BAURU

Revisão de imóveis e terrenos cedidos sem ônus é desafio à gestão Demarchi na Cohab

Um dos impasses envolve área cedida a uma igreja no Núcleo Geisel; entidade construiu prédio e pode ser indenizada

Por André Fleury Moraes | 09/03/2024 | Tempo de leitura: 3 min
da Redação

Aceituno Jr.

Everson Demarchi, presidente da Cohab, determinou revisão nos processos de autorização de uso não onerosa de bem
Everson Demarchi, presidente da Cohab, determinou revisão nos processos de autorização de uso não onerosa de bem

A Companhia de Habitação Popular de Bauru (Cohab) começou na semana passada a revisar uma série de autorizações não onerosas de uso de terrenos e imóveis da empresa de economia mista. As permissões vêm desde pelo menos a década de 1980 e têm se tornado uma dor de cabeça ao atual presidente Everson Demarchi.

Uma delas envolve um terreno na avenida das Pitangueiras, na região do Núcleo Geisel, cedido em regime de comodato (empréstimo) a uma igreja em novembro de 1984. O contrato, que não prevê aluguel, foi assinado pelo ex-presidente da companhia Moussa Tobias e tinha quatro anos de duração.

A entidade construiu um prédio no local em meados da mesma década em que o terreno lhe foi emprestado. E agora, indica um parecer jurídico elaborado por um advogado da companhia, a empresa de economia mista pode ter de indenizar a igreja pelo imóvel.

"Deve ser alertado o risco real de a companhia ser condenada a indenizar as benfeitorias de quase R$ 600 mil pois o Código Civil prevê que uma das consequências da posse da corré é direito à indenização", afirma o documento.

Ocorre que a cláusula segunda do contrato de 1984 é clara ao dizer que "a comodatária [igreja] não terá direito à retenção ou a indenização das benfeitorias que realizar no imóvel, os quais ficarão incorporados ao mesmo".

A dúvida está em saber se o termo "benfeitoria" se estende à construção do prédio, que pode ser considerado uma "acessão" - definida pelo Código Civil como um "acréscimo" à gleba original, com o objetivo de criar coisa nova, a qual se incorpora ao bem.

Neste caso, a benfeitoria pode ser entendida como as despesas realizadas para uso e gozo do bem, como tributos relacionados à propriedade, contas e demais encargos.

Um julgamento recente da 3.ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a cláusula de renúncia a benfeitorias não se estende às acessões.

O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso, apontou que a existência de uma nova construção no imóvel ficou claramente demonstrada no processo, havendo divergência entre as instâncias anteriores quanto ao alcance da cláusula de renúncia a indenizações.

Segundo ele, é preciso diferenciar os conceitos de benfeitoria e acessão, institutos que não podem ser tratados da mesma forma: a primeira é uma melhoria de natureza acessória realizada em coisa já existente, enquanto a acessão é a aquisição da propriedade de acréscimos.

O caso, porém, envolvia um contrato de aluguel - resta saber se isso se mantém em sede de comodato, sobretudo quando não há um termo de anuência do cessionário com relação a eventuais construções no local.

O tema, de qualquer forma, não é pacífico nos tribunais. Há entendimentos de que as partes podem prever a renúncia à indenização em contratos paritários.

Este caso, no entanto, é apenas um entre ao menos 70 contratos de autorização não onerosa de bem público assinados pela Cohab e já levantados até o momento por ordem do presidente da companhia Everson Demarchi.

"Pedimos uma ampla análise do setor jurídico sobre esses contratos. Até porque há diferenças em cada negociação. Em algumas, a Cohab recebe aluguel; em outras, não", explica.

Segundo ele, a empresa de economia mista ainda não terminou a revisão desses contratos e ainda analisa eventuais providências. "Se o departamento jurídico pedir a retomada [das propriedades], faremos isso", pontua.

Os terrenos ou prédios utilizados em regime de comodato por terceiros não estão apenas em Bauru. Há casos em outros municípios, como Araçatuba, por exemplo, e envolvem geralmente cidades onde a Cohab já construiu lotes de habitação.

O levantamento dessas negociações, explica o presidente, não se restringe somente a saber o que fazer com os contratos de autorização não onerosa de uso de bem atualmente vigentes - mas se estende também ao futuro.

"O que percebemos é uma falta de critérios adotados na época em que essas permissões foram concedidas. Não havia padrão. É sobre isso que estamos nos debruçando", observa.

Há bens cedidos para finalidades diferentes - e o tratamento ao beneficiário também deve ser distinto. "Temos terrenos em que moradores horta, por exemplo. Não podemos conferir o mesmo padrão a quem usa um prédio da companhia", ressalta. A Cohab quer finalizar esse levantamento em até 12 meses para prosseguir com as discussões sobre padronização do tema.

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