Agapantos

03/11/2022 | Tempo de leitura: 3 min

Os agapantos lilases do Jardim do Beija-Flor da Casa da Fonte começaram a florescer. Um deleite para os olhos. Flor de origem do sul da África, conhecida também por lírio-africano ou flor do Nilo. No ano passado que soube, pelo meu querido primo Odailton Cássio Lima Corrêa, que sua florada maior é no tempo de Finados e costuma acontecer uma semana antes ou durante. Sua avó, tia Santinha, a chamava de “Flor de Finados” e a cultivava em meio aos pés de rosas brancas. Encantou-me.

Em 2021, foi o primeiro Finados sem a presença de nossa mãe e contemplar os agapantos na Casa da Fonte, projeto pelo qual ela se apaixonou e onde dava aula de tapeçaria para as crianças nos últimos 16 anos que viveu em meio a nós, fez-me sentir um aceno do Céu.

O Agapanthus vem do grego, Ágape, que significa amor e Panthus significa flor. Flor do amor. Bem isso. Amor que se transformou em saudade.

Segundo estudiosos de cores, o tom lilás cria uma atmosfera serena e intimista e diz respeito à espiritualidade, intuição, piedade, espiritualidade, purificação e transformação.

Há beleza dolorida que vem à tona em Finados e em certos dias.

Recordei-me de versos escritos e colocados por nosso avô paterno no túmulo da filhinha de dois anos, que nascera com limites de saúde. São do carinho! “Ternura, graça e inocência/ depositados aqui. /Terra, não pese sobre ela, / pois não pesou sobre ti”. Sem dúvida a terra não pesou, pois Deus a revestiu com asas para chegar além do pôr do sol.

Assim que a alma de nossa mãe foi elevada, recebi de imediato, ainda na UTI, de Dom Gil Antônio Moreira, Arcebispo de Juiz de Fora a canção “Que os Anjos te conduzam” de Irmã Miriam Kolling (1939-2017): “Que os anjos te conduzam,/ Pelas mãos, ao Paraíso:/ Para a festa do Cordeiro/ Convidado(a) tu estás!/ Co’alegria te introduzam/ Na cidade do sorriso:/

Quem te amou assim primeiro,/ Seja agora a tua Paz!(...) E por toda a eternidade/ Tua voz cante o hino/ Dos eleitos, que na história,/ Fiéis seguiram o Senhor!” Fez-me um bem imenso e retorno a ela inúmeras vezes, em especial quando me vejo de alma cinzenta.

Com o passar dos anos, quantas pessoas se foram e eu desejava que estivessem em minhas proximidades! O tempo, no entanto, é de Deus. Deixaram silêncios impregnados do que foram e representaram em minha história. Silêncios com música, poemas, abraços, olhar com brilho, sorrisos, palavras que salvam, esteio nos sonhos, compreensão...

Em um caderno de anotações de meu pai havia uma frase mais ou menos assim: “Fostes sozinho por uma estrada longa e bonita. Sei que hoje há flores pelos caminhos e que elas estão desabrocham em homenagem à sua alma de homem bom”.

Ao percorrer as ruas do Cemitério Nossa Senhora do Desterro, onde repousa a memória de nossos pais e de tantos outros queridos, de imediato me coloco em prece e penso em uma escada longa enfeitada com agapantos de todas as cores em direção ao Senhor. Não me angustio. Observo os túmulos, pelos quais passo, com sinais do carinho de quem ficou.  Falo com Deus sobre o anseio pelo reencontro. Tenho certeza de que fomos feitos para a Eternidade e nos veremos.

As flores que levo, porém, são violetas, aquelas sobre as quais escreveu Martins Fontes: “... quem ama, como nós amamos, tem por certo violetas dentro d’alma”.

Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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