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13 de maio de 2024

ENTREVISTA

‘Todo produto militar da Embraer teve como vitrine a FAB’, diz comandante da FAB

Tenente-brigadeiro do ar Marcelo Damasceno, comandante da FAB, fala sobre a importância para o país da produção do caça Gripen na unidade da Embraer

Por Xandu Alves
Gavião Peixoto

14/05/2023 - Tempo de leitura: 5 min

Xandu Alves / OVALE

Marcelo Damasceno (à dir.) na cerimônia de inauguração da linha do Gripen na Embraer, com presença de Lula

Comandante da FAB (Força Aérea Brasileira), o tenente-brigadeiro do ar Marcelo Kanitz Damasceno considera a abertura da linha de produção do Gripen no Brasil um marco para a indústria nacional e a própria FAB.

O militar disse que já se estuda uma ampliação do contrato com a sueca Saab, fabricante do Gripen, e de até um segundo pacote de caças. Além disso, o avião vai reforçar a capacidade dissuasória brasileira.

“Você tem que ter armamentos que desmobilize qualquer possibilidade de recebermos algum ataque”, disse Damasceno. Confira.

Qual a importância do início da produção do Gripen na unidade da Embraer?

A criação de uma linha de montagem no Brasil com uma quantidade considerável de aviões – 15 num universo de 36 – é muito significativa dentro desse contrato inicial com a Saab que vai compor a primeira linha da nossa defesa aérea. Estamos muito satisfeitos. A relação entre a Embraer e a Saab é cada vez mais sadia e produtiva. A Embraer tem ido à Suécia e a Saab vindo ao Brasil com frequência. Nesse início da produção no Brasil, temos expectativa de colocar o avião em operação entre 2024 e 2025. A Embraer vai criar uma escala importante de produção.

A Força Aérea se tornou uma vitrine para os aviões e parcerias da Embraer?

Todo produto militar da Embraer sempre teve como vitrine e mola propulsora a FAB. Essa parceria vem desde a criação da Embraer, como um braço da Força Aérea. Ozires Silva e sua equipe criaram primeiro um avião, o Bandeirante, para depois criar uma empresa, e a partir dali temos inúmeros projetos. O primeiro avião pressurizado da Embraer foi uma aeronave militar, e depois isso foi transportado para a aviação civil. Também com o primeiro avião a jato, que depois vai para a família do jato 145. Essa relação é de termos um produtivo laboratório que é muito importante para a Embraer, a Força Aérea e o Brasil.

Isso também contribui com a imagem da FAB?

Sem dúvida. Até o ‘aer’ do nome da Embraer tem ligação direta com a Aeronáutica, mas hoje a empresa também tem ligação com a Marinha e o Exército, como tem que ser. Uma empresa que tem muitos contratos com as forças e traz muitas outras empresas de porte médio para grande, o que contribuiu e muito para a indústria nacional.

Como aumentar o conteúdo nacional no Gripen?

Quando fizemos os primeiros contatos com a Saab era mais uma aquisição do que parceria. Mas nada como conversar e negociar. Com o tempo, fomos colocando elementos nacionais lá. O grande exemplo é o painel que foi desenvolvido por uma empresa nossa, do Sul do país, que seria implementado inicialmente apenas nas nossas aeronaves, mas hoje as aeronaves suecas também o utilizarão.

Na verdade, esse projeto é exemplo de parceria binacional e o exemplo maior da transferência de tecnologia acontece na Embraer em Gavião Peixoto. Montar uma linha de aeronaves de última geração no Hemisfério Sul, com uma empresa do porte da Embraer, é um ganho para todo o país. É criação de emprego em larga escala e de aumentar o emprego no sentido militar das aeronaves na defesa aeroespacial do nosso país.

Como será empregado o caça Gripen pela Aeronáutica?

A visão constitucional da FAB não é de ataque. Nós somos uma força de defesa, mas quem se defende tem que se armar também, para manter a soberania do espaço aéreo. A FAB divide a sua missão em três grandes atividades: defender, controlar e integrar. Fazemos a defesa do espaço aéreo usando aeronaves desse porte e temos ainda o F-5 e temos que ampliar a nossa capacidade de defesa do espaço aéreo. Essa é uma atividade dissuasória. Você tem que ter armamentos que desmobilize qualquer possibilidade de recebermos algum ataque.

Outra atividade é o controle do espaço aéreo. Temos no Brasil quatro centros integrados de defesa área e controle de tráfego aéreo. Quem controla os aviões civis é a Força Aérea. E também cooperamos com a integração nacional. Atualmente, por exemplo, estamos juntos na Operação Yanomami, lá na Amazônia, no apoio e integração com demais forças e agências brasileiras. Essa trilogia de defender, controlar e integrar é o fulcro da nossa missão da FAB.

A FAB estuda comprar mais quatro caças no atual contrato?

Estamos analisando essa compra. A legislação brasileira permite aumentar ou reduzir em 25% o contrato, mas para isso tem que manter o preço inicial. Só que episódios como a Guerra da Ucrânia aumentaram e muito os custos de alguns produtos, como o alumínio, por exemplo. Então, por enquanto, estamos analisando a aquisição dessas quatro aeronaves adicionais. Por hora, a empresa não pode garantir o preço, mas estamos perseguindo porque temos interesse de aumentar ainda nesse primeiro contrato, cuja previsão de entrega é até 2027.

Há chance de um segundo contrato de aquisição com a Saab?

O estado maior da Aeronáutica faz uma análise futura e estamos analisando a possibilidade de um segundo lote. O número [de aviões] ainda está sob análise. Quarenta seria um número ideal para esse primeiro lote, mas o Brasil precisa de mais aeronaves.

O país opera cerca de 50 aeronaves F-5, que na época foi um número adequado, e tivemos depois os nossos Mirage. Fizemos aquisição de 12 Mirage 2000 para suprir essa lacuna durante desativação do Mirage 3.

O Gripen foi a melhor escolha?

O Gripen participou de uma lista com outros dois aviões maravilhosos [F-18 Hornet dos EUA e Rafale da França], mas na nossa análise de custo-benefício, capacidade de armamento e principalmente a transferência de tecnologia, foi o que fez a nossa comissão, naquele momento, definir como a mais adequada para a nossa situação.

O fato de o Brasil não participar de guerras influenciou na escolha do avião?

Essa é uma questão momentânea. Não é por isso que vamos deixar de ter Forças Armadas bem equipadas. Não há país do mundo com a potência e a economia como o Brasil que não tenha Forças Armadas completa, buscando cada vez mais tecnologia e atualizar seus produtos. Não existe a possibilidade de se pensar em não guerra para não se ter equipamentos de defesa.