25 de dezembro de 2024

A Costureira

Por José Faganello |
| Tempo de leitura: 2 min

“Os que merecem monumentos, não precisam deles” (Gene Fowler).
Acordava bem cedinho, como se escutasse o sol que de mansinho vinha chegando para clarear o escuro da noite. Fazia o café, que com seu aroma, recendia a casa toda. Punha-se, então a costurar. Tomava antes o cuidado de fechar a porta da sala de costura, para que o ruído de sua velha Singer não acordasse antes da hora, o marido e os filhos. Na hora certa chamava-os, os filhos para irem à escola, o marido para o trabalho. Enquanto eles tomavam café, fazia-lhes companhia, com uma satisfação indisfarçável e sempre repetida. Jamais estava mal-humorada. Despedia-se deles com um beijo, de mãe e de esposa. Voltava ao trabalho. Tinha a incrível capacidade de conciliar os serviços caseiros com suas inseparáveis costuras.
De quando em vez, soava a campainha. Era mais uma freguesa. Todas tinham pressa para suas encomendas. Todas saíam contentes com a rapidez com que eram atendidas e com o carinho com que eram recebidas.
Seu dia era totalmente preenchido com o trabalho. À noite, muitas vezes foi obrigada a ficar mais algumas horas, para entregar as encomendas em dia. Costurou muitos vestidos de chita, belos vestidos de festa e, principalmente, vestidos de noiva. A cada casamento que ia, para dar o toque final antes da entrada da noiva, era coberta de elogios e, depois procurada por alguém desejosa de um vestido feito por mãos prendadas. Não era uma costura qualquer. Realizava verdadeiras obras de arte. Seus vestidos de noiva, com finos bordados, eram apreciadíssimos. Até hoje, suas antigas noivas relembram com emoção, o realce que ostentaram muitas delas visitaram-na, saudosas para relembrarem o passado.
Com suas costuras pode-se dizer, pagou os estudos dos filhos. Alegrou muitas jovens enamoradas e embelezou muitas festas. Querendo transmitir sua arte, deu aulas de corte e costura. Formou muitas alunas. Apenas não ficou sabendo se alguma delas conseguiu imitá-la.
Em seus últimos anos, cheia de achaques próprios da idade não mais costura Sequer conseguia fazer crochê, seu passatempo preferido. Suas toalhas de crochê também foram disputadíssimas. Passava seu tempo rezando e lendo. Lia muito, apesar da vista cansada. Com uma prodigiosa memória para os fatos mais remotos, não consegue, no entanto, guardar os acontecimentos atuais, e recordar-se do que leu no dia anterior. O tempo, implacável, a cada dia que passava, deixava sua marca atroz. Não destruiu, porém, .as lembranças agradáveis naqueles que com ela conviveram. Todos a amam e dela falam bem. É minha mãe.
Esse artigo descobri há anos e tanto meu pai como minha mãe não saberia que um dia nossa casa seria mudada para um a loja de vestidos de festas, que fica na esquina da Américo Brasilense com Dona Francisca de fronte do Colégio das Freiras. Espero que as roupas expostas consigam fazer o. apreço da Theresa Sachis Faganello.

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