A corrida e a caminhada são apenas um “motivo” para um pedido de socorro. À procura de uma “palavra amiga”, algumas mulheres têm participado cada vez mais de um grupo recém-criado em Piracicaba, o “Sem Referência”, que se reúne às quartas-feiras, no Parque da Rua do Porto, para compartilhar experiências, buscar apoio e dar e receber carinho e conselhos. Tudo em meio à prática esportiva.
Porém, felizmente, as que procuram ajuda são a minoria; a grande maioria das corredoras do grupo está de bem com a vida e quer mesmo é ficar em dia com a saúde e com o corpo bonito. “O grupo é inspirador. As líderes têm a habilidade de incentivar cada uma, com suas diferenças e limites. Costumo dizer que é minha terapia semanal”, testemunha Cássia Buscariol, 42 anos, profissional de Controladoria.
Feliz, Cássia está se preparando para a primeira corrida na São Silvestre, em São Paulo. “É um grande desafio pessoal. São 15 km. Além do treino de quarta, faço mais três treinos de corrida durante a semana, além dos treinos de fortalecimento. Meu objetivo é atravessar a linha de chegada, descansando o mínimo possível. Até dezembro, pretendo intensificar os treinos realizados e aumentar as distâncias percorridas”, conta.
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Outra piracicabana muito animada é a autônoma Yandrini Conceição Ferreira Barbosa, de 26 anos: “A importância dos treinos na minha vida me trouxe muitos benefícios. Sinto que melhorei muito meu condicionamento físico e a saúde mental”, diz Yandrini, que se uniu ao grupo recentemente, em junho deste ano.
“No início, eu não fazia 1 km correndo sem parar para descansar, pois eu tinha muita dificuldade em controlar a respiração e manter o ritmo. No dia 2 de agosto, eu consegui completar meu primeiro 5 km correndo sem parar; foi tamanha felicidade e superação. Até que, no dia 8 de setembro, chegou o tão esperado 10 km! Foi um misto de sensações choro, felicidade. Só coisa boa”, declara.
“Participar desse grupo foi descobrir minhas capacidades, me tornar outra pessoa; elevou minha autoestima, melhorou demais a minha saúde, qualidade de vida e me fez ter a certeza de que somos grandes mulheres. Esse grupo é a união de pessoas incríveis, que nos apoiam e nos fortalecem a todo momento”, elogia a assistente social Rosane de Lima Borges, de 40 anos.
Rosane conheceu o grupo há um ano e meio e diz que, no início, não acreditava que poderia percorrer longas distâncias. Hoje faz provas de até 19 km. “A corrida é meu esporte favorito e prático três vezes na semana. Participo de várias corridas, fiz grandes amizades e cada medalha de participação é uma alegria e um orgulho enorme”, reconhece.
CRESCENDO
O grupo Sem Referência começou tímido, em julho do ano passado, e foi tomando forma. Com ações nas redes sociais e a propaganda “boca-a-boca”, o conjunto já tem quase 50 participantes.
“Eu acredito que seja a minha missão nessa vida”, conta a empregada doméstica Patricia Aparecida dos Santos, 50 anos, idealizadora do Sem Referência. “Já tive febre maculosa. Fiquei muito mal. Poucos sobrevivem depois dessa doença e acredito que sobrevivi para isso.”
Toda quarta-feira, por volta das 19h, elas estão lá: em frente ao relógio do Parque da Rua do Porto para iniciar mais um treino. O perfil delas é de donas de casa com sobrepeso, na faixa dos 30 a 65 anos.
O treinamento, além de ser prazeroso, ainda ajuda a unir as mulheres e todas se ajudam. “As pessoas vão expondo suas vidas. Toda quarta é uma história diferente”, declara Patrícia.
Com essa nova demanda, a líder convocou uma amiga de longa data para ajudá-la. Aposentada pela prefeitura e com experiência na área da saúde. Elaine Aparecida Alves, de 55 anos, foi a “peça” que faltava na equipe.
“Por ser da área da saúde, inclusive da área da saúde mental, a Patrícia pediu para que eu ficasse responsável pela caminhada, foi onde o grupo ganhou um formato, acolhedor, não somente para exercitar”, lembra.
“Então as pessoas chegam até nós; não somente para caminhar, mas para serem acolhidas. E confesso que isso tornou muito mais prazeroso que os treinos: saber que podemos contribuir não somente com o físico e mental, mas também com o emocional”, conta.
Nesse tempo, Elaine já viu e ouviu de tudo: meninas com problema de relacionamento abusivo, enlutada do esposo que cometeu suicídio, mulher que amputou o braço e precisava de auxílio, autista que passou por outras equipes e não recebeu apoio, entre outros inúmeros casos.
“Quando se fala de grupo de corrida, as pessoas acham que têm que chegar aqui e já correr, e o nosso grupo surgiu justamente para desmistificar isso. Ela pode vir para caminhar, conversar enquanto isso, acolher mesmo, para que se sinta à vontade e a partir daí se sinta segura para correr”, finalizou Elaine.