
Hoje (12), é celebrado o Dia Mundial do Hip Hop, arte de rua que contempla a música, a dança, as artes visuais e a expressão corporal; B-boy de Birigui conta sua trajetória no movimento
Bryan Belati
Na arte, tudo se conecta. Assim como na história, em que acontecimentos abrem portas para outras nações surgirem, na arte o desenvolvimento de uma estética influencia as demais.
Foi dessa forma que o movimento do Hip Hop nasceu, no final da década de 1960, nos Estados Unidos. A vertente surgiu como forma de reação aos conflitos sociais e à violência sofrida pelas classes menos favorecidas da sociedade urbana.
Hoje (12), comemora-se o Dia Mundial do Hip Hop, data que celebra o movimento e todas as suas vertentes, além de exaltar a força que a junção de diversas expressões artísticas imprime nos jogos sociais e na estética das cidades.
MOVIMENTO
Trata-se de uma arte de rua, um movimento de reivindicação de espaço e voz das periferias, traduzido nas letras questionadoras e agressivas, no ritmo forte e intenso e nas imagens grafitadas pelos muros das cidades.
O hip hop enquanto movimento é composto por quatro manifestações artísticas principais: MCing que é a manifestação do mestre de cerimônias, que anima a festa com suas rimas improvisadas,a instrumentação dos DJs, a dança do breakdance e a pintura do grafite.
É um movimento cultural surgido no Bronx, gueto nova-iorquino, no final de 1960. A sonoridade do Hip Hop carrega a influência de uma grande diversidade de estilos musicais, a maioria de origem negra, como o funk, o rock, o blues e o reggae.
Desde a década de 1930, com a migração da população negra do sul para o norte dos Estados Unidos, o Blues passou a ser desenvolvido com instrumentos elétricos, o que originou o que se conhece hoje por R&B (Rhythm and Blues), que consequentemente se funde com a música gospel protestante, resultando no Soul.

A partir de 1960, o Soul se torna a música de proteste dos movimentos em favor dos direitos civis dos negros, tornando-se a “black music” americana. Na luta por uma real cidadania, a palavra “funky” (fedido, em tradução literal), se popularizou, pois era muito utilizada por seus agressores. Desta forma, o Funky passa ser uma forma de atitude e identidade negra no vestir, falar, dançar, enfim, viver.
No Brasil, o movimento teve início em 1970, quando alguns músicos se apropriaram do estilo. O Rio de Janeiro se tornou o expoente do movimento, por concentrar a maior mídia de massa da época, além de aglomerar grandes equipes de som, como as “Soul Grand” e “Furacão 2000”, com realização de grandes bailes na zona sul e subúrbio da cidade. A imprensa batizou este movimento ao orgulho negro de “Black Rio”, entrando a década de oitenta sacudindo clubes, discotecas e casas noturnas das grandes capitais brasileiras.
Ao mesmo tempo, nos Estados Unidos, mais precisamente em Nova Iorque e Detroit, uma reação ao movimento Black Power acontecia, com o surgimento dos primeiros elementos estéticos da cultura Hip Hop, o RAP (Rhythm and Poetry).
As batidas para as músicas de rap surgiram com a reciclagem de discos de vinil, ao arranhar a agulha no sentido anti horário (stracting), alterar a rotação do disco (phasing) e produzir eco entre duas picapes (needle rocking). Os DJs (disc jockeys), produziam seus sons nas ruas e becos, desta forma proporcionando o surgimento do movimento Hip Hop, que passou a unir a breakdance, o rap, o graffiti, e o estilo b-boy (b-girl) com suas grifes esportivas.
O Hip Hop chega ao Brasil, vindo da Flórida (EUA), pelo ritmo “Miami Bass” de músicas com batidas rápidas e erotizadas, com o desenvolvimento do ritmo que anos mais tarde ficou conhecido como “funk”, o ritmo urbano brasileiro, uma retomada ao movimento anterior.
Duas vertentes vão surgir neste estilo que acaba de chegar às comunidades de baixa renda. A primeira, atende a demanda da produção midiática, à cultura de massa, que visa o lucro com a produção e oferece à população como forma de lazer. A segunda, propõe uma ação de protesto político e social para o exercício da cidadania.
BIRIGUI
Gustavo Fernandes, conhecido na cena do Hip Hop como Nyambertal, é um dançarino de breaking de 26 anos, nascido e criado em Birigui (SP). Ele conta que conheceu o movimento do Break Dance no começo de 2008, no bairro João Crevelaro, onde morava.
O Break Dance é a linguagem artística dentro do Hip Hop praticada pelos b-boys e b-girls, os adoradores de grifes esportivas. Este estilo de dança surgiu com a quebra da bolsa de valores dos Estados Unidos, em 1929, quando aconteceu o desemprego em massa.
Os artistas dos cabarés americanos foram às ruas se apresentarem em busca de dinheiro. Daí surge a “Street Dance” (Dança de Rua), porém com uma estética própria daquela época. O break dance baseia-se na performance do dançarino, na sua capacidade de travar e quebrar os movimentos leves e contínuos.
Ela é uma estética específica dentro da Dança de Rua (Street Dance) que possui característica de enfrentamento, protesto e/ou performance em grupo, mas permitindo que em determinado momento da apresentação alguém possa improvisar com a sua habilidade em break dance.
E foi durante as férias escolares, quando tinha 12 anos, que Gustavo avistou alguns de seus amigos, os quais jogavam bola com ele, praticando o breaking dance, dançando e desenvolvendo alguns passos.
“Comecei a dançar na rua, era bem divertido. Fiquei um ano treinando na escola, mas a moda do rebolation fez o pessoal migrar para outras vertentes como o psy. Eu era apaixonado pelo breaking e me vi sozinho”, relata o artista.
Meses depois, passou a frequentar a KDB Hip Hop, uma escola do movimento que funcionava em Birigui. Ele explica que foi a partir daí que passou a ter noção do que era o Hip Hop como um todo, ao ser integrado a um espaço aberto às diversas manifestações artísticas, que misturavam artes visuais, dança, música e performance.
“Eu sabia dançar, mas não tinha técnica. E foi lá que a minha dança foi aprimorada, que eu aprendi o nome dos movimentos, a intenção de cada um deles e como o Break Dance era rico artisticamente”, diz Nyambertal.

Em sua trajetória, o artista se formou em Educação Física (Bacharelado), participou de diversas competições regionais e nacionais, e é hoje um dos expoentes da cultura Hip Hop em Birigui e região.
O artista também é produtor cultural e desenvolve eventos do âmbito do Hip Hop na região. Um deles é a “Batalha da Moeda", que teve 13 edições, de outubro de 2016 a outubro de 2017, o último evento do ciclo.
A ideia surgiu de uma brincadeira que os artistas de hip hop faziam quando se encontravam para dançar e treinar juntos. Entre 2014 e 2015, na Praça Pedro de Toledo, no centro de Birigui, foi construída uma sala de vidro, e o pontilhão foi fechado.
Os artistas treinaram lá por dois anos, e uma vez por semana, ao final dos treinos, cada um dava uma moeda e eles faziam uma competição. Quem ganhava, levava todas as moedas. E foi daí que surgiu a ideia do evento.
Desde a primeira edição até a última, em 2017, a taxa de participação era R$ 1,00, pagamento simbólico. Os ganhadores levavam troféus. A última edição, que aconteceu no Sisep (Sindicato Funcionários Servidores Público Municipais), foi a “Batalha da Moeda Fatality”.
O evento contou com a presença de artistas de Minas Gerais, Mato Grosso, Paraná e São Paulo. O ciclo foi encerrado em 2017, e em 2018 foi feita uma nova edição em parceria com o Sesc Birigui. Em 2019, o evento foi para Penápolis, Tupã e Araçatuba. Atualmente, o projeto se encontra em sua 19ª edição, além de outros eventos.
IMPORTÂNCIA
Gustavo Fernandes afirma que o hip hop é importante não só para a região de Birigui, mas para todo o mundo, pois é o movimento que promove a mensagem de retirada dos jovens da criminalidade. Pois, ainda que o estilo de vida urbano prevaleça, a arte é praticada e se torna o ganha pão do cidadão.
Nyambertal explica que, se você não gosta de dançar, existem outras possibilidades dentro do movimento, como rimar, pintar e tocar. Por isso, o Hip Hop oferece escolha aos adeptos, possibilidades musicais, canto, rima, poder da fala, dança, expressão corporal e arte visual.
“Jovens periféricos, sem qualidade de vida, sem nada. Se não há oportunidade, vai para o crime. Então, seguindo uma arte periférica, existe um poder de transformação. Pessoas encontram no hip hop uma saída, uma voz, uma oportunidade, uma auto estima, então tem esse poder transformador que agrega na vida do cidadão e toma sua mente para algo positivo. Tem lugar para qualquer um no Hip Hop, sem nenhum preconceito”, reitera o artista.
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