Um valoroso patriota

Ex-ministro fugiu para os Estados Unidos sob a proteção de um passaporte diplomático e do cargo de ministro de Estado para evitar ter que se explicar à Justiça brasileira pelos seus atos.

21/06/2020 | Tempo de leitura: 4 min

“O covarde só ameaça quando se acha em segurança”

Goethe, escritor e filósofo alemão

 

Os neo-patriotas extremistas revelados ao mundo pelo bolsonarismo se dizem muito corajosos, um tipo qualquer de macho ou fêmea-alfa. Por detrás de uma rede social, atacam e agridem qualquer um que não faça coro ao seu discurso que, muito além de conservador, costuma ser também preconceituoso, xenófobo, raivoso, hostil, intolerante e violento. Quando estão em bando, travestindo a bandeira do Brasil convertida em uniforme de combate, não economizam nas ofensas, impropérios e ameaças dirigidas não apenas aos cidadãos que pensam diferente, mas também às instituições, do Supremo Tribunal Federal à imprensa.

No mano a mano, no olho no olho, sofrem repentina transformação e, quase sempre, apresentam-se como pacatos cordeiros, que juram serem incapazes de maldizer alguém. Ainda mais curioso é o que acontece quando são intimados a reafirmar suas convicções diante da lei, frente a uma investigação policial ou a um processo judicial. É só aí que desnudam sua verdadeira natureza: são ratos. Nada além de ratos.

Exemplo perfeito desta metamorfose é o ex-ministro da Falta de Educação, analfabeto funcional e patriota-símbolo do bolsonarismo, Abraham Weintraub. Ofensor serial no Twitter, xingador profissional em reuniões ministeriais, valente quando rodeado por manifestantes que lhe servem de claque, fugiu para os Estados Unidos sob a proteção de um passaporte diplomático e do cargo de ministro de Estado para evitar ter que se explicar à Justiça brasileira pelos seus atos. Nunca se viu tamanha covardia no passado recente da república brasileira. Possivelmente, nem no mundo.

O homem que disse numa reunião em 22 de abril que, se dependesse dele, colocaria os “vagabundos” todos na cadeia, começando pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, não resistiu nem mesmo à mera investigação de sua eventual participação na disseminação de fake news. Muito menos teve a decência básica ou a hombridade mínima de repetir o que disse na reunião para a Polícia Federal. Limitou-se a ficar em silêncio durante o depoimento. Se bravura fosse medida em metros, a de Weintraub não ultrapassaria a primeira dezena de milímetros.

É sintomático que Abraham “Mickey Mouse” Weintraub tenha fugido antes mesmo de ser declarado culpado. Para não correr qualquer risco de ter que ficar contido no Brasil e se explicar às autoridades, usou ferramentas do Estado – e a gentileza extrema do presidente da República – para ajudar no seu plano. Primeiro, quando sua permanência no ministério era insustentável, garantiu com Bolsonaro, sabe-se lá recorrendo a que tipo de argumento, um novo cargo num lugar seguro, muitíssimo bem remunerado. Foi indicado para uma diretoria no Banco Mundial, sediado em Washington, DC, capital dos Estados Unidos, com salário estimado em R$ 115 mil – por mês.

O próprio ministro anunciou sua saída da pasta da Educação numa postagem em rede social ao lado do presidente Bolsonaro. No estranhíssimo encontro, disse que não era hora de detalhar as razões de sua saída. Pediu um “abracinho” a um constrangido presidente. Postou, horas depois, que sairia do Brasil em poucos dias. Na verdade, seriam poucas horas.

Na tarde de sexta-feira, como rato que abandona o navio, embarcou num voo para Miami ainda na condição de ministro. Fez isso porque, desta forma, não teria a mala inspecionada nem deveria explicações para as autoridades alfandegárias ou imigratórias. Sairia do Brasil e entraria nos Estados Unidos sem precisar justificar coisa alguma para quem quer que fosse. E foi assim que, no início da manhã de sábado, Weintraub estava são e salvo em solo americano. Foi só depois do amigo-patriota-do-abracinho-feliz Weintraub estar na terra do Mickey que o presidente Bolsonaro publicou, em edição extraordinária do Diário Oficial da União, a exoneração do ministro, o que aconteceu por volta de meio-dia.

Weintraub mudou de cargo - e de país – mais rápido do que muita gente troca de roupa. Pode respirar aliviado – mas não muito, nem por muito tempo. É certo que a residência em terra estrangeira desacelera o ritmo dos andamentos processuais, mas não o torna imune ao alcance da justiça brasileira. Além disso, há uma forte pressão neste instante para que o Banco Mundial rejeite sua indicação para o cargo de diretor, o que precisa ser referendado por outros oito países que compõem a cota do Brasil na instituição. Se esses países discordarem de ter Weintraub como seu representante, ele perde a mamata. A conferir as cenas dos próximos capítulos.

Enquanto isso, pelo menos uma coisa o Brasil pode comemorar. Saber que um tipo como Weintraub deixou de comandar a Educação é sinal de que nem tudo está perdido. Por pior que seja seu desempenho no Banco Mundial, por mais vexatório que seja seu comportamento, por mais vergonhosa que tenha sido sua saída, nada é tão ruim como seria sua permanência no Ministério da Educação. Pelo menos disso, estamos livres. Weintarde, “valente” Weintraub!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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