OPINIÃO

Juros, cortes e eleições nos EUA: como isso afeta aposentadorias?

Por Tiago Faggioni Bachur | Especial para o GCN/Sampi Franca
| Tempo de leitura: 7 min

Imagine passar anos contribuindo com suor e sacrifício para, no fim da jornada, ter uma aposentadoria digna. Essa é a expectativa de milhões de brasileiros. Mas e se te disserem que esse cenário está ameaçado? Que novas mudanças nas regras do INSS podem afetar, e muito, o seu futuro financeiro? Talvez você tenha ouvido falar sobre as recentes turbulências econômicas no Brasil e no mundo, sobre a alta dos juros, a inflação galopante e as contas públicas em aperto. Mas o que você talvez não saiba é como essas variáveis podem impactar diretamente a sua aposentadoria. Sim, o cenário está mudando, e quem não se preparar agora poderá enfrentar sérias dificuldades para garantir sua segurança financeira no futuro.

Nos últimos anos, vivemos mudanças profundas na economia global. A eleição recente nos Estados Unidos, onde Donald Trump volta ao poder, trouxe com ela uma série de promessas econômicas que já estão sacudindo o mercado financeiro e colocando pressão sobre o Brasil. Essa influência internacional, somada aos problemas econômicos internos, como o déficit de US$ 6,5 bilhões nas contas externas de setembro e a luta do governo para atingir o déficit zero, cria um ambiente que pressiona, direta e indiretamente, a Previdência Social.

Nos últimos anos, portanto, o déficit nas contas públicas tem sido um dos maiores desafios dos nossos governantes. Diante disso, a Previdência Social, um dos principais gastos do orçamento, frequentemente aparece como alvo para cortes e reformas. Contudo, enquanto discutem aumentar a idade mínima para aposentadoria ou restringir benefícios, outras áreas, como as emendas parlamentares e os regimes próprios de previdência para categorias específicas, permanecem praticamente intocadas.

Para quem já recebe ou pretende receber algum benefício do INSS, a situação merece atenção especial. Vamos entender como tudo isso pode afetar a sua vida e o que você pode fazer para se preparar diante das mudanças que, acredite, podem estar mais próximas do que você imagina.

1. Reajuste dos Benefícios: O Poder de Compra dos Aposentados está ameaçado

Os benefícios do INSS são ajustados anualmente com base no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor). Em alguns momentos, observa-se que o governo concede um aumento superior para aqueles que recebem o salário-mínimo. No entanto, em tempos de contenção fiscal, o aumento dos benefícios pode ser insuficiente para acompanhar a inflação. Isso significa que, ano após ano, aposentados e pensionistas podem perder poder de compra, tornando-se ainda mais difícil cobrir despesas essenciais como alimentação e saúde.

Essa situação é especialmente crítica para quem depende exclusivamente do benefício previdenciário. Se o valor dos reajustes não acompanha o custo de vida, muitos aposentados podem acabar vivendo com uma renda insuficiente para manter sua qualidade de vida.

2. Critérios Mais Rígidos para Concessão de Benefícios: O Trabalhador Pode Ser o Maior Prejudicado

Não é apenas o valor dos benefícios que está em risco; as regras para concessão de benefícios também podem ser alteradas. Em um cenário de austeridade, o governo tende a impor critérios mais rigorosos para a liberação de benefícios assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a pessoas de baixa renda. Há projetos antigos em tramitação no Congresso, por exemplo, que tentam desvincular o BPC/LOAS do valor do salário-mínimo.

O pente fino e a adoção de regras mais rígidas para obtenção de benefícios por incapacidade, são outros exemplos de contenção de gastos.

Muitos que necessitam de algum auxílio, por exemplo, podem ser impedidos de acessá-lo. Esse tipo de ajuste geralmente atinge as pessoas mais vulneráveis, como idosos e pessoas com deficiência, que já enfrentam dificuldades financeiras e de saúde.

3. Novas Reformas à Vista: O Caminho para a Aposentadoria Pode Ficar Ainda Mais Longo

O governo pode buscar novas reformas previdenciárias para conter gastos. Isso inclui a possibilidade de aumentar ainda mais a idade mínima ou o tempo de contribuição. Trabalhadores que estavam próximos da aposentadoria podem acabar obrigados a trabalhar por mais anos, devido a regras de transição mais rígidas.

Essas mudanças podem frustrar planos de aposentadoria e criar uma geração de trabalhadores que, a cada reforma, se veem mais distantes de seu objetivo de parar de trabalhar com segurança financeira.

4. Emendas Parlamentares: Uma “Torneira Aberta” que Precisa de Controle

As emendas parlamentares são quantias que deputados e senadores têm o direito de destinar a suas regiões para obras e projetos locais. Embora a ideia seja atender às necessidades das comunidades, o uso das emendas frequentemente carece de critérios rigorosos e transparência. Muitos críticos argumentam que esses recursos são usados como “moeda de troca” política e beneficiam interesses específicos, em vez de necessidades reais.

Recentemente, novas regulamentações deram ainda mais liberdade para os parlamentares decidirem como aplicar esses recursos, o que faz muitos verem as emendas como uma “torneira aberta” no orçamento. Enquanto bilhões de reais são destinados por interesses políticos, a pressão para cortar gastos recai sobre áreas essenciais, como a Previdência.

5. Regimes Próprios de Previdência: A Desigualdade entre Trabalhadores

A Reforma da Previdência de 2019 trouxe mudanças significativas para a maioria dos brasileiros, mas praticamente não afetou algumas categorias com regimes previdenciários próprios (como magistrados, membros do Ministério Público e das Forças Armadas). Esses regimes oferecem condições especiais e mais vantajosas, com aposentadorias mais elevadas e regras de transição mais brandas, o que gera um grande impacto financeiro para o sistema.

Por que essa diferença? Enquanto o trabalhador comum enfrenta regras cada vez mais duras, essas categorias mantêm privilégios e condições diferenciadas. Questiona-se se é falta de coragem política para enfrentar esses setores ou se existem outros interesses que perpetuam essa desigualdade. Para um ajuste fiscal mais justo, seria fundamental revisar também esses regimes próprios, eliminando privilégios que pesam nas contas públicas e, ao mesmo tempo, preservando a equidade no sistema previdenciário.

6. A Importância de Planejar a Aposentadoria com um Especialista

Diante de tantas incertezas e mudanças frequentes, procurar um advogado especializado em Direito Previdenciário de sua confiança pode fazer toda a diferença. Um especialista não só ajuda a planejar a melhor forma de se aposentar, considerando suas opções, como também ajusta o caminho conforme surgem novas regras e reformas. O planejamento previdenciário não é algo que se faz uma vez na vida e depois esquece; ele precisa de revisões constantes para garantir que você está seguindo a rota mais vantajosa e evitando surpresas no futuro.

Ao menor sinal de mudanças nas leis previdenciárias, é fundamental consultar seu advogado novamente, pois ele poderá identificar as melhores alternativas para você, adaptando o planejamento inicial às novas realidades. Isso garante que seu direito à aposentadoria seja assegurado com o máximo de tranquilidade e segurança.

7. Alternativas para um Déficit Mais Justo e Equilibrado

Existem formas de ajustar as contas públicas sem sacrificar o trabalhador. Algumas alternativas incluem:

  • Revisão das emendas parlamentares: Adotar critérios mais rigorosos e transparentes para que esses recursos sejam destinados a projetos realmente essenciais.
  • Redução de despesas administrativas: Cortar gastos com cargos comissionados e despesas de custeio no governo poderia gerar economias significativas sem afetar áreas cruciais. Há quem diga que há um número grande de Ministérios e Secretarias na atualidade, questionando se não seria possível reduzir tais gastos ou agrupá-los de forma mais eficiente.
  • Revisão dos regimes próprios de Previdência: Igualar as regras de aposentadoria para todos os trabalhadores, eliminando privilégios para categorias específicas e reduzindo o impacto financeiro de determinados regimes próprios.
  • Investimento em setores produtivos: Direcionar recursos para infraestrutura, saúde, educação e tecnologia ajuda a gerar crescimento e aumenta a arrecadação fiscal de forma sustentável.
  • Combate à evasão fiscal e à corrupção: Investir em mecanismos de fiscalização e justiça mais eficientes ajuda a reduzir a perda de recursos públicos, equilibrando as contas sem necessidade de cortar direitos.

Conclusão

O equilíbrio fiscal é necessário, mas precisa ser alcançado de forma justa. Endurecer as regras da aposentadoria e impor mais sacrifícios ao trabalhador deveria ser a última opção. Antes disso, é crucial revisar o uso das emendas parlamentares e garantir uma gestão pública mais eficiente e transparente.

Além disso, é fundamental revisar os regimes próprios de Previdência, promovendo igualdade nas regras e eliminando privilégios. O trabalhador e o aposentado do setor comum não devem ser os únicos a pagar a conta do ajuste fiscal. Uma solução mais justa envolve preservar direitos conquistados com anos de contribuição, enquanto o governo adota medidas responsáveis para controlar gastos e aumentar a eficiência do uso do dinheiro público. Afinal, a aposentadoria é um direito e merece ser garantida com dignidade.

Tiago Faggioni Bachur é advogado, especialista e professor de direito previdenciário e autor de obras jurídicas.

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