OPINIÃO

Congresso e STF brigam pelo bagulho

Por Zarcillo Barbosa | 20/04/2024 | Tempo de leitura: 3 min

Em rápido contra-ataque o Congresso tenta barrar a descriminalização da maconha. Falta apenas um voto no Supremo Tribunal Federal, para que se atinja a maioria de ministros favoráveis a firmar jurisprudência, segundo a qual, carregar a erva em pequenas quantidades para uso próprio não seja crime no Brasil.

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado, acolheu a proposta de emenda que colocaria na Constituição que tanto a posse (possuir uma quantidade) quanto o porte (carregar consigo) de drogas, mesmo para consumo próprio, sejam passíveis de prisão.

A disputa faz parte de um processo que vem sendo descrito como "politização da Justiça", ou de "judicialização da política". Existe uma discussão intensa sobre se o STF vem invadindo a competência do Poder Legislativo. Recente bate-boca envolveu o chamado marco temporal de demarcação de terras indígenas. A Corte vem sendo acusada por parlamentares de querer legislar, sobre assuntos considerados tabus na sociedade brasileira, como o descrito e a extensão do direito ao aborto.

No caso da maconha, não seria bem "liberar" drogas. O que se pretende é estabelecer limites. Descriminalizar não é legalizar o consumo e o tráfico de entorpecentes. Sem parâmetros legais, sofre o preto e o pobre. Se o garoto branco, rico, é pego com 25 gramas de maconha, morador de condomínio, ele é liberado. Seria apenas um usuário recreando-se com o que não deveria. O preto, pobre e periférico, esse é considerado traficante e vai para a cadeia.

Por falta de uma política de drogas, tantos jovens vão para as casas de detenção, já superlotadas, onde o convívio com marginais perigosos pode cooptá-los para o mundo do crime, em definitivo.

Cabe ao Parlamento decidir se algo deve ser crime ou não. Mas, se não legisla, os tribunais são obrigados a definir, de acordo com o bom direito, e preencher as lacunas legais. O governo Lula assiste de longe a essa briga de cachorro grande.

O Brasil precisa de um arcabouço jurídico focado na redução de riscos por prevenção e assistência ao usuário. O dia em que o usuário puder ter o seu pé de cannabis no quintal, acaba a influência dos traficantes e do crime organizado.

O STF, há nove anos julga o caso de um detento flagrado com 3 gramas de maconha. O relator, Gilmar Mendes, opina que para se caracterizar tráfico, o flagrado deve ter acima de 60 gramas. Cristiano Zanine e Cássio Nunes falam em 25 gramas e André Mendonça, em 10 gramas. É preciso regrar para se fazer justiça.

Há a questão do uso da maconha para fins medicinais. A Anvisa somente liberou duas substâncias encontrados na planta, que são o canabidiol e o THC. São eficazes no tratamento de câncer, Aids e ataques epiléticos. Nos Estados Unidos esses fármacos são vendidos em supermercados.

No Uruguai, toda a cadeia da maconha é legalizada: produção, distribuição, comercialização e posse para uso pessoal. A erva é permitida e regulada. Na Holanda, o Congresso define as prioridades no combate ao crime. Lavagem de dinheiro, crimes violentos e corrupção são considerados prioritários. O uso de drogas como menos importante. Os holandeses entendem que não podem reprimir todos os crimes, sendo necessário fazer escolhas.

Nos coffeeshops devidamente licenciados, a venda de maconha e haxixe para consumo pessoal é tolerado pelas autoridades locais.

Ao longo dos últimos cem anos, autoridades dos estados e do Governo Federal tentaram desencorajar o uso da cannabis por meio da criminalização, prisões e processos legais. Esperava-se reduzir a oferta e demanda. Nada funcionou.

A maioria (67%) dos brasileiros é contra a tolerância. O fato não isenta a sociedade de procurar soluções, em vez de simplesmente prender maconheiros.

O autor é jornalista e articulista do JC.

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