EDUCAÇÃO

Aprovada na Alesp, vedação a celular nas escolas divide opiniões

Por Tisa Moraes | da Redação
| Tempo de leitura: 5 min
Tisa Moraes
Fábio Leyser Gonçalves com a filha, Alice Bizeto Leyser Gonçalves, 15 anos
Fábio Leyser Gonçalves com a filha, Alice Bizeto Leyser Gonçalves, 15 anos

Aprovado pela Assembleia Legislativa (Alesp) na última terça-feira (12) e pendente de sanção do governador Tarcísio de Freitas para entrar em vigor, o projeto de lei que prevê a proibição do uso de celulares em unidades de ensino públicas e privadas do Estado tem gerado opiniões divergentes na comunidade escolar de Bauru. De autoria da deputada Marina Helou e assinada por outros 42 parlamentares, a proposta veda a utilização de dispositivos eletrônicos com acesso à Internet, incluindo tablets e relógios inteligentes, também durante o intervalo entre as aulas.

As únicas exceções são para realização de atividades pedagógicas e alunos com deficiência. Pais e estudantes ouvidos pelo Jornal da Cidade nesta semana manifestaram perspectivas variadas sobre a mudança, entre elas o fato de a proposta não ter sido discutida junto à comunidade escolar e a existência de dificuldades práticas para a implementação, especialmente nas unidades públicas, que possuem menos recursos estruturais.

Em sua justificativa para embasar o projeto de lei, Marina Helou alegou que "o uso constante de dispositivos móveis durante as aulas tem sido associado a uma diminuição significativa na capacidade de concentração e desempenho acadêmico", argumento que figura como uma das poucas unanimidades entre pais, estudantes e educadores de Bauru.

A dona de casa Juliana Augusto Pereira, 48 anos, mãe de Pedro Augusto Pereira, 15 anos, aluno do 1.º ano do ensino médio, conta que, na escola privada em que ele estuda, houve uma enquete online para consultar os pais sobre a implementação de maior controle no uso de dispositivos com acesso à Internet na unidade. A maioria, segundo ela, respondeu que sim.

"Celular distrai, interrompe a concentração nos estudos, gera ansiedade a cada notificação. É muita informação chegando o tempo todo, então, fica difícil", analisa. Pedro ponderou que a medida não trará impacto na sua rotina, já que está acostumado a não manusear o celular durante a aula, porém, revelou que a mudança dividiu opiniões entre seus colegas.

'SEM RESPALDO'

Chefe do Departamento de Psicologia da Unesp de Bauru, o professor Fábio Leyser Gonçalves possui estudos sobre dependência não química, como redes sociais e jogos eletrônicos, e é pai de duas jovens, uma delas Alice Bizeto Leyser Gonçalves, 15 anos, aluna do 9.º ano do ensino fundamental em uma escola particular. Para ele, a medida foi autoritária e incompatível com o ambiente de experimentação que toda escola deve fomentar.

"Especialistas não foram ouvidos para elaborar esta lei, que não possui qualquer respaldo científico. O caminho é ensinar limites. Com a proibição, perde-se a oportunidade de aprender sobre a utilização de algo que faz parte da realidade das pessoas", lamenta.

Outros desafios apontados por ele são como o governo fiscalizará o cumprimento da medida e com quais recursos estruturará as escolas estaduais para armazenamento dos equipamentos. O PL menciona que os dispositivos devem ficar guardados e inacessíveis aos alunos, mas não determina de qual forma.

"Se um celular sumir, quem será responsável pelo ressarcimento?", questiona. Neste contexto, a diarista Andréia Nery, 45 anos, mãe Abner Nery, 16 anos, estudante do segundo ano do ensino médio em uma unidade de ensino pública, avalia que haverá aumento do risco de assaltos se, por exemplo, aparelhos de alunos de uma escola inteira ficarem em um único local. "A escola terá uma responsabilidade muito maior. É complicado", lamenta.

REFLEXÃO

Estudante do 9.º ano do ensino fundamental, Alice Bizeto Leyser Gonçalves, 15 anos, avalia que a nova norma, se sancionada, será inútil, já que, em sua opinião, alunos desinteressados não voltarão a prestar atenção nas aulas sem o celular. "Acredito que as pessoas vão voltar a conversar mais umas com as outras a ponto de virar bagunça e atrapalhar quem quer aprender o conteúdo da aula", projeta.

Abner Nery, 16 anos, aluno do ensino médio, pondera que, nas ocasiões em que a escola onde estuda fica sem Internet ou energia elétrica, principalmente quando há temporais, as aulas por meio de plataformas digitais só não são interrompidas porque cada estudante utiliza seu próprio aparelho. "A escola fornece os computadores na sala de informática, mas, quando uma situação desta ocorre, cada um usa sua Internet para fazer as atividades pedidas pelo professor. Agora, sem nossos celulares, como a escola vai garantir a continuidade destas atividades?", indaga.

Abner se preocupa quanto à agilidade da comunicação entre a escola e os pais em situações críticas como notícias que envolvem familiares. É um receio que não atinge o empresário Fernando de Brito, 40 anos, padrinho de Ana Clara Belhomo, 12 anos, estudante do ensino fundamental de uma escola pública da cidade.

Para ele, a instituição encontrará meios para garantir contato rápido quando necessário. "Acho a proibição excelente. Vai parar de tirar o foco do aluno. É assim que funciona dentro da maioria das casas", compara, em consonância com a opinião da afilhada. "Muitos alunos perdem tempo com celular, ficam falando enquanto jogam online e atrapalham, então, a proibição vai ajudar bastante", analisa Ana Clara.

POSICIONAMENTO

Em nota, a Secretaria da Educação do Estado informou que o PL será analisado pelo governo, que terá 15 dias úteis para se manifestar, e acrescentou que o acesso a aplicativos e plataformas sem fins educativos nas unidades da rede pública estadual é restrito.

A subsede Bauru da Apeoesp disse concordar com a medida, mas apontou que responsabilizar escolas e professores a aplicá-la pode ampliar conflitos nas unidades e acrescentou que a maioria delas não têm funcionários em número suficiente para operacionalizar o recolhimento e entrega dos celulares. Neste sentido, avalia que a lei pode resultar em pressão sobre direção e professores quanto à fiscalização e responsabilização de quem descumpri-la. Além disso, destaca que, diante da falta de equipamentos e Internet de qualidade, muitos alunos dependem de seus celulares para fazer tarefas nas plataformas digitais.

Abner Nery, 16 anos, estudante do segundo ano do ensino médio de escola pública
Abner Nery, 16 anos, estudante do segundo ano do ensino médio de escola pública
Juliana Augusto Pereira com o filho Pedro Augusto Pereira, 15 anos
Juliana Augusto Pereira com o filho Pedro Augusto Pereira, 15 anos
Fernando Santos de Brito com a afilhada Ana Clara Ferreira Belhomo, 12 anos
Fernando Santos de Brito com a afilhada Ana Clara Ferreira Belhomo, 12 anos

Comentários

Comentários