Hora de tentar juntar os cacos


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A não ser que tenha acontecido alguma reviravolta improvável e indetectável nas últimas horas, Jair Bolsonaro (PSL) vai se transformar no início da noite deste domingo no novo presidente da República. Terá sido eleito por decisão da maioria dos brasileiros, num processo democrático, em dois turnos de votação. Tem legitimidade para implementar suas propostas, o que não quer dizer que possa fazer o que bem entender. Há limites, estabelecidos pela mesma Constituição que Bolsonaro prometeu, durante a campanha, respeitar. Qualquer alternativa a isso significa romper com as liberdades e também com as garantias fundamentais como conhecemos. É uma fronteira que não pode ser ultrapassada. Por ninguém.
 
A partir da segunda-feira, o perdedor será rapidamente esquecido. Tão logo o derrotado reconheça a vitória do eleito, e é quase certo que caiba a  Haddad este papel, ele vira história. Pelo menos, com relação a este ciclo. Todo mundo vai concentrar suas atenções nas movimentações do  presidente eleito. Quem serão seus ministros, quais suas primeiras propostas, como vai lidar com as críticas, de que forma estabelece as relaçõ es institucionais com os demais poderes... E, não menos importante, como o vencedor vai lidar com a significativa parcela de brasileiros que não votou nele.
 
Lições recentes da história brasileira mostram que nossos líderes, quaisquer que tenham sido eles, têm fracassado miseravelmente na tarefa de conciliar o país. Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que havia sido ministro de Itamar Franco e foi um dos criadores do Plano Real, governou o país por oito anos. Privatizou estatais, modernizou a estrutura do Estado, criou condições para que leis de controle de gastos fossem implementadas, controlou a inflação, garantiu a estabilidade da moeda. Num tempo em que se definir como “de direita” era tido como horrível, foi acusado de “entreguista”, de “neoliberal”, de ter pacto com forças de mercado estrangeiras. Até tentou atrair os adversários, mas não conseguiu. Foi reeleito, mas fracassou em fazer seu sucessor. Quem ganhou a batalha foi Lula (PT).
 
Naquele início da década passada, Lula era tido como um “quase-santo”, aplaudido por líderes mundiais. As suas ideias de esquerda, especialmente o fortalecimento e o aumento do tamanho do Estado para impulsionar o desenvolvimento econômico do país, eram aprovadas pela imensa maioria dos brasileiros. Suas iniciativas de usar dinheiro público para financiar setores estratégicos, o incentivo ao aumento do crédito, os programas habitacionais e de geração de renda renderam dividendos eleitorais. Mas Lula tampouco conciliou o país. Achou que não precisava. Acreditava que estava acima do bem e do mal, que tinha tanto apoio que não precisava atrair a parcela que se opunha a ele. E que a corrupção, que se anunciava desde o seu primeiro mandato, era parte do jogo, uma espécie de “mal necessário”. É bom que se recorde que, diferente de FHC, Lula ainda elegeu um poste para sucedê-lo, uma certa Dilma Rousseff. O resto da história está fresca na memória de todo mundo.
 
O ungido da vez é Jair Bolsonaro. Num tempo em que maldição é ser de esquerda e que todos parecem ter se transformado em ultraliberais, caberá ao capitão reformado do Exército a missão de liderar o país. Que ele o faça, sobretudo, com moderação. Sem se esquecer, nunca, que chega ao Palácio do Planalto porque a maioria da população assim desejou. Mas que, ainda assim, existem pelo menos 40% de brasileiros que não o queriam lá. E que merecem, tanto como quaisquer outros brasileiros, idêntico respeito.
 
A partir de segunda-feira, é hora das palavras abrirem espaço para as ações, mesmo porque a aprovação maciça e a lua-de-mel com o eleitorado acabam rápido – para qualquer um. Que Bolsonaro possa compreender tudo isso. E que possa, sobretudo, também conciliar o país. Com menos ódio, e mais união. Com menos divergências, e mais convergência. Com os olhos no futuro – mas sem se esquecer de examinar os erros cometidos pelos que o antecederam. A história, tristemente, se repete. E, não raro, pode ser cruel. Para qualquer um.

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