Ojeriza

“Sentimento de má vontade, aversão, antipatia gerada pela intuição, por percepção ou ressentimento.

02/11/2019 | Tempo de leitura: 2 min

“Sentimento de má vontade, aversão, antipatia gerada pela intuição, por percepção ou ressentimento.” É menos que ódio, embora leve igualmente à experiência da vontade de matar. É mais que malquerença. Embora seja de etiologia desconhecida, é forte o suficiente para nos levar a olhar para o pescoço de quem nos incomoda, à procura de ponto vulnerável para mordida fatal. Sim, o entejo nos transforma em bichos irracionais. Sem dúvida é desamor, é malquerença, é estranhamento que impede qualquer manifestação de qualquer gesto de simpatia, é, vamos dizer assim, fastio, espécie de sentimento de repugnância. É quizília, rabidez, raiva, rechaço.

Sabe? É entojo, palavra antiga, usada para descrever a menina mimada que brigava pelo primeiro lugar na fila, na lista de maiorais da escola, que passava por cima de tudo e todos para ser destaque, nem que fosse na lista das mais intragáveis. Sim, causam náusea. Sim, repugnância também. Mas ninguém fica livre de ter entre nomes do rol dos seus afetos alguém que, encapsulada como em saquinho plástico, se mistura àquelas que você quer bem e moram no seu coração. Sim, são invasivas e dissimuladas: de repente, ei-las pedindo algum objeto emprestado, algum dinheiro, algum favor, que nunca lembram de retribuir. Nunca estão sozinhas. Têm sempre, nem se imagina como, algum acompanhante de boa índole, o que as faz serem aceitas socialmente, por extensão.

Há muitas explicações para a eclosão desse sentimento, que por não ser necessariamente recíproco, ganha diferentes e bizarras combinações. Um detesta, o outro parece querer agradar sem limites, o que o torna mais detestável ainda. Um detesta, o outro também odeia, mas ser considerado íntimo ou pelo menos próximo, é fator de elevação social: acabou de nascer mais um asqueroso puxa-saco, que mais adiante dará pinote e provocará rasteira e tombo, pode apostar. Explicar simpatias e amores é muito simples. “Você chega perto, se sente bem. A outra pessoa chega perto, se sente bem. E esse sentir bem continua, mesmo se vocês se afastam, pelo tempo que for. E, quando acontece novamente, é sempre bom.” Guardei essa explicação dada por criança de oito anos sobre o Amor. Nunca achei nada mais perfeito.

Quando próxima de meus desafetos, perturbada, me pergunto. Será que são encontros programados anteriormente, nos planos superiores, de pessoas que voltam à Terra para espiar pinimbas trazidas de vidas anteriores? Seria o reconhecimento de sentimentos que odeio em mim, escancarados na atitude do outro? O tal mecanismo de defesa que dizem usarmos para atribuir ao próximo pensamentos, atitudes, emoções inaceitáveis ou indesejadas por nossa excelsa e perfeita pessoa? Ainda estou no processo de elaboração da resposta, visto que preciso estudar muito, voltar às sessões de análise e refletir sobre a fragilidade da personalidade humana. Ainda há tempo. Um dia viro gente.

 

Lúcia Helena Maníglia Brigagão
Jornalista, escritora, professora
luciahelena@comerciodafranca.com.br

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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