Diferenças...

E semelhanças. Angola, um dos seis países que têm o português como língua oficial, é posto de retransmissão de programas de canais de televisão

24/06/2016 | Tempo de leitura: 3 min

E semelhanças. Angola, um dos seis países que têm o português como língua oficial, é posto de retransmissão de programas de canais de televisão brasileiros para alguns países da Europa. Nos intervalos dos diversos programas — novelas e jornais, principalmente —, os comerciais brasileiros são substituídos pelos angolanos. Guardo um deles na memória. Surgiu na tela, por alguns segundos, bebê risonho engatinhando pelo chão, fundo musical alegre a acompanhar seus movimentos. Doce voz feminina se sobrepôs ao tema musical para trazer a mensagem do produto anunciado: ‘Fraldas Pamper! Para que o c*zinho de seus putos fique sempre fresquinho!’. E o bebê se vai, lentamente. A pronúncia do português angolano se assemelha à do português de Portugal, que por sua vez, é parecida com a dos cariocas, principalmente na substituição do som do s no final das palavras, pelo som do x. Achei estranho e engraçado. Fiquei surpresa. Duas palavras consideradas palavrões no Brasil, escancaradamente ditas na televisão angolense. Substituídas pelos sinônimos brasileiros ficaria assim: ‘Fraldas Pamper, para que a bundinha dos seus filhos fique sempre fresquinha.’ (Ou sem assadura.)
 
O diálogo entre portugueses da gema e pessoas que falam português de outros países, incluindo o Brasil, muitas vezes é complicado. No nosso território a comunicação entre Estados já é difícil. Pedido de mineira a paulista:’Ispinduraasrôpaquitáinrribadacamasenãoelasmacetatudo!’.Tradução:’pendura as roupas que estão em cima da cama, senão elas amarrotarão. Na Bahia quem desce do ônibus, desponga; se alguém é metido a sabichão, é ‘tirado a gato-mestre’. No Pará, lugar vago, muito além, um não-sei-onde é um ‘catrapicho do catrapiçal’; quem sofreu trombada proposital, levou uma ‘catrepa’; ‘bregueço’ é coisa sem qualquer importância e ‘brioco’, o equivalente a traseiro. No Ceará, ‘zagueira’ é menina das pernas grossas; morar em lugar ‘zuadento’ é morar em lugar barulhento e ‘sibite baleado’ é pessoa miúda e desajeitada. Perdeu alguma coisa em sua casa no Ceará? Pois ‘dê o bacurejo’ na casa! Ou ‘procure!’. Curiosidade, no Ceará nasceu a palavra baitola, homossexual. Foi durante a construção da primeira estrada de ferro do estado, cujo mestre de obras era inglês, muito afetado, que repetia sem parar ‘atenção para a baitola’, se referindo à bitola, distância entre trilhos. Intraduzível. 
 
Em Portugal, a boa educação pede que se ‘acione o autoclismo’ depois do uso do vaso sanitário, na sala de banhos (toalete). Autoclismo é descarga. Lá, se chama a aeromoça de hospedeira. Se alguém foi ao talho, foi ao açougue. O jogador de futebol faz canto (escanteio) certeiro que, se o guarda-redes (goleiro) descuidar, pode virar gol para a claque (torcida) do time aplaudir. ‘Tenho um senhor que...’ se traduz por ‘conheço um senhor que ...’. ‘Estar nos cascos’ é estar arretada ou arretado. Advertência: nunca pedir durex na papelaria porque durex é sinônimo de preservativo, que se compra na farmácia. Moço ou moça não têm o mesmo sentido que para nós: são pessoas que fazem trabalho sujo. Ao entrar no teatro, é educado desligar o telemóvel. E diga ‘Estou!’, ao atendê-lo. Gajos (rapazes) usam ceroula (calça), camisola (camiseta) e sapatilha (tênis), que amarram com atacadores (cadarços). Eles chamam suas namoradas de rapariga. Tomar o autocarro significa pegar ônibus e se vai ao hospital para ver os utentes (pacientes). Não dói ‘tomar uma pica no c*’, que significa tomar injeção na nádega que, se não for Benzectacil, não dói. Juro! 
 
Considerando a variação do sentido de palavras e expressões linguísticas nos diversos países, não consigo entender a necessidade de unificar ortografias do idioma português proposta pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Entrementes, ao repensar - proposituras e minhas opiniões — me ponho a considerar: qual lado estaria a ‘dar murros nos olhos’? (Expressão para quem não sabe o que está a dizer ou fazer.)
 
 
Lúcia Helena Maníglia Brigagão
jornalista, escritora, professora - luciahelena@comerciodafranca.com.br
 
 

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