OPINIÃO

A descriminalização da maconha

Por Zarcillo Barbosa |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é jornalista e articulista do JC

O Brasil, com seus mais de 200 milhões de habitantes, é o maior país do mundo a descriminalizar a maconha. A observação é do New York Times, que recebeu bem, como toda a grande imprensa mundial, a decisão do Supremo Tribunal Federal.

O elogio maior é que a sentença vai evitar situações de discriminação racial, muito comuns no Brasil. A falta de critérios objetivos faz com que a polícia e os juízes atuem contra indivíduos com base na cor da pele ou na condição socioeconômica. As prisões estão superlotadas com pessoas flagradas com pequenas quantidades da erva. A proibição das drogas é a maior fonte de renda do crime organizado. Lembra a Lei Seca, de 1919. A proibição de bebidas alcoólicas criou Al Capone e toda a máfia siciliana em território norte-americano. Por nossas fronteiras vulneráveis passam toneladas de drogas. Elas sustentam um exército rebelde na Colômbia e gangues no Paraguai e no Brasil, principalmente.

Agora, quem portar até 40 gramas, comete apenas um ilícito e, quando muito, vai ter que passar por reciclagem. A quantidade fixada é suficiente para uns 80 baseados. Se for "fininho", dá uns 130 cigarros.

O STF também não considera crime ter até seis plantas fêmeas sob cultivo no quintal. As plantas fêmeas é que dão origem às flores com o princípio ativo responsável pelos efeitos alucinógenos da droga. Segundo os relatos, passada a "viagem" vem a "larica". Dá uma fome de comer qualquer coisa. A planta macho, por sua vez possui uma baixa concentração de canabinoides e flavonoides. Por isso ela não costuma ser utilizada no mercado terapêutico ou para uso pessoal. É um importante componente industrial. Serve para adubo, fazer concreto, tijolos, tintas e ainda possui valor nutricional devido às altas concentrações de ômega 3, vitamina E, fósforo, magnésio e zinco.

Nos Estados Unidos, 20 estados já legalizaram a maconha para adultos com finalidades recreativas e para uso medicinal. Só para remédio, são 38 os estados. Aqui no Brasil ainda estamos atrasados com a regulação da cannabis medicinal. Tratamos do álcool e do tabaco, mas, na parte boa da cannabis, a terapêutica, ficamos para trás até mesmo em relação à América Latina.

O esdrúxulo é que, enquanto o STF firma o entendimento sobre o que pode ser descriminalizado, o Congresso vai em sentido contrário. Está para ser votada uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que define como crime possuir ou portar drogas, independentemente da quantidade. O projeto já passou pelo Senado.

O presidente Lula acha que a Suprema Corte não deveria se meter nesse assunto, que é da exclusividade do Legislativo. O ministro Luiz Fux é da mesma opinião. Na condição de presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) reclama de "invasão de competência" por parte do Supremo. Acontece que o STF, há nove anos está com um pedido de habeas corpus pendente de julgamento, em favor de um preso pego em sua cela com 9 gramas de maconha. O coitado já foi solto e a Corte tinha que se pronunciar a respeito porque o Congresso não regulamenta a questão. A lei diz que é crime portar a droga, mas não define a quantidade.

A verdade é que o Brasil se encontra na encruzilhada de uma mutação global na política de drogas. A sociedade precisa dar sinais concretos do caminho que quer seguir. A mudança de paradigma em direção à descriminalização regulada, pode ser um Norte. Pelo menos os países tidos como "civilizados", estão indo nessa direção. Na Holanda o consumo de maconha foi descriminalizado em 1976.

Uma boa resposta à oposição conservadora, deverá se pautar pelo respeito aos direitos humanos, à assistência social e aos cuidados à saúde mental dos recuperáveis. Pelo menos essas estratégias são mais baratas e eficazes do que o sistema de justiça criminal.

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