GAZETILHA

Onde está Wesley?

Tudo que se sabe é que Weslinho segue longe de casa. Não há quaisquer registros consistentes de sua presença, nem em Franca nem em diversas outras cidades onde já foi procurado pela família. Não se sabe o que motivou sua saída de casa, nem o que pode estar fazendo neste instante, muito menos se ele está bem ou não. Certo é que há uma família destroçada, experimentando os mais duros sentimentos que podem se abater sobre alguém. Uma mescla de dor, angústia, tristeza e incerteza, um inferno que consome e dilacera por dentro.

Por Corrêa Neves Jr. | 20/09/2020 | Tempo de leitura: 7 min
Editor do GCN

Arquivo de Famíllia

“Esperança é a paciência com a lâmpada acesa”

Tertuliano, filósofo latino

 

Faz 23 dias que Wesley Alves Filho, carinhosamente chamado de Weslinho pela família, avisou as irmãs Letícia, 15, e Laura, 10, que iria ao varejão. As meninas, entretidas com suas próprias brincadeiras num quarto da casa modesta do jardim Aeroporto, em Franca, nunca imaginaram o que estava por vir. Era por volta de 16h de sexta-feira, 28 de agosto. A mãe tinha saído às 15h para trabalhar e só voltaria, na companhia do marido, lá pelas 21h.

Tinha sido um dia normal, como tantos outros. A família tomou café junto, almoçou junto. Weslinho, como sempre, ajudara a mãe fazendo o suco que costuma acompanhar as refeições. Vestindo um moletom do Patolino, uma calça preta e um par de chinelos, saiu caminhando, tranquilamente. Pelo que se descobriria mais tarde pelas imagens de câmeras de segurança instaladas em casas e comércios da região que liga o Aeroporto ao Recanto Elimar, Wesley não demonstra qualquer preocupação em estar sendo seguido, não aparece ao lado de ninguém, não parece fugir do que quer que seja. Ele apenas caminha, sem pressa, sem nada que pudesse minimamente indicar o drama que se seguiria.

De diferente, apenas a última imagem, registrada às 17h35, às margens da rodovia Ronan Rocha, em frente a um pesque-pague. Ali ele aparece meio desajeitado, empurrando uma bicicleta que não era dele, até desaparecer da gravação. A bike fora roubada exatos 13 minutos antes, de uma mulher que esperava sua porção de costela ficar pronta no Espetinho do Barriga, no Aeroporto II. A gravação que mostra o roubo da bicicleta, feita por um vizinho do espetinho, foi perdida. O sistema, antigo, só armazena por três dias as imagens. Foi consultada pelo dono do espetinho, Alex, quando ajudava sua cliente a procurar quem roubou a bicicleta, muito antes do drama de Weslinho tornar-se público, chocar Franca e emocionar o país. Segundo ele, o menino que rouba a bicicleta sobe a rua do seu espetinho. Trinta segundos depois, desce no sentido contrário, pega a bike e segue em frente. Na hora, ninguém viu. Sua cliente só percebeu o que aconteceu quando foi embora e não encontrou a bicicleta parada. 

Mais importante, o garoto das imagens perdidas, segundo Alex, não parece ser Wesley Alves. Mas é uma impressão. Ele não tem como garantir. Pode ser que seja, pode ser que não. Neste instante, não há como confirmar quem roubou, porque as imagens não existem mais. O que restou é a sequência já amplamente divulgada, que mostra Weslinho, às 17h35, empurrando a bicicleta pelo acostamento da rodovia. Depois disso, não há mais registros dele.

Com tanto tempo transcorrido desde que ele desapareceu, realidade e ficção começam a se misturar, criando mais confusão em torno de um caso que, por si só, já é intensamente dramático e muito misterioso. O que se sabe até agora, com segurança, é bem pouco.

Comprovadamente, é possível afirmar que ele saiu de casa com a roupa do corpo, sem dinheiro ou documentos, por volta de 16h de sexta-feira, 28 de agosto, dizendo para as irmãs que ia a um varejão. Todas as câmeras que registraram seus movimentos o mostram sozinho. Às 17h35, quando aparece empurrando a bicicleta vermelha na rodovia Ronan Rocha, ele também está sozinho. Todo o resto, é, neste instante, especulação.

Muita gente surgiu, desde então, dizendo que viu o menino. Em Extrema, Minas Gerais. Na Bahia. Em Batatais. Na vizinha São Tomas de Aquino. Todos esses encontros foram descartados, por carecerem de mínimas evidências de que tenham acontecido. Na maior parte dos casos, são crianças parecidas com o Wesley, mas que não guardavam qualquer relação com ele, com Franca nem com a família. 

Os únicos depoimentos que têm um pouco mais de substância são os do motorista da van que alega ter dado uma carona para o menino na quarta-feira da semana retrasada, de Serrana para Ribeirão Preto; do fiscal da cooperativa de vans; e do proprietário de uma mercearia localizada ao lado. Os três garantem que o menino visto em Serrana é mesmo Wesley. A narrativa é consistente. Os detalhes, verossímeis. Mas, ainda assim, há algumas divergências. Duas deles, para mim, chamam atenção. 

Na descrição das roupas que ele estaria usando, o motorista e o fiscal se contradizem. Um fala em camiseta preta, outro aponta azul. Além disso, considerada a repercussão do caso, me causa especial estranheza que nenhum passageiro da van tenha vindo a público dizer que viajou com o menino. Que teve essa ou aquela impressão. Que ouviu dele alguma coisa. 

A camiseta de cores distintas e a falta de relatos dos passageiros pode não significar nada. Pode ser apenas alguma pequena confusão ou receio de se expor. Ou pode implicar, tristemente, no fato de que o garoto, talvez, não fosse Wesley. Sem imagens de câmeras de Serrana e de Ribeirão, inexistentes até agora, é difícil ter convicção de alguma coisa.

A análise do celular da mãe, aparelho único da família que era compartilhado por todos, tampouco indicou qualquer pista. Após extrair os dados com ajuda do programa israelense Cellebrite, a polícia concluiu que nada de incomum houve nos dias que antecederam o desaparecimento de Wesley. Pelo menos, não que tenha ficado registrado no celular. O que foi possível obter mostra um Wesley responsável, que participou das aulas online da sua escola, jogou com amigos, assistiu filme. Só. Nenhum plano de fuga, nenhum acesso a site suspeito, nenhum encontro marcado com quem quer que seja.

Três semanas depois de seu desaparecimento, por maiores que sejam as esperanças, por mais intenso que seja o desejo de todos, é preciso começar a admitir a triste possibilidade de que, talvez, ele não esteja mais vivo. Que, infelizmente, algo de muito ruim possa ter acontecido. O desabafo do pai na última sexta-feira, emocionado, admitindo implicitamente a hipótese, dói na alma de qualquer um – mas é, também, ao mesmo tempo, realista. Ainda assim, há muitas perguntas que seguem absolutamente sem resposta, tornando o desparecimento de Wesley um dos casos mais intrincados que a Polícia Civil de Franca já enfrentou.

Se ele não está mais vivo, o que teria acontecido que pudesse resultar numa tragédia deste tamanho? O roubo de uma bicicleta, que provavelmente nem foi protagonizado por ele, seria motivo para tirar a vida de um rapaz? Numa cidade que, apesar de registrar violência crescente, nunca assistiu à execução de um garoto dessa idade, o que poderia explicar isso? Se não foi por conta da bicicleta, que outra razão poderia levar alguém a agir contra um menino de 13 anos, inofensivo, ainda mais considerado o fato de que ele não tinha envolvimento com drogas, nem passagens policiais, e que ainda por cima era tido como aluno exemplar, bom filho, simpático e educado com todos?

Se ele está vivo e bem, por que não se comunica com ninguém, nem com avó, nem com tios, nem com amigos? O que o teria motivado a uma decisão tão radical como a de fugir de casa? Como Wesley, menino doce e amoroso, teria conseguido disfarçar tão bem suas intenções, a ponto de não haver nenhuma indicação, qualquer bilhete ou mensagem, uma conversa esquisita que fosse, que pudesse denotar seu objetivo? Se ele pretendia fugir, por que foi de chinelos? Se foi tão determinado a ponto de dissimular tanto suas intenções, por que não levou consigo uma troca de roupa? Por qual razão não pegou pelo menos o dinheiro do pão que fica sempre em casa, para garantir um salgado e uma garrafa d’água nos primeiros dias? 

Por que ele não se importaria com as câmeras de segurança no primeiro dia e depois, misteriosamente, escaparia com fantástica habilidade de ser captado por qualquer uma nos dias seguintes? Por que ele teria pego uma bicicleta que não era sua? Para onde ele pretendia ir, seguindo às margens da rodovia Ronan Rocha? Como ele estaria sobrevivendo esses dias todos, se nem fora de casa havia dormido sozinho, por uma única noite, até então? Se ele tem ajuda de alguém, quem seria essa pessoa, que não aparece em nenhum momento nas imagens captadas? Como ele teria conhecido esse suposto “cúmplice” se não saía e se suas conexões virtuais nada sugerem neste sentido?

Tanto tempo depois de seu desaparecimento, a Polícia Civil não tem pistas, a Militar não encontrou qualquer vestígio, nem ninguém tem qualquer resposta para essas ou outras tantas perguntas. 

Tudo que se sabe é que Weslinho segue longe de casa. Não há quaisquer registros consistentes de sua presença, nem em Franca nem em diversas outras cidades onde já foi procurado pela família. Não se sabe o que motivou sua saída de casa, nem o que pode estar fazendo neste instante, muito menos se ele está bem ou não. Certo é que há uma família destroçada, experimentando os mais duros sentimentos que podem se abater sobre alguém. Uma mescla de dor, angústia, tristeza e incerteza, um inferno que consome e dilacera por dentro. 

Onde está Wesley? Esta é uma pergunta que precisa, urgentemente, ser respondida.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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