21 de novembro de 2024
ARTIGO

Luta contra a teocracia

Por Rubinho Vitti |
| Tempo de leitura: 3 min

Dizem que a evolução humana é cíclica e não anda em linha reta. Isso significa que já experimentamos uma sociedade mais moderna no passado do que a que vivemos hoje.

A revolução sexual e cultural dos anos 1960 ou o modernismo dos anos 1920 fazem nossa fase atual mais careta do que nunca.

E se a sociedade pode ser cíclica, a política anda junto com ela. Basta ver o horror da ditadura militar batendo à nossa porta em diversos momentos da história recente. A prova disso foram as últimas eleições em que uma grande parte da população foi às urnas como forma de defender a democracia.

Ainda mais retrógrado que uma ditadura é um sistema teocrático. Vale lembrar que a teocracia é uma forma de governo em que uma ou mais divindades são reconhecidas como autoridades governantes supremas. As “orientações” viriam dos céus diretamente para os governantes, “intermediários humanos” das entidades divinas.

Entre países que ainda seguem em um sistema teocrático estão o Irã (islamismo) e Israel (Estado judeu), além do Vaticano, Estado católico localizado no meio da Itália.

O Brasil nunca foi, de fato, um Estado teocrático. “De fato”, porque, mesmo sendo um “Estado laico” (quando não há uma religião oficial dentro do governo), os símbolos religiosos estiveram e estão por toda a parte.

Vide a frase “Deus Seja Louvado”, encontrada nas notas de Real, ou bíblias e crucifixos presentes no Congresso Nacional e nos gabinetes, inclusive da presidência da República.

Grande parte dos políticos brasileiros também usa da religião para angariar votos, justificar ações e argumentar ideias nos palanques. Ai do candidato que não provar para a população que é temente a Deus.

O último governo federal, comandado por Jair Bolsonaro, deixou essa ideia de que o Brasil é uma semi-teocracia ainda mais evidente. Bancadas neopentecostais foram favorecidas, com isenção de impostos a pastores e líderes religiosos. Em troca, o uso do altar como propaganda política misturada com fanatismo religioso.

Fora da base do governo atual, os neopentecostais não deixam de demonstrar poder e a sede pela governança.

No último domingo, assistimos a mais um capítulo dessa história em um evento que exemplificou ainda mais a vontade dessa gente de que o Brasil se torne, de fato, um Estado teocrático.

Para começar, a manifestação bolsonarista, na avenida Paulista, foi organizada pelo pastor Silas Malafaia. No púlpito, discursaram líderes político-religiosos. Mas a voz mais veemente sobre isso foi de Michelle Bolsonaro, ex-primeira dama.

Carismática entre os seus e evangélica, Michelle fez ecoar pelos prédios da paulista: “O Brasil é do Senhor”, sendo aplaudida e ovacionada pelo público presente de verde-amarelo.

Ela continua: "Por um bom tempo fomos negligentes ao ponto de falarmos que não poderia misturar política com religião, e o mal ocupou o espaço. Chegou o momento da libertação. Eu creio em um Deus todo poderoso capaz de restaurar e curar nossa nação".

Além disso, na plateia, uma grande parte dos bolsonaristas presentes seguravam bandeiras de Israel, um dos Estados teocráticos ainda existentes no mundo.

Nunca houve algo tão claro como uma ideia de tornar o Brasil um Estado teocrático. Mais: um Estado que defende a supremacia cristã, impondo valores da bíblia para as regras da sociedade e não aceitando outras religiões.

Apesar de sabermos que a Paulista daquele domingo não representa o Brasil, temos que concordar que haviam muitas pessoas dispostas, naquele ambiente, a concordar com o que seus líderes diziam. Isso me dá calafrios!

Se em 2022, nos unimos à favor da democracia, nas próximas eleições é preciso se unir de novo e lutar para manter um Estado laico. Dessa vez, será isso o que, de fato, poderá estar em risco.

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