Manhãs

“Ah! essas manhãs de outono... Ligeiramente frias, Sol intenso, verde reluzente, brisa a balançar galhos das trepadeiras preciosas que exibem

10/08/2018 | Tempo de leitura: 2 min

“Ah! essas manhãs de outono... Ligeiramente frias, Sol intenso, verde reluzente, brisa a balançar galhos das trepadeiras preciosas que exibem viço especial , provenientes de mudas herdadas da mãe, da avó, da sogra e do sogro, de amigos. Percebo, cada um colaborou – em tempos diferentes - com colorido especial para que esta particular manhã fosse configurada.
 
... E aí o pensamento, que parece mesmo uma coisa à toa, voa e faz  lembrar. Lembra, por exemplo, da secretária da escola primária onde começou a trabalhar como gente grande, que ligou dias atrás e solicitou sua presença para ler as crônicas que publica no jornal: ela ficou cega, mas adora que leiam para ela. Prometer, prometeu, mas ainda não cumpriu. 
 
Lembra de John Donne, o poeta. Nenhum homem é uma ilha isolada; que fazemos parte de um continente, de uma imensa irmandade, que estamos conectados uns aos outros, que todos juntos formamos uma única teia e que não se justifica perguntar por quem os sinos dobram: eles dobram por nós.
 
Lembra do aniversário de quatro anos da neta mais velha, transcorrido há pouco e da emoção de participar ativamente da festa ao “desaprisionar” (que difere de libertar) sua própria criança enclausurada pelas convenções e adequações sociais, subir na árvore, assoviar com os dedos na boca e, pela mesma boca, arremessar feito torpedo as sementes de laranja, que acabou de colher, descascar  e chupar ainda sob a árvore. 
 
Lembra dos bailes que frequentava na mocidade, tão diferentes dos realizados hoje! Sentiu muito prazer na oportunidade de revivê-los na última festa quando dançou e onde  teve coragem de enfrentar a comparação do que foi com o que é, do como estamos com o que fomos... Percebeu a importância de cada momento e cada acontecimento nos resultados estampados e visíveis em cada rosto, expressão, nas marcas do tempo.
 
Nessa manhã particularmente, nessa manhã friazinha e romântica, ainda na cama, compromete-se a ir pessoalmente ler essas palavras (que nesse momento ainda nem foram escritas, só foram pensadas) para aquela ex-secretária. Sabe-se parte do continente humano. Percebe-se livre desde quando libertou sua criança interior. Gosta-se porque está aprendendo a se perdoar e louvar todo acontecimento do seu cotidiano. Sente-se feliz: todo dia aprende novo ponto para bordar segundo seu próprio desenho, e escolhe pessoalmente – por sua conta e risco – as cores a serem usadas.”
 
Semana passada querido amigo me cutucou ao dizer que estou a perder a criatividade, e que isso fica evidente toda vez que publico algo escrito em data distante. Para ele, várias explicações, não justificativas. O texto entre aspas foi ao ar num distante 2005. Muito mudou, muito permaneceu. Aquela neta já tem 17 anos; o jardim foi reconfigurado; eu continuo no processo de metamorfose interior. Entretanto o projeto de livro com crônicas escolhidas ao longo de décadas de publicações, caminha a passos largos. Vou aos arquivos, releio, seleciono e, qualquer dia desses me surpreendo com novo livro. Entre muitos outros, esse texto fará parte dele.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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