Quinta-feira foi dia de protestos na Flip e de exibição de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", no telão da tenda principal da feira, em Paraty.
Os protestos desta edição da feira, no entanto, não tratam das costumeiras manifestações em favor das minorias, os povos indígenas, caiçaras, quilombolas. Eles refletem um país dividido, rancoroso, mergulhado em uma disputa ideológica sem fim.
Convidada para uma performance antes da exibição do filme do pai, a filha de Glauber Rocha incorporou o espírito do lendário Corisco e desfraldou a bandeira do Lula Livre para delírio de uma plateia majoritariamente formada por simpatizantes da esquerda.
A poucos metros dali, um grupo de empresários e autônomos de Paraty, reunidos sob o "anonimato" de um grupo de whatsapp, organizava um protesto contra a presença do jornalista Glenn Greenwald em uma das casas paralelas da Flip.
Entrevistado pela Folha, um integrante do grupo disse que o objetivo era impedir que Paraty se tornasse palco de "doutrinação ideológica comunista".
Bolsonaro teve 72% dos votos em Paraty. Um massacre. Seis meses de governo depois, percebe-se nas ruas um grande desalento em relação ao messias.
Ainda assim, existem grupos aguerridos, capazes de ir às ruas para defender todas as malfeitorias do ex-juiz Moro, por exemplo, em nome da Justiça. O famoso lema dos "fins que justificam os meios" dos regimes stalinistas, jacobinos e fascistas.
O protesto da filha de Glauber na Flip recebeu a observação jocosa de um morador que a tudo assistia, sentado na sua bicicleta: "É por isso que o Brasil não vai para frente."
Eu me lembrei, naquele momento, da propaganda oficial na decadência da ditadura militar, 1977: "este é um país que vai pra frente, o o o o, de uma gente amiga e tão contente (...) é um país que canta, trabalha e se agiganta".
Naquele tempo, a ditadura escamoteava a fragilidade econômica do regime com a ajuda da chamada "propaganda cívica". Hoje, a fragilidade do governo que se inspira na ditadura está blindada pela cultura da desinformação..