Praia em Sampa? Parque Villa-Lobos terá 'orla'

Um projeto desenvolvido pela empresa Orla Brasil propõe implantar o conceito de praia urbana no Parque Villa-Lobos, localizado na zona oeste de São Paulo. O complexo contará com quadras, quiosques e restaurantes em um espaço coberto por areia que receberá, segundo os organizadores, aulas de diferentes modalidades esportivas e gratuitas diariamente.
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Apesar das promessas, a Orla Villa-Lobos, prevista para ser entregue ainda este ano, enfrenta resistência da SAAP (Associação dos Amigos de Alto dos Pinheiros).
O que o projeto planeja entregar
A ideia é trazer o conceito de orla para dentro da cidade. "Nosso objetivo é oferecer novas experiências que harmonizem bem-estar, lazer e entretenimento em um ambiente natural e sustentável", diz Guilherme Borges, sócio-fundador da Orla Brasil. Para isto, além de trazer a areia para recriar o ambiente praiano, a Orla terá um parque infantil com chafarizes, uma série de quiosques com gastronomia variada e atividades gratuitas durante a semana como ioga, alongamento e ginástica, entre outras modalidades.
No total, serão 8 mil metros quadrados destinados ao projeto ? para efeito de comparação, o parque tem cerca de 732 mil metros quadrados.
Ao redor da área central da Orla, serão distribuídas cinco quadras específicas para esportes na areia. Eduardo Rigotto, CEO da Reserva Parques (concessionária responsável pela gestão do parque, privatizado em 2022), afirma que o projeto é uma oportunidade, também, para modernizar os equipamentos esportivos oferecidos ao público e ampliar as opções de práticas esportivas, como o beach tennis, modalidade que vem ganhando milhares de adeptos paulistanos. " [O projeto visa] Democratizar o acesso aos esportes de areia que ainda são praticados majoritariamente em áreas privadas na capital", explica.
O acesso à Orla será gratuito, porém parte do complexo pode ser explorada comercialmente. Os visitantes não precisarão pagar para entrar na área. Para utilizar uma das quadras, os usuários deverão agendar um horário via aplicativo ou site, da mesma forma como ocorre atualmente. Apesar da gratuidade no acesso, haverá a locação de algumas das quadras para a realização de eventos ou aulas particulares no local, mediante pagamento. Segundo Rigotto, o edital e o contrato de concessão preveem este uso por parte do projeto. "Não haverá nenhuma área nos moldes de clube exclusivo para associados", reforça.
O projeto tem esforços voltados ao meio ambiente. Segundo a Orla Brasil, as medidas com foco em compostagem e reciclagem deverão destinar menos de 10% dos resíduos sólidos gerados na Orla Villa-Lobos aos aterros sanitários. "Relatórios automáticos de eficiência energética e hídrica, desenvolvidos pela empresa islandesa Klappir, estarão disponíveis ao público", explica a empresa.
Segundo o cronograma da Orla Brasil, o projeto deve sair do papel ainda em 2025. "O canteiro de obras e a mobilização se iniciam ainda em fevereiro", diz Borges.
A previsão de conclusão é de sete meses, a depender das condições climáticas. Caso as obras sigam conforme o planejado, a Orla Villa-Lobos estará aberta ao público em meados de setembro.
Associação é contrária ao projeto
O projeto da Orla Brasil foi apresentado, também, ao Conselho do Parque. A Associação dos Amigos de Alto dos Pinheiros (SAAP), associação sem fins lucrativos dedicada à preservação do bairro, se diz contrária ao projeto. Ignez Barretto, presidente do Conselho Consultivo da SAAP e membro do Conselho do Villa-Lobos, explica que não concorda com a implementação da Orla por conta de sua dimensão. " [Espaços para] beach tennis menores talvez sejam positivos. Achamos que a dimensão e o formato do projeto não são uma boa proposta para os usuários do parque", diz.
A Orla será construída onde, nesta terça-feira (11), há um campo de futebol. Para Ignez, há um risco de perda não só deste campo, mas de área verde como um todo. Segundo a Reserva Parques, o campo em questão será remanejado para o outro lado do parque, junto aos demais campos para a modalidade. "Nenhuma área verde será suprimida", diz Rigotto.
Ignez ressalta, ainda, que o projeto pode "descaracterizar" o parque. "Não sou contra atrações, mas [eventuais shows e instalações] são eventos dispersos feitos por diferentes empresas. Com a Orla, perdemos um pouco da unidade e da qualidade do que usuários e cidadãos entendem como um parque", explica. "O problema é que o contrato de concessão é um pouco vago e dá margem para fazerem isso [ter espaços com acesso mediante pagamento, como parte das quadras da Orla]. É uma discussão subjetiva".
Eventuais pagamentos para utilização de algumas das quadras e a associação da Orla com o consumo de alimentos também são vistos com ressalvas por especialistas. Matheus de Vasconcelos Casimiro, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que as instalações trariam mais benefícios à quem tem uma renda passível de usufruí-las. "Sabemos que não é a realidade de grande parte da população da cidade de SP", diz. "Toda a descrição [disponível até o momento sobre a Orla] está vinculada ao que será vendido ou a oferta de eventos que deverá ter nessa área".
"[A Orla está] Seguindo a tendência do que se tem visto nos diversos parques cuja gestão tem sido realizada pela iniciativa privada, em que várias ações de melhoria dos parques e criação de equipamentos estão vinculadas à geração de receita para viabilizar a manutenção da parceria ou a margem de lucro da empresa responsável pela área, como cobrar estacionamentos, gerar eventos pagos ou aumentar a oferta de alimentos", disse Matheus de Vasconcelos Casimiro.
Para Camisiro, o foco no consumo e nos eventos "inibe a diversidade de usos do espaço público". "O problema principal é associar o usuário do parque como um cliente de consumo. É um processo gentrificador [em que há revitalização e transformação social em uma área urbana de habitação popular, que gera aumento no valor dos imóveis e passa a atrair moradores com maior poder aquisitivo], que torna o espaço público uma área voltada apenas àqueles que têm a condição de consumir os produtos ofertados".
Casimiro afirma que os quiosques gastronômicos previstos fazem parte deste processo. Segundo Rigotto, a entrega de novas opções de alimentação é uma das medidas previstas e obrigatórias no edital de concessão.
Segundo o professor, as autoridades e as concessionárias têm o desafio de viabilizar bons projetos em parques públicos, com espaços propícios à ocupação da população, mantendo as condições de livre ocupação. " [O ideal é não haver] associação a consumo. Usuário não é cliente. A cidade de SP tem vários exemplos de parque de orla, como o Estadual Ecológico do Guarapiranga, e os Municipais do Guarapiranga, Cantinho do Céu (orla da Billings) e o Praia do Sol. Esses são espaços destinados a todas as rendas e muito utilizados pela população de baixa renda, e são exemplos de espaços livres públicos, onde há o uso da orla, e que não estão gentrificados ou associados ao consumo".
Segundo Eduardo Rigotto, todas as implantações de equipamentos no parque devem ser submetidas aos órgãos competentes, conforme determina o edital. "Após a aprovação do Concedente, a Orla Brasil realizou os trâmites para aprovação junto à Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento e à Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo)". A Companhia é envolvida nos projetos no Villa-Lobos, já que o parque foi construído em um terreno anteriormente utilizado como depósito de lixo do Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo), também na zona oeste. Ainda segundo Rigotto, a Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo), realiza a fiscalização da operação no âmbito do contrato de concessão.
A Semil (Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo) se manifestou sobre o projeto. Consultada pelo UOL, a Semil informou que "não houve objeção" por parte da pasta em relação ao projeto (leia a íntegra da nota ao final da reportagem).
O que diz a Semil
Em nota enviada à reportagem, a Semil declarou:
A Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística de São Paulo (Semil) informa que a concessão de bem público do Parque Villa-Lobos prevê a realização de obras e investimentos, a prestação de serviços e a exploração econômica de atividades de esporte, com os serviços associados, sempre em compatibilidade com o plano diretor do Parque.
O novo equipamento esportivo [o projeto Orla] já estava previsto, em consonância com o plano diretor. Não houve objeção da Semil sobre o projeto Orla BR. Nos termos do contrato, a concessionária poderá implantar novas quadras ou realocar as existentes, desde que mantendo o mesmo quantitativo e características de quando da assinatura do Termo de Entrega do Bem Público, e desde que compatível com os locais e usos previstos no Plano Diretor. As quadras de areia existentes na entrega do bem público permanecerão de uso gratuito, tal como previsto em contrato.
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