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Dr. Automóvel: O carter do motor

Consultoria: Marcos Serra Negra Camerini*
| Tempo de leitura: 4 min

Qualquer máquina que tenha partes móveis em contato entre si precisa de lubrificação. Caso contrário, o atrito entre as peças danificaria as superfícies em contato e geraria tanto calor que as engriparia, levando à fusão das peças. O tipo de lubrificante que se usa é específico para cada máquina, e leva em conta a rotação relativa entre as peças, a carga aplicada e a temperatura a que está submetida, dentre outros fatores.

Um arado agrícola, por exemplo, é submetido a esforços extremos por ser puxado por um trator e estar enterrado a quase 40 cm na terra. Mesmo assim, trabalha na temperatura ambiente e a rotação de seus discos é muito baixa. Portanto, o lubrificante indicado é uma graxa de alta viscosidade e durabilidade. Já uma máquina de costura trabalha com peças pequenas e de alta precisão, submetidas a altas rotações, mas temperatura ambiente e operação intermitente, do tipo liga-desliga. Para ela, o lubrificante ideal é um óleo bem fino, de baixa viscosidade.

Um motor automotivo tem outras características, pois é submetido a esforços elevados, temperaturas altas e regime intermitente ou contínuo de funcionamento. Por isso, o óleo indicado é um mineral multiviscoso, com características detergentes e antiespumantes, que dure pelo menos 10.000 km de uso antes da troca e que ainda ajude na refrigeração do motor.

Este óleo fica armazenado no carter embaixo do motor, que é um reservatório com algumas características próprias. Dentro dele fica o tubo de sucção de óleo conhecido como pescador, que vem da bomba de óleo e fará a sucção do óleo para ser filtrado e pressurizado dentro das galerias de lubrificação em todo o motor. Se o nível de óleo estiver muito baixo, o pescador não sugará e a bomba não lubrificará o motor, levando ao seu engripamento. Por isso é importante verificar sempre o nível do óleo do motor pelas marcas na vareta de óleo e completá-lo ou substituí-lo quando necessário.

No carter, também tem uma chapa metálica chamada “oil splash baffle” ou quebra onda, que serve exatamente para reduzir o movimento ondular da superfície do óleo, como usado em carretas de transporte de combustíveis, os caminhões-tanque. Com os movimentos inerciais durante aceleração, frenagem e curvas, o líquido é movimentado para todos os lados gerando ondas. Se as ondas forem muito altas de um lado, causam vazios do outro que podem impedir a chegada do óleo ao pescador, interrompendo o fluxo de lubrificante pressurizado.

Carros esportivos de alto desempenho têm características próprias que precisam ser consideradas no projeto de um carter. Como são mais baixos para melhorar a penetração aerodinâmica e rebaixar o centro de gravidade, o carter fica mais exposto a batidas contra obstáculos no solo, portanto devem ser protegidos e reforçados. A aceleração e frenagem são mais fortes, assim como as suspensões suportam uma força G maior, o que significa fazer a curva com maior velocidade e aderência, o que jogaria o óleo para todos os lados no carter. A solução encontrada para estes casos foi o carter seco, que nada mais é que um carter bem menor que o comum, apenas para tampar a parte de baixo do motor, e que tem um reservatório de óleo externo. No carter seco, a bomba de óleo tem uma função dupla, que é a de pressionar o óleo para dentro das galerias e aspirá-lo de dentro do motor de volta para o reservatório, completando o ciclo de lubrificação.

O percurso do lubrificante é o seguinte: a bomba pressiona o óleo para o filtro e depois para o radiador de óleo externo. Daí segue para o reservatório, onde será centrifugado por uma serpentina que eliminará o ar, permitindo que o óleo possa ser novamente succionado e conduzido para as partes móveis do motor por meio das galerias do motor. Após a lubrificação, o óleo escorre de volta para o carter, que nada mais é do que uma bandeja, e a bomba o recolhe e reinicia o ciclo.

Então, por que todos os carros não utilizam carter seco? Basicamente pelo preço elevado do sistema. Seu uso mais comum está em veículos de competição, de pista ou off road. Isto porque estão sujeitos a maiores esforços laterais, de aceleração e frenagem ou mesmo de inclinação, caso dos jipes e carros de rallye. Nos jipes mais antigos com carter convencional, seu limite de inclinação é bem menor e pode ocasionar falta de óleo em situações extremas.

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* Marcos Serra Negra Camerini é engenheiro mecânico formado pela Escola Politécnica da USP, pós-graduado em administração industrial e marketing e engenharia aeronáutica, com passagens como executivo na General Motors (GM) e Opel. Também é consultor de empresas e é diretor geral da Tryor Veículos Especiais Ltda. Seu site é www.marcoscamerini.com.br.

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