra o governo, e que está com a expectativa de receber no ano de 2022, corre o risco de ter que esperar mais tempo.

Isso quer dizer que quem tem até R$ 66 mil, as chamadas Requisição de Pequeno Valor (RPV), deve receber normalmente em 2022. As demais dívidas da União, segundo o texto da mencionada PEC, poderão ficar aguardando a disponibilidade orçamentária para serem quitadas (ou seja, até 2023), corrigidas pela taxa básica de juros (Selic).

Mas o que o governo pretende fazer com esse dinheiro que não será paga para quem estava esperando?

Caso aprovada a referida PEC, o Governo Federal pretende usar essa grana dos Precatórios para pagar aquele novo benefício, a RENDA BRASIL (ou Auxílio Brasil), no valor de até R$ 400,00.

Mas todo o dinheiro economizado e que deixará de ser pago a quem de direito em 2022 não seria todo para o Auxílio Brasil. Especialistas dizem que cerca de R$ 50 bilhões seriam usados para turbinar o Auxílio Brasil, e o restante deve ser usado para correção dos benefícios previdenciários — gasto obrigatório do Executivo que deve custar entre R$ 16 bilhões e R$ 20 bilhões no ano que vem. Esses mesmos especialistas dizem que com a PEC aprovada, haverá uma folga orçamentária e que será destinada aos Deputados e Senadores no próximo ano (que, diga-se de passagem, é ano eleitoral), como o pagamento de emendas de relator, criticadas pela falta de transparência e de paridade entre os congressistas, e para o fundo eleitoral. O valor pode chegar a R$ 25 bilhões.

Em suma, caso aprovada a referida PEC, dentre outras coisas, o Auxílio BRASIL e as Emendas aos Parlamentares estariam sendo “financiados” com os recursos de muitos idosos, doentes e outros tipos de credores que aguardam anos para receber o seu crédito da União.

E aí, o que você acha dessa PEC?

Tiago Faggioni Bachur é advogado e professor de Direito

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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