No cinema em fim de temporada, muita gente se junta para assistir à obra-prima de Walter Salles. Excelência e inovação. Genialidade latente.
Ainda Estou Aqui leva a reflexões profundas. Emociona e repete o comum em outros filmes do cineasta, únicos a permanecer sempre na memória do espectador.
O diretor prima na estética, no tema abordado, no excepcional trabalho de seus atores.Na hora determinada, a sessão se inicia para apresentar, no meu caso, história conhecida, capaz de provocar sofrimento maior que o daquele momento da História.
Que me vem à cabeça, enquanto espero?
Os jovens de hoje e os já maduros não souberam ver, nem entender. Que vejam e aprendam, agora, respeitando direitos individuais e aceitando ideias diferentes das suas.
Silêncio profundo na sala. Uma pessoa se levanta e sai. Não importa o motivo. Todos sabemos a que viemos, sem imaginar como sairíamos da sala em face do visto, do vivido.
Muitos desconheciam a grandeza de Eunice Paiva, a força de seu olhar tão bem revelado por Fernanda Torres e sua mãe, Fernanda Montenegro. Excepcionais, ambas. Uma, dizendo tudo. A outra, o olhar, esvaziado pela doença, a posição do corpo, o movimento dos lábios. Nenhuma palavra.
Precisa?
Claro está que o filme vem sendo comentado por muitos e aplaudido por todos. A reverência, no entanto, excede a tudo do que se tem notícia. No dia em que assisti ao filme, revivendo as cenas de horror e medo, a indignação e a dor engoliram aplausos presentes em outras sessões. Deveriam, bem sei, eclodir com força maior que em Veneza, por muitos mais que dez minutos. A comoção, no entanto, me pareceu forte.
Comigo, ali, minha irmã. Não só ela. Também Marcelo Rubens Paiva, a quem conheci à época de Feliz Ano Velho graças à intercessão de Eunice, sua mãe. Presente como? No texto! E por ele, os que protagonizaram, na tela, sua história. Com eles, os coadjuvantes, excelentes todos. E o público que, em meio a tanta emoção, em respeitoso silêncio absorvendo a história, suspirava.
Jovem professor, fiz de Feliz Ano Velho leitura fundamental para meus alunos, naqueles anos, pelo que provocava em adolescentes, Levei Marcelo comigo, a um importante colégio de São Paulo, para estar com os alunos em horas que, estou certo, ficaram registradas para sempre entre todos os que dela participaram.
As conversas de então me fizeram admirar ainda mais a figura extraordinária de Eunice, que perdera o marido em circunstâncias provocadas pelo Estado em regime de exceção, obscurantismo, horror e medo. Assusta-me pensar que muitos daquela geração, vivos ainda hoje, alardeiam amar o Brasil sonhando reviver tortura implacável e incabível prisão, deixando mães, pais, filhos à mercê do sofrimento.
Houve quem escrevesse de forma brilhante sobre os olhos de Fernanda Torres. Na verdade, a irretocável interpretação da atriz faz do olhar de Eunice, dos sentimentos, do sofrimento dela, das angústias por ela vividas, seus. Com Fernnda, Selton Melo vivendo Rubens Paiva, passando-nos, também, a sensação de estar com ele, como dele sabemos.
Quisera dizer a tantos, como disse Marcelo em sua obra: ainda estou aqui! Muitos de nós conhecemos isto. Outros, ainda mais. Ainda estamos aqui! Pudemos ver o amanhecer do novo dia.