Conversando com o Bispo

A solidão sonora

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19/01/2020 | Tempo de leitura: 3 min
Dom SevilhaBispo Diocesano de Bauru

O problema principal da humanidade talvez seja a solidão. Provavelmente, ela esteja na raiz de todos os males. O sentir-se sozinho e abandonado na vida, o sentir-se um órfão jogado no mundo, é a causa dos inúmeros males e dores da existência humana. Para fugir do desamparo muitos acreditam que, possuindo muitos bens, tornando-se ricos e importantes, perderão a invisibilidade afetiva, serão admirados e sairão da sarjeta da história.

A solidão gera medo e insegurança em relação ao presente e ao futuro, gera medo da morte e medo da vida, medo de amar e de não ser amado, medo de não deixar a própria marca na história humana e morrer no anonimato. A solidão gera ansiedade, ambição, apego, decepção, depressão etc.

Não há como fugir da solidão, pois ela faz parte inerente da condição humana. Mas, uma coisa é a solidão povoada e outra é a solidão vazia. A solidão pode ser habitada pela presença amorosa de Deus e torna-se uma "solidão sonora", como escreveu o poeta místico São João da Cruz. Onde está Deus é impossível haver solidão. Portanto, solidão não é estar sozinho, solidão é afastar-se de Deus. Está em nossas mãos a decisão de aproximarmo-nos de Deus e povoar a nossa alma com a sua presença amorosa.

Todos nós que temos fé sabemos como é intrigante perceber a real presença de Deus na nossa vida, mesmo quando não sentimos nada, mesmo quando não entendemos o pensar e o agir de Deus, mesmo quando tudo nos contraria e estamos sofrendo, mesmo assim, no profundo da nossa alma, permanece uma viva presença, silenciosa e amorosa. Podemos estar absolutamente sozinhos, mas jamais solitários, pois aquela presença misteriosa é mais presente em nós do que a nossa própria interioridade. Deus é mais íntimo do que o nosso íntimo, escreveu S. Agostinho.

Quem decide afastar-se de Deus estará sempre sozinho, poderá ser solidão a dois, solidão a três, ou solidão no meio da multidão. Transcrevo agora uma singela história que relata o rito de passagem para a vida adulta de um menino indígena.

O pai leva o filho para a floresta durante o final da tarde, venda-lhe os olhos e deixa-o sozinho. O filho ficará no topo de uma montanha à noite toda e não poderá remover a venda até que brilhem os raios do sol no dia seguinte.

Ele não poderá gritar pedindo socorro. Se ele conseguir passar a noite toda lá, será considerado um adulto. Ele fica proibido de contar a experiência aos outros meninos, porque cada um deve tornar-se homem a seu modo, enfrentando o medo do desconhecido.

O menino está, naturalmente, amedrontado. Ele ouve toda espécie de barulho. Os animais selvagens podem estar ao redor dele e alguns insetos e cobras podem vir picá-lo. Ele poderá ficar com frio, fome e sede.

O vento sopra sobre as árvores e balança os galhos, mas o menino permanece sentado, sem se mover, no alto da montanha, nunca removendo a venda dos olhos. Segundo os índios, esse é o único modo para ele se tornar um homem.

Finalmente, após a longa e sofrida noite, o sol aparece e a venda dos olhos é removida. O menino, então, descobre que seu pai estava sentado perto dele o tempo todo. Ele passou a noite toda protegendo seu filho.

Conclusão: Você não está sozinho na vida, pois você tem um Pai que o ama e cuida de você. Sei que não merecemos, mas somos amados porque Ele é amor e "eterno é seu amor" (Salmo 135). Seja feliz.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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