Ser ou não ser? Eis a questão levantada por Hamlet no famoso monólogo shakespeareano. Tal indagação labiríntica exigiu dos homens que fritassem muitos ovos para dar conta de tão intricado omelete. Sim, porque onde tem ovo tem mistério e cabelo em pé.
Rota ou rotina? A rota é caminho a ser cumprido. É ter que sair para enfrentar todas as pedras, correr todos os riscos, e, no final, pode-se ganhar ou perder. Milimetricamente traçada, a rota tem que ser benzida, no seu devido espaço medida, desenhada com régua, esquadro e compasso, nada pode sobrar ou faltar. E, depois de tanto investimento e de muito planejar, nada garantido está. Sim, porque o tiro tem mania de sair pela culatra e a vaca continua indo pro brejo se afundar. Nesse zero a zero, é contar com a sorte e torcer para a bola entrar.
Agora, a rotina é uma opção diferente. Rotina é roda. Basta deixar a vida rodar. Besteira viver se exibindo, se estressando, competindo numa ansiedade maluca de tudo conquistar. Besteira viver com a cara escancarada de tanto selfiar. Melhor do que toda essa casca enganosa e perigosa é boteco com roda de samba, com os quadris estonteantes da morena desafiando o pandeiro, o surdo, o cavaquinho e o tamborim. Nessa hora, a gente não pode esquecer do Vandré: quem sabe faz a hora não espera o boteco fechar. Com outras palavras, disse a mesma coisa o filósofo Zeca Pagodinho: "deixa a vida me levar, vida leva eu, se a coisa não sai do jeito que eu quero, também não me desespero, o negócio é deixar rolar. " Nesse samba, rolaria bem, como refrão, os versos do genial Leminski: "Com o destino não discuto o que pintar eu assino". Adianta com a sina discutir? Não adianta nem atrasa, tempo perdido.
Por tudo isso, vou me balançando na rede da rotina, desperdiçando minhas retinas, bebendo cachacinha, fumando minha palhinha, esperando a morena - aquela mesma da roda de samba - chegar. Ela está bem atrasada, mas me prometeu, jurando nos dedos, que virá me morenar. Nessa rede, sim, vou me enredar.