Mistério e mudança

08/12/2022 | Tempo de leitura: 3 min

No primeiro domingo do Advento, com o convite a ficarmos vigilantes, o Padre Márcio Felipe de Souza Alves, Reitor no Santuário Santa Rita de Cássia, em meio a várias reflexões em sua homilia, disse que o mistério do Natal é o mesmo que celebramos todos os anos, mas nós não somos os mesmos.

Mantive comigo essa palavra. Realmente, o mistério do Natal é o mesmo, porque Deus é fiel e como disse a Moisés (Êxodo, 3, 14): "Eu sou aquele que sou". Não é Aquele que era ou que será. Eu, que oscilo, em inúmeras situações, que sou infiel. Mesmo assim, o Senhor me busca, abraça e me indica a estrela que os magos viram no Oriente.

Não sou a mesma do ano passado. Tantas coisas aconteceram que me marcaram, amadureceram, fizeram chorar e rir e me levaram, também, a ver em que preciso mudar para carregar Belém neste Natal. Aprofundei-me no compromisso com a verdade, mesmo que ela me custe o desagrado de pessoas que preferem o silêncio à denúncia. Reconheço que o bom em mim é Deus que age, o mal é fruto da ascensão de meu eu. Como escreveu Santo Agostinho: "Meu único recurso é a minha vontade". Nem sempre faço com ela o que deveria.

Tenho saudade de natais anteriores em que não experimentara tantas ausências. Mas uma coisa é certa: melhor carregar lembranças de minha gente, do que vazios de não ter vivido os cuidados que protegem e fortalecem.

Não me recordo de aguardar Papai Noel em algum 24 de dezembro. Em todos os anos, contudo, houve presépio e visitas a presépios. Do tempo em que moramos na rua Atílio Vianelo, de dezembro de 1958 a dezembro de 61, a imagem do Menino Jesus visitava as casas. No percurso, íamos com velas acesas e cantando: "O meu coração é só de Jesus/ A minha alegria é a Santa Cruz. / Nada mais desejo, nem quero senão/ Que viva Jesus no meu coração. / Eu só peço a Deus, na minha oração, / Que viva Jesus no meu coração". Impactou-me. Era pequenina e o que me encantava no Natal era o Menino. Na Catedral, na época Igreja Matriz Nossa Senhora de Desterro, na qual participávamos da Missa, completava o arrebatamento a imagem do Sagrado Coração de Jesus. A sua expressão me emociona e me chama até hoje.

De presente, a boneca Pierina foi que mais me cativou, embora fosse lindo o meu boizinho róseo de pelúcia. Ganhei-a aos dez anos e a tenho comigo. Nosso pai fora a São Paulo e demorava para chegar. Fiquei preocupada. Aguardei-o sentada no degrau de fora da casa onde morávamos a partir de 1963, na rua Rangel Pestana. De repente ele virou a esquina da rua Siqueira de Moraes, com uma caixa grande, e corri ao seu encontro. Era a Pierina que chegava à minha história e assoprava a angústia de pensar que algo ruim acontecera ao nosso pai. O coração bateu mais forte por ele do que pela boneca. São reminiscências fragmentadas, mas o Menino não.

Daqui uns dias acontece o Mistério do misericórdia grandiosa do Senhor, que nos oferece o Natal. O Senhor que veio, vem e virá, conforme afirmou o Padre José Roberto de Araújo, em sua homilia, no Carmelo São José, no segundo domingo do Advento.

Como diz a música de Luiz de Carvalho: "... Abre bem a porta do teu coração/ E deixe a luz do céu entrar".

Vem, Senhor, nas palhas de minha alma que, apesar de minhas misérias, procuro amaciar para recebê-Lo!

Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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