Reflexão e Fé

Pra que mesmo Deus se encarnou?

Hugo Evandro Silveira Pastor Titular - Igreja Batista do Estoril. E-mail: hugoevandro15@gmail.com

13/12/2020 | Tempo de leitura: 4 min

O padre laicizado Brennan Manning conta que havia uma árvore que amava um menininho. A árvore era feliz porque amava ver o menininho feliz. A princípio o menininho só desejava empoleirar-se nos galhos da árvore, comer seus frutos e descansar sossegadamente em sua sombra. Mas à medida que o menininho cresceu, seus desejos tornaram-se outros. Graças ao amor da árvore, ela lhe deu frutos para que o menino já crescido os vendesse para suprir suas necessidades. Futuramente a árvore que o amava ofereceu seus galhos a fim de edificar á casa da família do menino já homem. Por fim, até o tronco foi oferecido para a construção de um barco de passeio. A árvore que o amava deu tudo o que tinha. Por ter doado tudo de si o que restou foi um toco desgastado que ainda servia para que o menino, agora velho, descansasse seu corpo desgastado pelo tempo.

Fazendo uma analogia, o apóstolo Paulo escreveu em sua carta aos filipenses que o Senhor Jesus exaltado na glória, "embora sendo Deus, esvaziou-se de si mesmo" (Fp 2.6,7), encarnou-se, entregou-se, humilhou-se ao ponto de enfrentar morte de cruz, com cravos de ferro traspassados em suas mãos e pés, verteu sangue divino, "para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha vida eterna" (Jo 3.16). Assim como a árvore, de modo significativo, Jesus, por amor, se deu inteiro. Então, nesse sentido, o cristianismo não tem nada a ver com o que fazemos para Deus, mas sim, sobre o que Ele fez por nós. Então, como é que as pessoas ainda imaginam que a fé cristã consiste no que oferendam para Deus?

Nesse sentido o Natal está chegando. Então pra quê mesmo Deus se encarnou? O nascimento de Deus ao mundo representa acima de tudo, o Deus que se entregou por inteiro e amor com a finalidade de resgatar pessoas do sistema da maldade, do ódio, da ruina e morte. Como aquela árvore que amou e se deu por inteira, guardada as devidas proporções, o cristianismo é o Deus único que se deu por completo. Então, como podem as pessoas, fazerem do amor e do sacrifício de Deus, apenas umas idas á igreja, eventualmente aos domingos, e ainda esperando desse Deus garantias de uma boa vida nessa era material? Foi mesmo só pra isso que Jesus atravessou todo o horror sangrento do Calvário? Foi só pra isso que Ele foi traído e abandonado pelos amigos, zombado pelos inimigos e desprezado pelo Pai celestial? Foi mesmo só pra isso que Jesus se encarnou, venceu a morte ressuscitando ao terceiro dia? Foi só para as pessoas irem às missas e cultos, eventualmente aos domingos cumprindo ritos mecanizados? Foi só para tornar homens e mulheres apenas com uma aparência moral exemplar? Foi só para as pessoas barganharem favores de Deus? Foi mesmo só pra isso?

O evangelho é absurdo aos homens e, a vida de Jesus e sua mensagem não fazem sentido algum para a racionalidade, á menos que creiamos que ele nasceu, viveu, sofreu, morreu, ressuscitou e ascendeu aos céus com a finalidade específica de recriar novos homens e mulheres, isto é, renascimento, nascer de novo, regeneração, transformação, ética nova, cosmovisão celestial, esperança eterna, vida plena. O nascimento e a paixão de Cristo absolutamente não foi apenas para as pessoas irem aos domingos na igreja e apenas fazer parecer terem uma moral superficialmente apurada. A doação e o amor extremo de Jesus teve a finalidade nítida de criar uma comunidade de pessoas rendidas e invadidas pelo amor a Deus e ao próximo. Esse é o mistério do nascimento, vida, morte, ressurreição e ascensão de Cristo. Quem é invadido e transformado pela obra misteriosa de Jesus tem o seu âmago penetrado pelo ardente desejo de entregar-se também em amor, alegria e convicção. Isso é ser cristão. O cristianismo está distorcido pelo ceticismo e o intelectualismo. Ser cristão jamais se inicia com o que eu posso fazer por Deus, mas começa com o que Ele fez por mim, e a partir desse ponto, o benefício não são dividendos materiais, mas a paz, a satisfação e uma plenitude que só experimenta quem recebeu o Cristo em si, de corpo e alma.

Sobre a estória da árvore, ela é triste; talvez egoísmo de um lado e passividade do outro. Mas a vida é assim mesmo, salvo alguns momentos pontuais que experimentamos, entre outras coisas, a vida é construída com lágrimas, sacrifícios, perdas e finitude. Contudo ainda há uma grande oportunidade de aprazimento, que é quando se doa amor, como Jesus fez, e ainda que não haja gratidão do outro, quem se doa e ama, encontra sempre redenção.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

Receba as notícias mais relevantes de Bauru e região direto no seu WhatsApp
Participe da Comunidade

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.