No primeiro dia do mês de agosto de 2023, durante minha participação no Space Studies Program 2023, que aconteceu em São José dos Campos, tive a oportunidade de participar de uma conversa com um astronauta que estava diretamente na estação espacial internacional (ISS). Uma oportunidade como essa só foi possível devido à credibilidade da ISU (International Space University) e do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), que foi uma das instituições que acolheu o evento. A ISU possui diversos ex-alunos estão hoje atuando em agências e empresas voltadas à exploração espacial, o que inclui astronautas.
A preparação para essa conversa envolveu o centro de controle e missão da NASA e o ITA. Foi necessário alinhar o tempo exato em que a ISS estaria sobrevoando a janela de visibilidade de Houston, pois, garantiria o menor tempo de resposta para comunicação à longa distância. O ITA garantiu que tivéssemos a infraestrutura necessária para essa interação. O tempo esperado para esse evento foi de 20 minutos. Foram convidadas crianças de escolas públicas e particulares sendo escolhidas 3 delas para fazerem a pergunta diretamente para o astronauta, tudo em tempo real. Para os participantes do Space Studies Program (SSP23), foi concedido o direito de fazerem perguntas previamente elaboradas e selecionadas por eles próprios.
Quem é o astronauta?
O astronauta que nos atendeu foi o Sultan Saif AlNeyadi tripulante da estação espacial internacional naquele período. O astronauta nascido nos Emirados Árabes Unidos, seguiu uma carreira militar de excelência obtendo em última instância o título de PhD em Tecnologia da Informação pela Griffith University na Austrália. Amante de Jiu-jitsu, foi o primeiro astronauta a vestir seu quimono de atleta na ISS em homenagem à contribuição que essa modalidade esportiva teve na sua preparação para essa missão espacial. Esse preparo foi fundamental, pois, ele foi o primeiro astronauta do país a participar de uma missão de longa duração já que esse privilégio é dado para poucas nações.
Estávamos todos ansiosos e apreensivos com a chegada da primeira comunicação e quando a conexão foi estabelecida e as transmissões iniciaram, confesso que lágrimas rolaram. A primeira coisa que foi solicitada ao Sultan Saif AlNeyadi foi a demonstração de algo que só é possível em microgravidade: beber água flutuante e girar livremente. Parece coisa que vemos em filme, mas saber que está ali sendo feito naquele momento para você é demais.
As perguntas das nossas crianças brasileiras para o astronauta
Confesso que a parte que mais gostei foram as perguntas feitas pelas nossas crianças brasileiras. Que oportunidade! A Rafaela foi a primeira e sua pergunta representa a curiosidade de muitos de nós: você acha que pode haver vida alienígena no universo? A resposta dele foi que durante sua inscrição para a missão, ele trouxe a sua mascote de pelúcia que ele chama de Alnilam, em homenagem ao nome da segunda estrela mais brilhante vista do hemisfério sul. Ele acrescentou que nunca viu um alienígena, ao menos por enquanto, mas que a Alnilam, sua mascote, poderia ser confundido com um aliem por todos.
Outro estudante brasileiro chamado Felipe questionou sobre o que ele mais sentia falta durante a sua missão na ISS. A resposta surpreendeu a todos. Ele disse que, apesar de ter muitas opções de refeições e menus na estação espacial, o que mais sentia falta era da sua mãe cozinhando e de suas comidas.
Desafios de estar na estação espacial
Os participantes também fizeram perguntas sobre os desafios de estar na estação espacial e o primeiro desafio ele afirmou: a microgravidade. Ele disse que sente muita falta da gravidade. Estar flutuando o tempo inteiro é desafiador. Primeiramente porque durante toda a missão os astronautas têm que realizar diversas tarefas onde o manuseio de instrumentos se torna mais complicado nesse ambiente. Depois, porque todos os experimentos científicos realizados na ISS são extremamente importantes e precisam ser operados com precisão, pois, pode comprometer o trabalho de vida de um pesquisador aqui na Terra.
Sobre a influência dessa experiência no quesito das relações interpessoais, o astronauta Sultan Saif afirmou que embora a tecnologia permita comunicação ‘online’ com as pessoas aqui na Terra praticamente da mesma forma que usando a ‘internet’, aparece o desejo de estar mais presente sem ser através de uma tela. Outro fator importante é a necessidade de manter a harmonia com a tripulação, que naquela ocasião eram de sete astronautas. No entanto, isso não substituiu a necessidade de conexão com os amigos e familiares aqui na Terra e que ele fazia de tudo para manter isso o mais forte possível.
Ele nos contou que participou de uma caminhada fora da estação espacial para realizar a manutenção de um painel solar e que tem sido uma experiência fantástica. Disse ainda que se surpreendeu, mesmo sabendo de antemão, como o tempo passa rápido no sentido de que da ISS o Sol nasce 16 vezes e se põe 16 vezes em um dia, se comparado com um dia terrestre. Ele teve que se adaptar a essa mudança, pois, as atividades eram constantes, o que também o surpreendeu, como ele se adaptou rapidamente.
Sobre os riscos de estar na ISS, ele afirmou que vem sendo treinado há anos para que não ocorram situações de acidentes e, caso aconteça, serem capazes de reagir prontamente. Um dos maiores riscos, ele citou, é a colisão com debris (ou lixo espacial) estando a mais de 400 km de distância da superfície terrestre a uma velocidade de cerca de vinte e sete mil quilômetros por hora. Outro risco é a ocorrência de incêndios dentro da estação e isso não tem ocorrido nos últimos 20 anos o que significa que as ações tomadas de prevenção vêm funcionando.
Outra revelação que ele compartilhou foi o fato de haver diversos cultivos de plantas e vegetais, inclusive comestíveis na estação. Ele afirmou que adoraria ter palmito cultivado por lá, mas acho que ainda vai demorar um bom tempo para que isso seja possível.
O planeta Terra do ponto de vista da estação espacial
Um dos momentos mais emocionantes foi quando ele disse sobre a visão que tem do planeta Terra a partir da estação. Em suas palavras “não vejo nenhuma interação, nenhum barulho, é tão tranquilo e pacífico que precisamos manter assim”. Para estar na estação, precisamos gerar oxigênio, remover gás carbônico, gerar energia por painéis solares. Tudo que é feito na estação é gerado artificialmente enquanto na Terra quase tudo isso é de graça. É muito importante que de alguma forma, mantenhamos à Terra o máximo possível, intacta, protegida. “Se uma pessoa for capaz de ver isso daqui da estação com certeza mudará seus pensamentos sobre o planeta”, disse o astronauta.
O que fazer para ser um astronauta?
Ele também deixou seus conselhos para quem sonha ser um astronauta: “Acredite em seus sonhos”. Completou dizendo para trabalhar duro, aprender coisas voltadas para a ciência, tecnologia e matemática que podem te aproximar do seu sonho.
Não tenho palavras para descrever as emoções daquele dia. Como participante, como brasileira e como física que ama o espaço viver esse momento foi quase como realizar um sonho impossível, ao menos parecia ser. Quem diria que um dia falaria com um astronauta? Pois, tive essa oportunidade e muito mais, mas isso contarei em outros textos por aqui. Se quiser assistir a íntegra do vídeo da conversa com o astronauta, visite o Instagram do canal @maisqueraios.
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