06 de dezembro de 2025
ARTIGO

O dia em que Piracicaba chorou...

Por Ivana Negri |
| Tempo de leitura: 3 min

Desde tempos imemoriais, os mercados são locais onde se vende de tudo, num ponto central, dividido em diversas barracas diferenciadas. E é onde se dá a interação social, por isso é o lugar onde políticos costumam frequentar em épocas eleitoreiras, pois é lá que encontrará o povo.

Os mercados persas, na sociedade antiga, era onde havia interação social, onde política e cultura se entrelaçavam em meio a uma diversidade de produtos.

Comerciantes persas traziam as novidades de diferentes regiões.

Mercado é onde pulsa o coração de uma cidade, onde se faz compras, encontram-se os amigos, ponto de reunião, onde as horas não passam. É onde se alimenta o corpo e o espírito, que sai renovado. Mercados são a cara da cidade, sua identidade.

Eu e meu marido gostamos de viajar, e nas viagens, procuramos sempre conhecer os mercados dos locais onde visitamos. É lá que encontramos a alma do povo, sua gastronomia, suas tradições, artesanato, roupas típicas e os diversos temperos. Onde se encontra a população, desde os mais simples camponeses, até os que ocupam altos cargos. E nos mercados todos se igualam. É um pequeno mundo à parte.

Na índia, Turquia e Egito, os mercados são coloridos pelas tapeçarias, luminárias e perfumados com suas flores e frutos da estação, essências e temperos. Dá vontade de comprar um pouco de tudo, mas como seria impossível trazer, a gente tira fotos como  lembrança. Nesses países é costume barganhar. Eles dão um preço, você oferece um valor mais baixo, eles fingem não aceitar. Então, você vai saindo e eles correm atrás aceitando a sua proposta. É assim que funciona.

Nos mercados europeus, além das frutas e flores, vendem também cerâmicas  e roupas feitas por artesãos locais.

E quem nunca foi no Mercado de São Paulo? Turistas que conseguem tirar os olhos das frutas, vinhos, queijos, especiarias e elevar o olhar para o teto, se encantam com os vitrais antigos de uma beleza ímpar.

Mas hoje, eu queria mesmo era falar do nosso mercado, o Mercadão, que fica lá no “largo do Mercado”. Creio que não exista um único piracicabano que não tenha provado um pastel com garapa em suas pastelarias. Ou tenha adquirido flores e frutas da estação.

No fatídico dia 23 de julho, a cidade amanheceu enlutada. Nem o rio de lágrimas dos piracicabanos conseguiu debelar as chamas que envolviam o Mercadão, estabelecimento centenário, nosso orgulho. Só com a chegada dos bravos bombeiros, as chamas foram definhando. E fizeram a contenção para que as labaredas não se alastrassem. Graças a eles, boa parte não foi atingida e ficou preservada.

Não consigo mensurar a dor dos que perderam seu cantinho. Na tardinha do dia 22, fecharam seus boxes, ajeitaram tudo com carinho para reabrir no dia seguinte, sem imaginar que não haveria “dia seguinte”... Quando amanheceu, viram seu comércio, seu ganha-pão, reduzido a cinzas. E a desolação ao ver uma ala do mercado expondo seu esqueleto descarnado, sem vida, sem cor, só fumaça e pó.

Reconstrução agora é a palavra-chave, que sempre motivou os povos no pós- guerra, após dilúvios, terremotos, inundações ou erupções vulcânicas. A história nos mostra essa resiliência dos povos, essa vontade férrea de ressurgir das cinzas como a lendária Fênix da mitologia grega. A fé e a esperança juntas curando as chagas.

E a tragédia de 23 de julho de 2025, entrará para os anais da nossa história, como o dia em que os piracicabanos amanheceram chorando.

Mas vai passar! Tudo passa desde sempre e as feridas cicatrizam.

Ivana Maria França de Negri é escritora.