Era uma vez um baile. Mas não desses com vestidos de cetim e valsas vienenses. Era um baile geopolítico, com máscaras de hipocrisia, disfarces econômicos e dança diplomática. Os convites foram distribuídos: a Vaca, o Passarinho e o Gavião estavam na lista VIP. E cada um veio com a sua máscara colada no rosto e suas segundas intenções escondidas no bolso interno do paletó.
O Passarinho era verde-amarelo, típico de país tropical, bonito por natureza, mas perdido na corrente de ventos frios da economia global. Debatia-se de frio no chão da sua própria ingenuidade, cantando bravatas e bicando fake news como se fosse tira gosto. Vulnerável e inocente, mal sabia ele que o baile tinha regras que não vinham com manual.
A Vaca, ah, essa era vermelha e robusta. Usava uma máscara de seda, feita à mão por mãos operárias, e ruminava calmamente sua influência mundial. Olhou para o Passarinho tremendo e pensou: “Por que não ajudar?” E ajudou da forma que lhe é própria: evacuando sobre o bichinho. Cobriu-o de merda, é verdade, mas aquecido, o Passarinho piou de alegria, esquecendo-se que no Baile dos Mascarados, piar é fazer barulho e barulho atrai predador.
Foi então que entrou em cena o Gavião americano, vestido com o fraque do dólar e a cartola do Tio Sam. Com olhos de raio-x, farejou a movimentação e mergulhou com precisão cirúrgica. Devorava o Passarinho com retórica de liberdade, discursos sobre democracia e uma ajudinha bélica, se necessário. O público aplaudiu. Afinal, no baile, a verdade dança escondida atrás das cortinas da conveniência.
A moral? Nem todos que te colocam na merda são seus inimigos, e nem todos que te tiram de lá são seus amigos. E quando se está coberto de merda, talvez seja melhor não piar. O silêncio às vezes é um escudo.
O baile continua. A Vaca chinesa, agora passeia lentamente pelo salão, negociando acordos com o focinho em todas as bandejas. O Gavião americano, sobrevoa o ambiente como dono do salão, fiscalizando os passos de cada um. E o Passarinho? Bem, tenta se limpar e voltar a cantar, ainda com cheiro de esterco nas penas e esperança no bico.
As máscaras seguem firmes. Cada país finge o que não é, promete o que não cumpre e dança conforme a música que toca nos bastidores. A diplomacia virou coreografia. O mundo, um grande salão onde a sinceridade foi barrada na porta por falta de traje adequado.
Como decidir os rumos desse baile? Após tantos giros e tropeços, resta ao Passarinho jogar sua última esperança para o alto para decidir de que lado ficar: Cara ou Coroa. A moeda, porém, precisa ser verdadeira, não vale moeda de dois lados iguais, feita para enganar trouxa. De um lado, o Dólar. Do outro, o Yuan. No centro, a sorte. Nas mãos, o destino.
A moeda gira no ar. O vento do passado a empurra, a força do presente a acelera, e o futuro? O futuro espera o resultado, aflito como plateia de reality show político.
E Deus, que dizem ser brasileiro, observa tudo de sua varanda celestial, deitado em berço esplêndido, sem saber se ri, chora ou intervém. A orquestra cansou. Os músicos guardaram os instrumentos. Fim de baile. Orquestra a pé.
E o Passarinho, agora olhando para cima, pergunta:
— Cara ou Coroa?
Walter Naime é arquiteto-urbanista e empresário.