A proposta do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) de instalar 47 novos pórticos de pedágio por Free Flow nas rodovias do interior paulista vem encontrando resistência crescente – e não apenas da oposição. No Circuito das Águas, o prefeito de Amparo, Carlos Alberto Martins (MDB), se consolidou como a principal voz contra o projeto, mesmo sendo de um partido da base governista. Um sinal claro de que o descontentamento com os novos pedágios transcende espectros políticos.
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A mobilização marcada para este domingo (6), com carreatas convergindo para Amparo e uma campanha por um projeto de lei de iniciativa popular, é o reflexo direto da insatisfação de prefeitos, moradores e empresários locais. E se trata de uma resposta coordenada e orgânica, algo que Tarcísio parece ter subestimado.
Na prática, a pressão tem surtido efeito. Em relação à SP-304, entre Piracicaba e Americana, o governador já sinalizou que pode rever os planos. E, diante da mobilização no Circuito das Águas, adotou tom mais conciliador: prometeu diálogo e ajustes. Mas é impossível ignorar a reticência com que a proposta é recebida. Em regiões onde o turismo e a mobilidade regional são vitais, a instalação de pórticos é vista como um obstáculo ao desenvolvimento, não como solução.
O discurso técnico do governo estadual — que aponta o pedágio como instrumento de financiamento da infraestrutura rodoviária — perde força quando encontra municípios que sequer viram melhorias nas estradas que cortam seus territórios. O temor é evidente: pagar mais por um serviço que já não funciona bem.
A reação liderada por Carlos Alberto Martins mostra que a base de apoio de Tarcísio também cobra coerência. O MDB, parceiro de primeira hora do governo paulista, vê no projeto um tiro no pé político, sobretudo em ano pré-eleitoral. Se o governador tem ambições maiores, como já se especula para 2026, precisará demonstrar sensibilidade com as vozes locais, especialmente quando elas partem de aliados.
A movimentação deste fim de semana tem um potencial simbólico forte. É mais do que um protesto contra a tarifa — é um sinal de desgaste e ruído entre o Palácio dos Bandeirantes e o interior. Resta saber se o governo estadual tratará o movimento como um pedido de diálogo real ou apenas como um problema de comunicação a ser contornado.
No interior, a cobrança por equilíbrio entre investimento e justiça tarifária chegou com força. O que está em jogo é mais do que o modelo de concessão. É a capacidade do governo de ouvir, ajustar e manter sua base coesa diante de projetos impopulares.
Quando acontece a gente até estranha
A semana foi marcada por um fato raro no Legislativo campineiro: consenso. Em duas sessões consecutivas, vereadores de situação e oposição deixaram de lado as disputas políticas e aprovaram, por unanimidade, projetos nas áreas de saúde, educação e inclusão.
Na segunda-feira, o plenário deu aval à proposta do Executivo que destina áreas do loteamento Village Campinas para a construção de unidades de saúde e educação.
Já nesta quarta-feira, no Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, os vereadores voltaram a se alinhar, desta vez para aprovar, também em primeira discussão, um projeto que cria salas sensoriais em unidades de saúde para atendimento a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Claro, houve cutucadas e discursos paralelos sobre temas mais espinhosos, mas o foco nas matérias consensuais prevaleceu. E isso causa até estranheza. A Câmara vive, com frequência, em clima de embate ideológico e disputa de protagonismo – tanto no plenário quanto nas redes sociais. Quando há convergência, o contraste é evidente. E serve como lembrete de que o Legislativo também pode (e deve) ser casa de pactos republicanos.
Mais do que apenas uma pauta "morna", o que se viu foi um raro momento de maturidade institucional. Um sinal de que, mesmo em tempos de fragmentação e polarização, ainda há espaço para diálogo e construção coletiva – sobretudo em temas que tocam a vida real das pessoas.
- Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.