OPINIÃO

Constitucionalismo abusivo em Bauru

Por Luiz Henrique Herrera |
| Tempo de leitura: 2 min
O autor é professor universitário e advogado

Em recente contribuição neste espaço, afirmei que em Bauru há muita Política e muito pouca Teoria Política. Isso significa dizer que a política local acontece com ignorância sobre o que a Ciência Política e a Ciência Jurídica podem dizer sobre ela.

O "Regime de Urgência" implica na apreciação de determinada matéria com prioridade. Se o projeto não for apreciado no tempo estabelecido, a pauta deve ficar paralisada ("pauta trancada"), de forma a compelir a Casa Legislativa a se pronunciar sobre o texto.

Em Bauru, por conta do "Regime de Urgência" incorporado ao Projeto de Lei da Concessão da ETE, estão paralisadas as votações de proposições que envolvem direitos fundamentais sociais e culturais, a saber, o piso salarial dos professores, o reajuste salarial dos servidores e a lei que aprova substancioso investimento no setor cultural.

A manutenção do "Regime de Urgência" em prejuízo de direitos fundamentais configura abuso episódico do próprio instituto constitucional do regime especial de tramitação. O uso de institutos constitucionais com calculada intenção de minar ou restringir elementos centrais da democracia e de direitos fundamentais, caracteriza o que se denomina de "Constitucionalismo Abusivo".

Recentemente tivemos três manejos jurídico-políticos que se enquadram nessa categoria: [1] Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) com o objetivo de mudar o quórum de votação no curso do processo legislativo já iniciado. A ocorrência de constitucionalismo abusivo nesse caso é evidente, pois o objetivo foi facilitar a aprovação do projeto com adequação de quórum compatível com a quantidade de votos da base aliada; [2] ADIN para supressão de prerrogativas do Poder Legislativo, justamente no contexto de fiscalizações em andamento pelas Comissões; [3] ADIN que obstou a eficácia de Resolução aprovada por unanimidade dos Vereadores, pela qual se autorizava o plenário da Câmara Municipal a derrubar o regime de urgência atribuído ao Projeto de Lei de Concessão da ETE.

Em todas as situações episódicas, em maior ou menor grau, tem-se o uso de institutos constitucionais (ação constitucional e o "regime de urgência") com objetivos antidemocráticos e, pior, em detrimento da concretização de direitos verdadeiramente urgentes. Muito embora o "regime de urgência" seja prerrogativa constitucional, entendo que sua manutenção, no atual cenário político de Bauru, viola os princípios da moralidade e da razoabilidade administrativa, bem como interesse público, na medida em que sua insistência impede a concretização de direitos fundamentais vitais.

Na tensão entre interesses constitucionalmente garantidos, a solução que causar menor dano à população deve prevalecer. Dessa ponderação de valores (regime de urgência versus direitos fundamentais dos trabalhadores e direito à cultura), reafirmo a ocorrência de constitucionalismo abusivo e, por consequência, de violação a princípios da administração pública.

Na prática, a dicotomia amigo-inimigo é que tem orientado o cenário político em Bauru, em convergência com o que escreveu Carl Schmitt em seu livro "O Conceito do Político" (1932), no contexto do conservadorismo autoritário.

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