Prestes a ser confirmado como o ano mais quente da história da humanidade, 2024 será também o primeiro a terminar com média de temperatura acima de 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais.
Esse limite é considerado pelos cientistas como o teto para impedir as piores consequências do aquecimento global, como o desaparecimento de países insulares, sendo também o valor preferencial pactuado pela comunidade internacional no Acordo de Paris, de 2015.
O resultado escaldante registrado em 2024 significa então que o planeta já rompeu definitivamente a barreira de 1,5ºC e as metas do acordo? Segundo o observatório Copernicus, da União Europeia, ainda não. Para considerar que o limite foi definitivamente violado, seriam necessários vários anos com os termômetros acima desse patamar.
Muitos cientistas, contudo, afirmam abertamente que já não se pode limitar o aquecimento do planeta a esses níveis.
"É mais do que óbvio que segurar o aquecimento em 1,5ºC já não é mais possível", afirma à Folhapress o físico Paulo Artaxo, professor da USP (Universidade de São Paulo) e membro do IPCC (painel de especialistas do clima da ONU). "Com muito esforço, particularmente dos países desenvolvidos e dos países produtores de petróleo, nós podemos limitar o aquecimento a uma média global de 2ºC, o que seria altamente desejável", avalia ele, chamando a atenção para a importância da próxima conferência do clima da ONU, a COP30, que acontecerá em Belém, no Brasil, em novembro de 2025. Para conseguirmos isso, diz, a COP30 tem de colocar a agenda de mitigação de emissões de gases de efeito estufa em primeiro lugar. "A diplomacia brasileira vai ter que trabalhar muito nessa direção", opina.
O último relatório do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) afirmou que ainda é tecnicamente possível cumprir a meta de 1,5ºC, embora isso esteja ficando cada vez mais difícil, exigindo um corte expressivo nas emissões nos próximos anos. Nas condições atuais, a Terra se encaminha para um aumento de até 3,1ºC.
Na avaliação da pesquisadora Thelma Krug, que foi vice-presidente do IPCC e por 13 anos participou da força-tarefa do órgão sobre gases-estufa, a comunidade internacional ainda pode se mobilizar para manter viva a ambição do Acordo de Paris. "É importante dizer que o fato de superarmos temporariamente o 1,5ºC não significa que já ultrapassamos a barreira do Acordo de Paris. Ainda há esperança de limitar o aumento da temperatura média global a 1,5ºC até o fim do século", diz. A cientista destaca que a humanidade ainda está longe de fazer a única coisa que pode garantir a interrupção da trajetória de aquecimento do planeta.