Por volta de 2.197 a. C. na China nascia o Tsu-chu — ‘bola recheada feita de couro’ — esporte criado para treinamento militar, inspirado no péssimo costume de guerreiros chineses em chutar crânios ou cabeças dos inimigos derrotados. No mundo, por séculos, pipocaram manifestações esportivas semelhantes, curiosas, peculiares ou tabus apenas recentemente desaparecidos, como mulheres não serem bem-vindas dentro do campo. Na península do Yucatán, atual México, nasceu o Pok Ta Pok, jogado com bola, pés e mãos, e ao fim o capitão do grupo perdedor era sacrificado. Felizmente não vingou e nem foi copiado. 

 

Há outros registros, relatos e sinais de práticas esportivas que parecem ser ancestrais do futebol, cujas singularidades e idiossincrasias ou particularidades levam a crer que o esporte é resultado elaborado ou extrato sofisticado da soma daquelas manifestações. Em épocas recentes surgiram outras versões como o Calcio Florentino — não à toa o futebol na Itália ainda é chamado Calcio —, e o Football na Inglaterra, ingleses chutando bola de couro para comemorar expulsão de invasores. Nasceria ali o Futebol, esporte coletivo mais praticado no mundo. Em 1895 chegou ao Brasil, tudo indica, pelas mãos — e pés — de Charles William Miller, inicialmente restrito à elite branca, vedado a negros, pobres e mulheres. Já foi até considerado lazer ‘bárbaro’ pois estimularia cólera, inimizade, ódio e malícia, pernas quebradas, roupas rasgadas, dentes arrancados. Morder o adversário, como fez Suárez, demoraria décadas. 

 

Curiosidades: mais antigo clube brasileiro ainda em atividade é o Sport Club Rio Grande, de 1900. O carioca Fluminense Football Club, 1902, foi o primeiro a ostentar a palavra futebol no nome. E, em 1914, na cidade de São Paulo, entusiasmados italianos e descendentes fundaram o Palestra Itália. Três anos depois, em Franca, torcedores da colônia italiana, fanáticos pelo time da capital, como Caetano Petraglia, Pedro Spessotto, Giacomo Barbieri, José Maníglia, entre outros, faziam nascer o Palestra Itália de Franca. 

 

Na década de 40, Segunda Guerra Mundial, determinação governamental impôs que nenhum time ou agremiação poderia levar nome dos países do Eixo. Assim, ambos Palestra Itália tiveram seus nomes alterados. O paulistano, passou a ser Sociedade Esportiva Palmeiras e o francano, Palmeiras Futebol Clube. A história do Palmeiras Futebol Clube foi escrita em Franca por italianos como os de Primo Meneghetti, Antonio Maniglia, Nelson Palermo, Orlando Melani, Domingos Schicchitano, Nicodemo Bassi, Leonel Orsolini; e de atletas também oriundi, como Bertinho Ferrante e Nicolino — Nicola Maniglia Júnior, meu pai. 

 

No dia 25 de maio de 1947, na rua Santos Pereira que nem asfalto tinha, foi inaugurado o campo de futebol do Palmeiras Futebol Clube. O Palmeirinha, como é carinhosamente conhecido, além das memoráveis partidas de futebol, foi local de vários outros eventos. Ali aconteceram — e acontecem — partidas de boccia; apresentações de artistas (Ângela Maria e Roupa Nova, por exemplo); nos anos 60 as demonstrações de ginástica, comandadas pelos professores Helena Barbosa e Pedroca, por ocasião do 7 de Setembro. Foram realizados ali competições de fanfarras e shows pirotécnicos e até, a segunda edição da feira Francal, em 1970.

 

Teme-se, porém, pelo futuro. Fala-se em troca, permuta e até venda de parte do cobiçado terreno do estádio, o que o descaracterizaria. O que estará reservado para aquele privilegiado espaço urbano?, a primeira pergunta, dirigida a quem já perdeu o Hotel Francano, AEC, casarões antigos, campos do Fulgêncio de Almeida e do Comercial. A segunda: em 25 de dezembro de 2017 o time francano comemorará seu primeiro centenário: a grande colônia italiana permitirá o dilaceramento de seu espaço de glórias? 

 

 

Lúcia Helena Maníglia Brigagão

jornalista, escritora, professora - luciahelena@comerciodafranca.com.br