
Mesmo sendo um dos produtos com menor valor no mercado da reciclagem, o papel virou a "menina dos olhos" das cooperativas em Bauru. Com preço de comercialização abaixo de R$ 1,00 o quilo, as chamadas aparas (papel, papelão e alguns tipos de embalagens plásticas finas) se tornaram o carro-chefe na subsistência dessas entidades, desbancando a rentabilidade do lixo eletrônico, considerado o material mais lucrativo por levar até resquício de ouro em sua composição.
A Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Bauru e Região (Ascam) explica que o cenário se deve ao volume muito maior de aparas que tem chegado às cooperativas da cidade, em detrimento ao do lixo eletrônico. Em quantidade bem superior, o papel acaba compensando mais.
"Se houvesse uma consciência coletiva maior e as pessoas descartassem corretamente seus eletrônicos, eles poderiam ser o 'ouro' da reciclagem, mas é um tipo de material que, hoje, quase não chega às cooperativas. Então, ele tem perdido um pouco da sua importância, passou a ser coadjuvante", destaca Gisele Moretti, presidente da Ascam, que iniciou campanha para aumentar a arrecadação (leia mais abaixo).
É preciso considerar, contudo, que o mercado de recicláveis também reflete a situação econômica do País. Em momentos de crise e desemprego, muita gente passa a buscar na atividade uma forma de subsistência ou de complementar a renda. Com os atravessadores, menos materiais - inclusive o lixo eletrônico - chegam às cooperativas.
REDUÇÃO
Em anos anteriores, o protagonismo do papel no mercado de reciclagem foi assumido pelas sucatas e pelas latinhas. Os eletrônicos, contudo, vinham ganhando espaço nos últimos anos, dentro dos oito Ecopontos de Bauru e, consequentemente, das cooperativas, que recebem o material da prefeitura.
Com isso, as entidades formadas por catadores chegaram até a designar funcionários para trabalharem especificamente com o lixo eletrônico. Mas, durante a pandemia, a redução do descarte regular desse material foi fortemente sentida. "O lixo eletrônico já deveria ter ultrapassado as aparas, mas não foi o que ocorreu", sustenta Gisele.
Para se ter uma ideia, o quilo das placas eletrônicas encontradas em aparelhos de TV, computadores e celulares chega a ser vendido pelas cooperativas por R$ 30,00. Já o cobre de motores de geladeiras e máquinas de lavar pode render até R$ 48,00 o quilo.
Se houvesse maior descarte correto do lixo eletrônico, a rentabilidade diante do alto valor desse material ajudaria famílias que sobrevivem da reciclagem. Segundo a Ascam, 95% dos catadores têm a atividade como única fonte de renda.
25 TONELADAS
Na Cooperativa Ecologicamente Correta de Materiais Recicláveis de Bauru (Coopeco), por exemplo, uma média de 25 toneladas de aparas é comercializada por mês. O lixo eletrônico, por sua vez, não supera 15 toneladas e, ainda assim, há muita sucata no meio.
Embora sejam menos volumosos, os eletrônicos destinados à reciclagem passam por análise individual e criteriosa, porque podem ser encaminhados ao mercado de reforma e reuso, ou serem desmanchados comercialização separadamente de suas composições. "Às vezes, o funcionário precisa de mais de uma hora para desmontar o equipamento", detalha Gisele.
Neste quesito, as aparas também oferecem outra vantagem, porque, apesar de necessitarem de equipe para separação em razão do volume, têm seleção mais fácil e rápida.