23 de novembro de 2024
COMISSÃO DA VERDADE

‘Brasil correu o risco de uma nova ditadura’, diz Pedro Dallari

Por Xandu Alves | São José dos Campos
| Tempo de leitura: 3 min
Repórter especial
Reprodução
Pedro Dallari durante vistoria ao principal centro de tortura no Rio

Coordenador e relator da CNV (Comissão Nacional da Verdade), o jurista Pedro Dallari classificou como “assustadora” e “aterrorizante” a revelação da trama golpista que envolveu membros do alto escalão do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e das Forças Armadas para dar um golpe de estado no Brasil, entre novembro e dezembro de 2022.

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De acordo com investigações da PF (Polícia Federal), a conspiração incluía a morte do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes.

A PF indiciou 37 pessoas – 25 são ou foram militares – no inquérito que investiga tentativa de golpe de Estado após a eleição de Lula. Entre os indiciados estão o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Informações).

Professor titular do Instituto de Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo) e membro da Comissão de Direitos Humanos da instituição, Dallari disse que o Brasil correu o risco de vivenciar uma nova ditadura, com um governo autoritário, direitos cassados e oposição silenciada.

“Em pleno século 21 nós corremos um risco real, em 2022, de recair na ditadura, de uma nova ditadura”, disse o jurista a OVALE, em entrevista exclusiva que será publicada no final de semana, na íntegra.

Dallari foi coordenador e relator da Comissão Nacional da Verdade, que foi instituída em 16 de maio de 2012 – o jurista foi nomeado ao grupo em setembro de 2013. A CNV apurou as graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 1946 e 1988, mas especialmente no período da ditadura militar (1964-1985). O relatório final foi finalizado em 2014, quando o grupo foi dissolvido.

Resistência.

Na avaliação de Dallari, de um lado o resultado do inquérito da PF é “aterrorizante” e “assustador”, mas de outro se mostra “auspicioso” e “positivo”, no sentido de indicar que as instituições estão funcionando, as instituições democráticas brasileiras.

“Isso mostra que foi possível desvendar todo esse cenário abrindo a possibilidade para a responsabilização dos golpistas, o que é positivo”, afirmou Dallari. “A democracia suportou um risco que não se imaginava de ficar tão próximo da consumação de um desastre”.

O professor de Direito disse que o ‘DNA antidemocrático’ sempre esteve enredado nas Forças Armadas, mas que estava adormecido após o período de exceção e violento imposto pela ditadura militar. No entanto, tal “vírus” ressurgiu e reviveu com a ascensão de Bolsonaro à Presidência da República.

“Esse DNA sempre esteve lá. O ex-presidente não foi eleito por causa das Forças Armadas. Foi eleito um presidente que tinha alinhamento com esse DNA antidemocrático das Forças Armadas, e esse encontro acabou fazendo com que as Forças Armadas se engajassem nessa aventura, com o risco da retomada da ditadura”, analisou o jurista.

A expectativa de Dallari é que o relatório da Polícia Federal, depois da denúncia do Ministério Público, resulte na “condenação dos responsáveis” pelo Supremo Tribunal Federal, que deve julgar o caso em 2025.

“Isso deve sugerir não só a responsabilização desses 37 indiciados [incluindo Bolsonaro e membros das Forças Armadas], mas que ocorra aquilo que não foi feito: uma reformulação das Forças Armadas brasileiras”, apontou ele.

“Se não houver essa reformulação, daqui alguns anos nós podemos estar de novo diante de um cenário parecido”, completou Dallari.