25 de dezembro de 2024

Salão de Humor, uma válvula de escape

Por Rubinho Vitti |
| Tempo de leitura: 3 min

A ex-presidente Dilma Rousseff está em frente a um espelho com seu tradicional vestidinho vermelho. No entanto, algo faz o espectador se intrigar diante daquela imagem. Ao invés de estar se maquiando ou escovando os dentes, Dilma barbeia uma espessa barba branca que lembra o ex-presidente Lula.

Em outro desenho, Dilma aparece com um olho roxo. O golpe, no entanto, tem o formato de uma moeda de 20 centavos, valor de aumento das passagens de ônibus que iniciou as manifestações de 2013 e que levaram ao impeachment.

Muitos outros desenhos destacam a ex-presidente: apequenando-se diante da oposição ou abandonada tal qual o filme “Náufrago”. Fora isso, várias caricaturas exacerbam seus dentes grandes ou o olhar de mulher durona ou louca.

Dilma talvez foi a presidente mais desenhada no Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Mas ela não é exceção. Temer, Lula, FHC, Sarney, Collor, Itamar Franco ou generais da ditadura militar. Nem por isso se ouviu chiliques de eleitores contra o aclamado Salão.

Nem mesmo políticos de outros países como Trump, Obama, Maduro, Chaves, Putin ou até mesmo Jesus, Maomé, Buda e líderes religiosos. Ninguém escapa da ponta do lápis afiada dos participantes.

Eis que, neste ano, a 48ª edição do Salão de Humor trouxe, mais uma vez, uma série de desenhos engraçados, pensativos e muitas vezes ácidos. É muito natural que a figura mais vista entre as telas expostas no Engenho Central e na exposição online não seja outra em 2021: Jair Bolsonaro.

O brasileiro Cla?udio Fernando Lascoski ganhou o prêmio na categoria charge, exibindo uma imagem de Bolsonaro falando a microfones que na verdade são desentupidores de privadas.

E são muitas outras obras, destacando o presidente e suas atitudes contra o combate à Covid-19, o armamento da população e outros assuntos que rondam seu governo.

O cubano Carlos Fuentes fez uma caricatura do presidente que aparece como um santo onde a auréola tem formato de um vírus e em suas mãos está uma caixa de cloroquina. Já Rucke fez um desenho parecido, mas ao invés de santo, Bolsonaro é a própria figura da morte com sua foice.

A morte é, inclusive, muito relacionada a esse governo. E isso bem representou Wellington de Barros Pessoa com uma charge que mostra o presidente em um caixão envolto com muitas laranjas, cloroquina e uma lata de leite condensado, símbolos bem atuais do bolsonarismo.

Mas essas imagens parecem não ter agradado o “fandom” bolsonarista, que se irritou, chamando o Salão de Humor de "desrespeitoso" contra o presidente da República, prometendo boicotá-lo. Risos!

A deputada Valéria Bolsonaro fez uma nota de repúdio contra as obras selecionadas, pois, segundo ela, ofendem “a autoridade mais importante do país e a fim de manchar sua imagem, incitando a violência, ligando-o à morte, como se fora um genocida…”.

Nas redes sociais não foi diferente. Uma senhora chegou a dizer que o Salão foi “contaminado pelos ideais da esquerda”.

Tal virulência nos comentários é inédita. Claro que anos atrás as redes sociais não estavam tão em alta como hoje, com milícias virtuais atuando em peso. Mas é incontestável a falta de senso estético e crítico de quem não enxerga o trabalho de chargistas e cartunistas como uma forma de reflexão sobre o que acontece no país.

Além disso, mostra a ignorância dessas pessoas sobre o evento, que possivelmente nunca frequentaram.

Cada edição do Salão de Humor é um recorte de seu tempo. Os artistas levam sua percepção do Brasil e do mundo pelo viés da arte do humor gráfico!

Em quase 50 anos o Salão tem sido assim -- e espero que continue por 100, 200 ou 300 anos --, analisando o comportamento de governos ditadores, democratas, de esquerda, direita ou de pseudo líderes de extrema direita. Seja para rir ou chorar!

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