O maior estímulo para cometer faltas é a esperança de impunidade.
Essa frase acima é atribuída ao filósofo romano Cícero. Ele viveu entre os anos de 106 e 43 antes de Cristo, mas a afirmação segue válida até hoje.
Essa reflexão é extremamente importante no Brasil atual. Nos últimos quatro anos, observamos uma infinidade de ataques ao Estado Democrático de Direito. Durante todo o governo Bolsonaro, a paz pública foi atormentada por meio de uma incessante ofensiva contra a sociedade e as instituições.
A não reeleição do presidente trouxe um alívio para quem acredita que a democracia é o melhor caminho sempre. Deixou o clima menos pesado para quem defende o diálogo e o respeito entre os diferentes. Mas, se queremos minimizar o risco de que esse caos se repita num futuro não tão distante, identificar os crimes que foram cometidos nesse período e punir os responsáveis é algo extremamente necessário.
A conclusão do inquérito das milícias digitais, por exemplo, é vital para nossa democracia. Essa apuração concentra parte significativa de outro inquérito, o das fake news, que foi aberto ainda em 2019, na primeira resposta significativa do Judiciário contra os ataques às instituições e a propagação de desinformação de forma orquestrada. A essa investigação foram somados outros episódios, como os atos antidemocráticos de 2020, o ataque sem provas às urnas eletrônicas feito por Bolsonaro em uma live de julho de 2021, o vazamento do caso do ataque hacker ao sistema do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e também a disseminação de mentiras sobre a vacina contra a Covid-19.
Durante a eleição, esse inquérito também recebeu o caso da denúncia sem provas da campanha de Bolsonaro sobre fraude nas inserções eleitorais em rádios do Nordeste.
E nem tudo se resume a esse inquérito. Fora dele, há uma série de outros casos que também não podem passar impunes. Como o da deputada federal reeleita Carla Zambelli, que sacou uma arma para um homem negro durante uma discussão sobre política. Ou do uso da PRF (Polícia Rodoviária Federal) para realizar operações que afetaram o transporte público de eleitores em regiões em que Bolsonaro tinha menos voto. Ainda vale citar os empresários que financiaram bloqueios golpistas nas rodovias após o resultado do segundo turno. E também a ordem bastante suspeita, dada logo após a derrota nas urnas, para que os computadores do Palácio do Planalto fossem formatados.
Não se trata de uma caça às bruxas. Pelo contrário, tudo isso deve ser feito respeitando o devido processo legal. Mas sem anistia. Sem impunidade. Permitir que todos esses episódios sejam esquecidos, sem punição, é dar sinal verde para que se repitam em breve.