OPINIÃO

República: o dia em que Deodoro se levantou com o pé esquerdo

Por José Marta Filho |
| Tempo de leitura: 3 min

15 de novembro de 1889. O sol brilhava no Rio de Janeiro, a brisa da Baía de Guanabara balançava os barquinhos, e Dom Pedro II, com sua barba imponente, tomava seu café da manhã, alheio ao que estava prestes a acontecer. Do outro lado da cidade, o marechal Deodoro da Fonseca acordava com um humor daqueles — não exatamente contra o Imperador, mas com aquele desconforto de quem sente que algo precisa mudar. Enquanto isso, os bastidores ferviam.

Benjamin Constant, um dos principais arquitetos da conspiração, já estava de prontidão, incansável nos corredores do Exército, conspirando e convencendo os colegas de que a República seria o futuro do Brasil. Floriano Peixoto, que logo ganharia fama como "Marechal de Ferro", também estava envolvido, pronto para dar apoio a Deodoro, que, entre uma dor de barriga e a pressão dos amigos, hesitava. Era como aquele amigo que o convence a sair na sexta-feira, mesmo quando você só quer ficar em casa assistindo TV. "É hoje, Deodoro!", insistiam os revolucionários. "Vamos fazer história!"

E lá foi Deodoro, meio a contragosto, montando em seu cavalo, para fazer sua proclamação no Campo de Santana. Ele não estava exatamente em seu melhor dia, mas com o apoio de Constant, Floriano e mais uma turma de militares de olho nas mudanças, proclamou a República sem muita resistência — quase como numa reunião de condomínio em que alguém levanta a mão e diz: "Vamos derrubar o síndico." E, de repente, todo mundo concorda. Dom Pedro II, coitado, foi informado da novidade já tarde, como quem recebe um WhatsApp dizendo que foi demitido. Sem muito drama, aceitou o destino, foi para a Europa, e assim a monarquia, com seus 67 anos de história, chegou ao fim. Floriano Peixoto, que tinha o pé no pragmatismo, já visualizava seu próprio papel no futuro do país, enquanto Benjamin Constant via o triunfo de suas ideias republicanas tomando forma. O Brasil, então, virou República, meio por acidente, meio por teimosia, e Deodoro, que nem queria tanto ser presidente, foi empurrado para o cargo, com Floriano logo ali para assumir quando necessário.

Se a República foi proclamada de forma improvisada, talvez isso explique por que, 135 anos depois, o país ainda vive momentos de improviso político. Avançando para 2024, o Brasil continua celebrando esse 15 de novembro, agora com memes nas redes sociais e discussões nas mesas de bar, onde política e futebol andam lado a lado. Deodoro e seus amigos revolucionários ficariam surpresos ao ver como o país evoluiu — e como algumas coisas nunca mudaram. Crises políticas, fake news, polarização, e o eterno "jeitinho brasileiro" ainda estão por aí. Se Deodoro, Benjamin Constant e Floriano Peixoto tivessem acesso às tecnologias de hoje, quem sabe a proclamação da República teria sido anunciada via live no Instagram? Ou talvez um tweet da época diria algo como: "Acabamos de proclamar a República #ForaDomPedro."

Mas, uma coisa é certa: o espírito improvisador daquela época continua vivo. Hoje, o Brasil segue driblando seus desafios com a mesma ginga. Assim como em 1889, quando Deodoro se levantou com o pé esquerdo e mudou o curso da história, continuamos fazendo o nosso próprio caminho, com improviso, criatividade e, claro, uma boa dose de humor.

Portanto, ao celebrarmos o 15 de novembro, lembremos: a República começou com um "vai que dá certo" — e, de certa forma, ainda estamos nessa. Afinal, o Brasil é uma grande aventura, com altos e baixos, mas sempre com um sorriso no rosto e pronto para a próxima surpresa.

O autor é engenheiro e matemático; professor doutor aposentado, na Unesp.

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