04 de outubro de 2024
DEPOIMENTO

‘O dia em que entrevistei Cid Moreira’, conta repórter do Vale

Por Da redação | São José dos Campos
| Tempo de leitura: 5 min
Reprodução
Cid Moreira

Em 23 de novembro de 2014, o repórter Jesse Nascimento, editor do Portal Vale 360 News, teve a oportunidade de entrevistar Cid Moreira, que morreu na quinta-feira (3), aos 97 anos. Ele será sepultado neste sábado (5), em Taubaté.

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Naquela época, Jesse trabalhava na Rádio Globo São Paulo, apresentando o programa Panorama Esportivo. Naquele dia, o entrevistado era Cid Moreira, a voz mais marcante do telejornalismo brasileiro.

A conversa, realizada em tom nostálgico, foi permeada por lembranças e reflexões de Cid sobre sua trajetória profissional e vida pessoal. “Agora, com o falecimento do lendário apresentador, o encontro adquire um tom especial, resgatando memórias de um momento inesquecível”, disse Jesse.

A entrevista começou com a tradicional saudação de Cid, que marcou gerações de brasileiros no comando do Jornal Nacional. Leia a entrevista a seguir.

Alô, boa noite. Tudo bem com você?

Cid Moreira: Tudo bem com você? Quem é você?

Bom, eu sou considerado aí o homem do “Boa noite”. Dá uma boa noite mais uma vez, por favor.

Cid Moreira: Boa noite.

Boa noite, Cid Moreira! É um prazer tê-lo aqui na Rádio Globo São Paulo, no Panorama Esportivo. Cid Moreira apresentou o Jornal Nacional na Rede Globo de Televisão entre 1969 e 1996 e se tornou a voz padrão do telejornalismo brasileiro. Cid, depois que você saiu do Jornal Nacional, evidentemente sua carreira continuou em outras atividades. O que o senhor tem feito atualmente?

Cid Moreira: Depois de passar praticamente três décadas na bancada do JN, surgiu aquela lacuna: “E agora, o que vou fazer?”. Mas não demorou muito para um novo caminho aparecer. Lembro que uma ou duas semanas depois de deixar a bancada, recebi um telefonema de São Paulo. Era de uma firma perguntando se eu aceitaria gravar o Novo Testamento. Perguntaram quanto eu cobraria. Falei: “Olha, eu não sei. É um projeto muito extenso, quanto tempo vai levar?”. E eles disseram: “Nós temos urgência!”. Então, sem prática nenhuma, eu estimei que levaria uns 15 dias. Hahaha! Que engano! Consegui gravar em 33 dias.

Quer dizer que a fase bíblica começou de uma maneira inesperada. Como foi se adaptar a esse novo projeto?

Cid Moreira: Exatamente! Eu não tinha um estúdio próprio naquela época, como tenho hoje em casa. Então, eu marcava um estúdio e gravava todos os dias, de segunda a sábado, das 12h às 18h. Gravava cada trecho, ouvia, e às vezes regravava uma, duas, até dez vezes, porque queria que ficasse perfeito. Era um trabalho de paciência e dedicação. Consegui finalizar o Novo Testamento em 33 dias, que coincidiu com a idade de Jesus ao ser crucificado, segundo a Bíblia. Foi como um sinal.

E como o senhor lidou com a demanda e a pressão para realizar esse trabalho? Gravava quantas horas por dia?

Cid Moreira: Gravava cerca de seis horas por dia. Na época, eu tinha que marcar horários nos estúdios e me organizar para ter tempo de fazer as revisões necessárias. Gravava das 12h às 18h, revisava o conteúdo e corrigia o que não estava bom. Isso se repetia de segunda a sábado. Às vezes, eu regravava um trecho várias vezes até sentir que estava perfeito. Não gosto de nada pela metade, então sempre busco excelência em tudo que faço. Até hoje, quando escuto algumas gravações, penso: “Ah, poderia ter feito melhor.” Isso faz parte do ofício.

O senhor é conhecido como um perfeccionista. Cid, além das gravações bíblicas, como ficou a sua relação com a televisão após a saída do Jornal Nacional?

Cid Moreira: A televisão sempre fez parte da minha vida, mas, após sair do JN, fui direcionando meus projetos para aquilo que mais me tocava. O convite para gravar a Bíblia foi um divisor de águas e me levou a outras oportunidades relacionadas à mensagem de fé e espiritualidade. Então, de certa forma, a TV ficou em segundo plano. Eu ainda fazia algumas aparições, participava de programas e eventos, mas meu foco passou a ser os projetos bíblicos e a transmissão de mensagens inspiradoras.

E como foi a sua relação com Taubaté depois de tantos anos no Rio de Janeiro?

Cid Moreira: Nasci em Taubaté e tenho um carinho enorme pela cidade. Minha primeira experiência no rádio foi na Rádio Difusora de Taubaté, em 1944. Mantenho alguns laços até hoje, mas atualmente passo mais tempo no Rio de Janeiro e em Petrópolis, onde moro com minha esposa. Taubaté é minha raiz, e sempre que posso, faço questão de lembrar e visitar. Não dá para esquecer de onde tudo começou.

Cid, mudando um pouco de assunto, o senhor sempre foi conhecido como uma figura muito ligada ao jornalismo sério e imparcial. Como foi fazer a transição para projetos mais espirituais, como a gravação da Bíblia?

Cid Moreira: Foi um processo natural. A Bíblia sempre esteve presente na minha vida. Lembro que, ainda no Fantástico, fiz algumas gravações de mensagens e salmos. Isso foi despertando em mim um desejo de me aprofundar. Quando surgiu a oportunidade de gravar o Novo Testamento e, depois, toda a Bíblia, senti que era o momento certo. A transição foi tranquila porque o conteúdo é muito profundo, e me sinto à vontade trabalhando com ele.

Com certeza, é um trabalho admirável. E o senhor ainda recita salmos?

Cid Moreira: Sim, recito todos os dias. As palavras dos salmos trazem conforto, paz e sabedoria. Acho que podemos encerrar nossa conversa de hoje com um deles, que me toca profundamente. Vou recitar o Salmo 23, que diz:

“O Senhor é o meu pastor; nada me faltará. Ele me faz descansar em pastos verdejantes e me leva a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome. Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos; unges a minha cabeça com óleo, e o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida, e habitarei na casa do Senhor para todo o sempre.”

Alguma mensagem final para os ouvintes?

Cid Moreira: Acredito que a mensagem principal é essa: fazer tudo com amor e dedicação. Não importa o que você faça, se não colocar emoção, está perdendo seu tempo. Acredite naquilo que faz e siga em frente. A vida é um caminho de aprendizados e realizações. Obrigado a todos, e boa noite!