27 de dezembro de 2025
ENTREVISTA

Antonio Messias Galdino é o Persona da semana

Por Erivan Monteiro | erivan.monteiro@jpjornal.com.br
| Tempo de leitura: 9 min
Will Baldine/JP
GALDINO: ‘Sou um eterno devedor a esse povo generoso, trabalhador e solidário da nossa querida Noiva da Colina’

Jornalista, advogado, professor, escritor e ex-vereador, o piracicabano Antonio Messias Galdino é uma das grandes personalidades da cidade. Filho de Messias Salvador Galdino e Maria Elisa da Costa Galdino, ele construiu uma trajetória profissional de muito sucesso e, ainda hoje, aos 86 anos, continua na ativa. Essa linda história é traduzida pelas inúmeras homenagens prestadas a ele nos últimos anos. A mais recente será no próximo dia 9, quando receberá o Título de Piracicabanus Praeclarus, pela Câmara Municipal de Piracicaba.

Aliás, o Legislativo Municipal é um local no qual Galdino conhece como ninguém. Desde as coberturas jornalísticas pelo Jornal de Piracicaba, passando pela assessoria jurídica até chegar ao cargo de vereador, que exerceu entre as décadas de 1970 e 1980 (foram dois mandatos, no período de 1973 a 1982, e também, ocupou a presidência da Casa de Leis entre 1975 e1976). Neste período, ajudou no progresso da cidade, mas também obteve avanços e ensinamentos pessoais que levou para a vida, como “ouvir sempre e falar o necessário”. “O político não deve se perder nas palavras”, ensina.

O seu mandato foi em pleno período da ditadura militar, mas ele conseguiu exercê-lo sem muitos problemas. A maior dificuldade, no entanto, era a falta de recursos para o trabalho. O cargo não era remunerado e os vereadores exerciam o mandato gratuitamente. “Hoje, as condições para o exercício da vereança estão mudadas e o eleito pode dedicar-se em tempo maior aos trabalhos legislativos; as novas tecnologias de comunicação melhoraram os trabalhos, a frota de veículos facilita a locomoção pela cidade e as assessorias de gabinete agilizam o trabalho.”

Também atuou por muito tempo em sua grande paixão: a advocacia, que exerce até hoje – Galdino se formou em Direito em 1966, em Bauru/SP. Foi ainda um dos fundadores do IHGP (Instituto Histórico e Geográfico em Piracicaba) e publicou quatro livros ao longo de sua carreira. Veja, abaixo, os principais trechos da entrevista concedida ao JP.

Depois de receber o Título de Destaque Piracicabano, em 2023, da Câmara, o senhor será novamente homenageado pelo Legislativo, agora com o Título de Piracicabanus Praeclarus. Qual seu sentimento com mais esse reconhecimento? Receber o título de "Piracicabanus Praeclarus" é uma consagração em minha carreira. Jamais esperava chegar esse momento na vida. Esse título é dos mais importantes que a Câmara Municipal instituiu para homenagear as pessoas nascidas nesta cidade. Sou sumamente grato pela generosidade do vereador Pedro Kawai, pela iniciativa, e a todo colegiado que a aprovou por unanimidade. Sou um eterno devedor a esse povo generoso, trabalhador e solidário da nossa querida Noiva da Colina.

O senhor recebe essas honrarias de uma Casa que conhece bem. Gostaria que falasse de sua experiência como vereador... A minha experiência como vereador foi muito positiva. Aprendi muito com exercício da vereança. A política é um exercício de paciência e um aprendizado de ouvir.  Ouvir sempre e falar o necessário. O político não deve se perder nas palavras. Nas discussões camarárias, os mais diversos assuntos são levantados e o vereador deve estar sempre atento ao que ouve. Filtrar sempre as informações, não se irritar com eventuais provocações e estar sempre aberto ao diálogo. Fui vereador na ditadura militar e o Poder Legislativo estava na mira da censura. Por diversas vezes, nos anos de 1975 e 1976, durante as sessões, aparecia no plenário o delegado do serviço militar de Piracicaba, o capitão Alfredo Mansur; e outras vezes o investigador do Dops (Departamento de Ordem Política e Social), de nome senhor Camargo. Por diversas vezes recebi em meu escritório de advocacia a visita de um tenente do GCan de Campinas, que queria saber como estavam as coisas. Mas felizmente nada demais grave aconteceu. Uma das coisas que me gratificaram foi poder participar dos Congressos de Vereadores e elevar as reivindicações municipais. Diversos trabalhos foram apresentados e aprovados nesses congressos; as conclusões eram encaminhadas ao governo federal e ao Congresso Nacional. Algumas teses apresentadas se transformaram em lei: uma sobre a autonomia dos municípios para elaboração da lei orgânica, artigo 29 da Constituição Federal. Anteriormente, a lei orgânica era editada pelo Governo Federal. Tivemos a participação direta em diversas obras na cidade, como a nova sede do Banco do Brasil. Fomos em comissão a Brasília solicitar ao presidente do banco a sua construção. O centro social do comércio, o centro social do Sesi, o novo prédio do atual Fórum. Através de comissões de estudos, levamos os pedidos a essas instituições e os resultados estão aí.

Poderia destacar os maiores desafios como parlamentar em Piracicaba? Iniciei o meu mandato em 1973. Piracicaba estava politicamente dividida. Em cinco anos, cinco pessoas exerceram o cargo de prefeito. Em 1968, o senhor Luciano Guidotti faleceu e sucedeu o seu vice, o professor Nélio Ferraz de Arruda. Nas eleições de 1969, assumiu o cargo o senhor Francisco Salgot Castillon, que foi cassado pela ditadura militar. Foi sucedido pelo seu vice, o Dr. Cássio Paschoal Padovani, que morreu em 1972.  Assumiu o então presidente da Câmara, o senhor Homero Paes de Athaíde. Na eleição de 1972, os partidos Arena e MDB lançaram seis candidatos, três cada um, pois não havia não havia consenso nos partidos. Foi eleito o Dr. Adilson Benedito Maluf, do MDB, para prefeito, e 17 vereadores, sendo 12 da Arena e 5 do MDB. A função principal dessa Câmara, com o prefeito com a minoria, deu o tom da administração. A nossa bancada buscou então um diálogo franco e aberto com o executivo pela pacificação política e o desenvolvimento da cidade. Eu pude participar de todas as discussões políticas buscando o diálogo e consenso naquilo que fosse de interesse da cidade, sem radicalismo e colaborando para o bem dos piracicabanos, acima dos interesses partidários. Os problemas surgidos foram sempre resolvidos com negociações e Piracicaba respirou um clima mais ameno e progressista. Participamos de muitas reuniões no governo do Estado, de congresso de vereadores, levando assuntos de interesse da cidade e demonstrando que a Câmara e a Prefeitura falavam a mesma linguagem.

Há muita diferença entre ser vereador nos anos de 1970 e agora? Qual o paralelo que o senhor faz? O prédio da Câmara Municipal está fazendo 50 anos - ele foi inaugurado em 1° de agosto de 1975. A câmara era composta por 17 vereadores.  Com as novas instalações, as primeiras providências foram aquisição do mobiliário para o funcionamento das sessões. Em seguida, a formação do quadro de funcionários; os que lá trabalhavam eram comissionados da prefeitura. A estrutura da Câmara era pequena, não havia gabinete para os vereadores nem assessoria, veículo, apenas um para a presidência. Com o correr do tempo, as administrações foram realizando as melhorias. O aumento do número de vereadores - de 17 para 19, 21 e hoje 23 - exigia a criação de um anexo, onde cada vereador tem seu gabinete com todos os equipamentos necessários. Foram criadas assessorias parlamentares e os departamentos que dão suporte técnico para os vereadores, como departamento jurídico, legislativo, administrativo, de comunicação e cerimonial bem como o setor de arquivo e documentação histórica. Não havia subsídio, o cargo não era remunerado, os vereadores exerciam o mandato gratuitamente. Hoje, as condições para o exercício da vereança estão mudadas e o eleito pode dedicar-se em tempo maior aos trabalhos legislativos; as novas tecnologias de comunicação melhoraram os trabalhos, a frota de veículos facilita a locomoção pela cidade e as assessorias de gabinete agilizam o trabalho. A cidade cresceu cinco vezes de 1975 para cá e a Câmara está apta a exercer o seu trabalho com mais recursos pessoais e técnicos, isto é, muito bom para o Poder Legislativo.

O senhor também foi um dos fundadores do IHGP (Instituto Histórico e Geográfico em Piracicaba). Poderia nos contar como surgiu essa ideia? O Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba foi fundado em 1967, ano do bicentenário da cidade. Um grupo de intelectuais liderados pelo professor Acari de Oliveira Mendes, prof. Arquimedes Dutra, professor Guilherme Vitti, professora Terezinha Germano Perensin, Edmar José Kiehl, dr. Fortunato Losso Neto e outros decidiram criar o IHGP como instituição cultural para dar apoio e ser guardião da história de Piracicaba. Eu havia escrito anos antes um ensaio literário sobre a Santa Casa.

O senhor também tem uma passagem como redator no Jornal de Piracicaba. Quando foi e como foi essa experiência? Eu comecei no jornalismo como revisor do Jornal em 1957. De revisor passei a repórter, cobrindo as sessões da Câmara e em outros assuntos. Foi uma experiência gratificante, pois conheci pessoas e tomei conhecimento de assuntos variados. Na redação do JP aprendi muito com o dr. Losso Netto, seu diretor, e com Severiano Ferraz Filho, redator-chefe. Por muito anos fui colaborador do Jornal.

Entre tantos trabalhos, destacam-se ainda suas longas carreiras como advogado e professor... A advocacia sempre foi o meu sonho. Cursei a faculdade de Direito de Bauru, no período de 1962 a 1966. Recebi a carteira da OAB em 11 de agosto de 1967 das mãos do saudoso Jacob Diehl Neto, presidente da subseção desta cidade. Iniciei a carreira no escritório do Dr. Cecílio Elias Neto. E em 1969 fui convidado pelo Dr. Paulo Checoli para assessor da delegacia do Ciesp, recém-criado em Piracicaba. Em 1971, fui admitido por concurso no Sesi, onde atendia os funcionários das indústrias; em 1972, fui assessor jurídico do Semae, que havia sido criado como autarquia municipal. Fui diretor-jurídico da Câmara Municipal, nas gestões do vereador João Manoel dos Santos. E sempre mantive meu escritório atendendo…

Conte-nos também sobre os livros que escreveu. Quantos foram e como foi a história de cada um deles? Desde muito jovem apaixonei-me pelos livros. Estimulado pelos professores Benedicto de Andrade e Dona Zelinda Leite, do Colégio Sud Mennucci, onde cursei o ginásio e o científico. Trabalhando depois em jornais, a leitura e a escrita se tornaram necessidade. Meu primeiro artigo assinado foi em 1960, no Jornal de Piracicaba. Os livros publicados foram quatro. O primeiro foi uma compilação dos trabalhos apresentados em Congressos Municipalistas, no período da vereança; o título é "Constituinte e Outros Temas". O segundo, uma série de artigos publicados no Jornal de Piracicaba, "Sugestões a Constituinte". Enviei esse livro aos Constituintes de 1988. O terceiro foi "Parlamentarismo e Voto Distrital", fruto das palestras proferidas na época do plebiscito, realizado em 1993. O quarto foi "Brasil Negro", também uma coletânea de artigos publicados no JP, por ocasião do centenário da Abolição da Escravatura. Esse livro está disponível on-line no site da IHGP.

Com tantos serviços prestados a Piracicaba, o senhor ainda está na ativa. Pensa em parar? Embora aposentado, ainda administro algumas propriedades de clientes, participo de entidades culturais e religiosas. Acompanho tudo o que acontece em Piracicaba, no Brasil e no mundo. Tenho esposa, filhos e netos, que alegram a minha vida, aos quais rendo minhas homenagens.

Gostaria de deixar uma mensagem final? Apenas agradecer a Deus pela longa existência saudável e produtiva. Aos inúmeros amigos que fiz nesta trajetória e a homenagem que vocês estão me prestando. Gratidão sempre!