Filmes

Gosto muito de cinema. Fico envaidecida quando percebo acumular certo conhecimento na área, embora esteja longe, muito longe, de me meter

04/03/2016 | Tempo de leitura: 3 min

Gosto muito de cinema. Fico envaidecida quando percebo acumular certo conhecimento na área, embora esteja longe, muito longe, de me meter a dar pareceres e opiniões daqueles do nível de José Wilker. Mas, falo de boca cheia, não faço feio como Glória Pires na noite do último Oscar. Este ano a Academia teve muito trabalho para escolher e premiar. Filmes e atores indicados são fantásticos. Como não recebi convite para comentar na televisão, deixei A grande aposta, Mad Max: estrada da fúria, Perdido em Marte e O Regresso para depois, visto que seus temas não me atraem muito. Pus na cestinha Ponte dos Espiões, Brooklyn, O quarto de Jack, Spotlight: segredos revelados, Joy, 45 anos, Trumbo e A garota dinamarquesa. Incluí Steve Jobs, pus-me frente à televisão, apaguei as luzes da sala, desliguei o telefone, pedi que me levassem pipoca e lenços, entrei em êxtase. Só saí quando o último filme terminou.
 
Nenhuma surpresa com relação a nomes e filmes premiados. Faz tempo que Leonardo di Caprio merece ter seu Oscar na prateleira; Brie Larson desempenhou com perfeição os altos e baixos da personalidade da garota sequestrada e abusada sexualmente durante anos; Alicia Vikander foi perfeita ao viver Gerda, ex-esposa, cúmplice e amiga de Lili Elbe, pioneira transgênero. Mark Rylance brilhou como o espião russo trocado na ponte alemã Glienicke, por dois prisioneiros de guerra norte-americanos. Nenhuma surpresa. Outros filmes baseados em histórias reais também chamaram atenção, caso de Trumbo e Steve Jobs. 
 
Mas, bingo! na minha opinião, se é que ela interessa a alguém, a academia acertou em cheio ao premiar Spotlight: segredos revelados como melhor filme. Baseado também em história real, ele mostra grupo de jornalistas do Boston Globe que reúne documentos capazes de provar casos de abusos sexuais em crianças cometidos durante anos por padres católicos. Líderes religiosos da época alertados, calavam-se, fechavam os olhos e transferiam os padres de região ao invés de puni-los. O filme é injeção de ânimo e homenagem aos jornalistas que se propõem a contar a verdade, mesmo que ela doa. Revela dificuldades, garra, dedicação, ânimo, decepções e entraves que permeiam a atividade nos bastidores da redação de qualquer jornal. O filme é soco no estômago daqueles que ainda acreditam que violência sexual e pedofilia dentro dos muros das instituições católicas é exagero e prática improvável. 
 
Aos descrentes da possibilidade de existirem tais abusos, sugiro dois filmes também baseados em fatos reais. O primeiro deles, Em nome de Deus, de 2002, título original The Magdalene Sisters passado em convento católico da Irlanda, história de quatro jovens que, por diferentes motivos, foram confinadas na instituição e que, presas lá, sofrem cruéis tipos de violência, inclusive sexual, por parte de padres e freiras. O outro, Philomena, com Judi Dench, lançamento de 2014, mostra cenas de tortura, violência e maldade contra menores e o tênue limite entre poder e abuso do poder. Padres e freiras — nos dois exemplos — estavam acima de qualquer suspeita diante da sociedade, como religiosos de outras seitas acusados do mesmo crime.
 
Durante as investigações, chovem reações de ódio, traços de conservadorismo, vindos de parentes e amigos dos padres acusados de pedofilia que mostram dificuldade em acreditar nas óbvias evidências mostradas. Tentam defender e esconder os acusados, sonegam informações comprometedoras, comportamento que sugere algum excesso de fanatismo religioso. É, de fato, muito difícil aceitar a acusação dirigida a padre amigo, reverendos religiosos de outras seitas ou a quem se tem interesse ou admiração, haja vista a meleca do atual noticiário político brasileiro. Nas cenas finais de Spotlight, ao serem dados os créditos, sobem nomes de locais do mundo onde foram revelados crimes de pedofilia. O nome de Franca, lamentavelmente, aparece entre eles.
 
 
Lúcia Helena Maníglia Brigagão
jornalista, escritora, professora - luciahelena@comerciodafranca.com.br
 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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