Quico?

Mania de quem escreve, guardo papéis dentro de livros, caixas, sob forros de gaveta. Em qualquer cantinho camuflado.

20/07/2019 | Tempo de leitura: 2 min

Mania de quem escreve, guardo papéis dentro de livros, caixas, sob forros de gaveta. Em qualquer cantinho camuflado. De papéis de bala, a santinhos de missa, recados, passando por recortes de jornais com artigos de outros escritores, tenho montes guardados. Guardo-os, esqueço deles e, por força divina ou poder desconhecido da mente, num repente acho algum perdido, ou escondido, leio e não é que trazem mensagem que sempre me ajuda a decidir o imbróglio do momento? Parece sobrenatural, talvez não seja.

Dia desses, percebi alguém próximo de cara torcida, como se eu fosse responsável por atitude que o tivesse desagradado. Anos de análise me fizeram parar, avaliar a situação de vários ângulos. Vai que eu tivesse mesmo metido os pés pelas mãos... Não. Estou em fase de santidade, até mereço auréola. Não replico agressões. Não revido buzinada. Cumprimento, mesmo que o outro apenas grunha em resposta. Dou passagem para pedestres. Sou fã e defendo Sérgio Moro. Acho palhaçada e nepotismo Bolsonaro nomear o filho embaixador. Tivesse oportunidade, pediria para as mães dos ministros do STF prometerem surra nos filhos que não andam procedendo direito.

Dia desses, na faxina, encontrei diversos recortes de jornal, com textos alheios. Escaparam da minha mão. Ao recolhê-los, certo título chamou-me a atenção: “O que é que eu tenho com isso?”, o que me fez lembrar daquele bicudo... Li-o, e foi como bálsamo para minha alma sofredora. Da auto-análise passei à auto-avaliação. Considerei a situação, fazendo-me perguntas. Fui indelicada com ele? Não. Falei mal dele? Não. Devo-lhe alguma coisa? Favor? Dinheiro? Não. Então, concluí, “não tenho nada a ver com o mau humor dele. Que melhore quando quiser, ou tiver condições”.

“Quico?”, forma reduzida de “o que é que eu tenho com isso?” será a pergunta que doravante eu me farei nas situações nevrálgicas vividas com relacionamentos. Adotarei, igualmente, como lema e filosofia de vida. O vizinho do lado é gay? “Quico?” A prima é espalhafatosa e de muito mau gosto? “Quico?” A construção da casa próxima é horrorosa? “Quico?” O marido da vizinha bate nela? “Quico?” Eu faria roteiro diferente daquele que me mostraram com entusiasmo de marinheiro de primeira viagem? “Quico?”... Noutros tempos respondia, sempre que me pediam alguma opinião, com outra pergunta: “Quer saber a verdade ou a mentira?”. Descobri que ninguém quer a verdade, depois que eu respondia até com medo, mas com sinceridade. Na época fiz inimigos, desagradei pessoas e acabei por abandonar a prática, embora a considerasse ética. Doravante apenas me pergunto, depois de ouvir a queixa: “Quico?”. E me calo.

Continuarei a admirar Sérgio Moro. Serei contra a nomeação do filho do presidente, como seus milhões de eleitores. Quanto aos ministros do STF, que nem sabem que existo, não lhes darei passagem se cruzar com eles, vou buzinar caso os veja e lhes passarei um bom susto, ameaçando não parar, caso ousem passar na frente do meu carro para atravessar qualquer rua.

 

Lúcia Helena Maníglia Brigagão
Jornalista, escritora, professora
luciahelena@comerciodafranca.com.br 
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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