Motoristas e cobradores recolheram os ônibus em São Paulo e iniciaram paralisação após as empresas adiarem o pagamento do 13° salário. O movimento começou na tarde desta terça-feira (9) e foi ganhando adesão de diversas viações.
Devido à greve, a prefeitura anunciou a suspensão do rodízio de veículos na tarde desta terça. A paralisação se transformou em uma guerra de versões entre prefeitura e empresas.
Segundo a SPTrans, aderiram à greve as viações Ambiental, Campo Belo, Express, Gato Preto, Gatusa, Grajaú, KBPX, Metrópole, Mobibrasil, Movebuss, Sambaíba, Santa Brígida, Transppass, Transunião e Via Sudeste. Ao todo, 3,3 milhões de passageiros foram afetados.
As empresas responsáveis pelo transporte coletivo na cidade enviaram pela manhã uma carta ao sindicato dos motoristas e trabalhadores em transporte rodoviário urbano pedindo mais prazo para realizar o depósito. Após uma negociação anterior, ele estava previsto para esta sexta-feira (12).
O prefeito Ricardo Nunes (MDB), que se disse surpreso com a greve, convocou lideranças do sindicato, que defende os interesses dos funcionários, e os donos das empresas de ônibus para uma reunião.
"Todos os pagamentos da prefeitura às empresas de ônibus estão em dia, rigorosamente em dia. É inaceitável essa paralisação, e podemos pedir a caducidade do contrato com essas empresas", afirmou o prefeito.
Segundo o presidente do sindicato, Valdemir dos Santos Soares, a proposta desagradou a parte dos funcionários, que começou a recolher os ônibus para as garagens e interromper o atendimento à população.
O sindicato planeja realizar assembleias na madrugada desta quarta-feira (10) para discutir o pedido das empresas. Há possibilidade de uma greve formal ser votada.
A paralisação começou na garagem da viação Sambaíba, no Tremembé, na zona norte na capital. Logo, na estação Tucuruvi, por exemplo, os passageiros começaram a ser avisados sobre a situação.
Também havia registros de falta de ônibus nos terminais Grajaú e Campo Limpo, ambos na zona sul. Por lá, parte da frota é operada pela SPTrans, controlada pelo município.
Em grupos no WhatsApp, os motoristas estão sendo orientados por líderes sindicais a obrigar o desembarque de passageiros.
Em pouco tempo, a manifestação teve reflexo em todas as regiões da cidade. No mapa de fluidez do transporte coletivo da Sptrans das 17h53, a maioria das vias estava congestionada. As vias em verde são classificadas como rápidas, nas quais a velocidade do trânsito é igual ou superior a 20 km/h. As amarelas são moderadas, com velocidade entre 15 km/h e 19 km/h. E as vermelhas são lentas, abaixo de 15 km/h.
A paralisação fez com que o índice de congestionamento na cidade atingisse 1.374,3 km às 18h30 e 1.486,1 km às 19h, recordes do ano.
Essa marca está próxima do recorde histórico, de 9 de agosto de 2024, quando foram registrados 1.510 km de vias congestionadas na capital.
A região com mais trânsito às 19h era a oeste, com 389,9 km, seguida pelas regiões sul (387,6 km), leste (312,6 km), norte (264,9 km) e centro (94,7 km).
O maior engarrafamento até então havia sido registrado às 19h do dia 8 de agosto, quando o anda e para chegou a 1.335 km devido a uma tempestade. Esses recordes de trânsito na cidade de São Paulo valem desde que a CET, em parceria com o aplicativo Waze, passou a considerar no cálculo 20 mil km de ruas e avenidas da capital, em março de 2023.
No terminal Parque Dom Pedro 2º, um dos maiores da cidade, alguns passageiros esperavam seus ônibus para casa no início da noite, mesmo sabendo que eles poderiam não chegar.
A operação seguiu normal em algumas linhas. Outras não funcionavam havia mais de uma hora.
É o caso da utilizada por Claudia Ferreira, 55, que vai para São Mateus. "Não sei o que faço. Uber não dá pra pagar." Um carro por aplicativo para o bairro, que normalmente custa R$ 55, segundo ela, está R$ 240, aproximadamente.
Muitos paulistanos têm optado pelo sistema sobre trilhos para chegar em casa. A estação da Sé, também no centro, tem filas para passar pela catraca e entrar num vagão pode demorar.
No Metro, as escadas rolantes que dão acesso à estação Vila Prudente, da linha 15-prata do monotrilho, foram desligadas em razão de excesso de passageiros. Mensagens no sistema de som informavam que a medida ocorria para conter o alto fluxo de pessoas por causa da greve de ônibus.
Na avenida Paulista, principal via da cidade, as portas de shoppings e lojas viraram pontos de concentração para embarque em carros de aplicativo e de carona.
Em frente ao Conjunto Nacional, Gabriel Teixeira, 24, esperava por seu pai, que vinha de Diadema, por volta das 19h15. "Foi o único jeito que encontrei de sair daqui", disse.
Alguns ônibus ainda passam pela avenida. Todos lotados. A reportagem perguntou ao motorista de um deles se ele não paralisaria. Ele respondeu que fazia sua última viagem do dia.
De acordo o sindicato dos motoristas, o atraso no pagamento do 13º salário está atrelado ao processo de revisão quadrienal dos contratos de concessão das empresas de ônibus, que, conforme diz, será julgado nesta quarta-feira (10) pelo TCM (Tribunal de Contas do Município).
O processo, conforme a corte de contas, não está na pauta desta quarta.Entretanto, o regimento interno prevê a possibilidade de inclusão para julgamento sem publicação prévia, em situações excepcionais, caso haja deliberação nesse sentido.
Segundo a SPUrbanus (Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo), as empresas têm mantido diálogos constantes com a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Transporte para finalizar os acertos para a revisão quadrienal dos contratos firmados com o município, "recompondo o equilíbrio econômico-financeiro do sistema, de forma a se evitar qualquer movimento paredista dos trabalhadores do transporte coletivo, que venha a causar prejuízos à população que depende desse serviço essencial e estratégico".
Em nota, o sindicato patronal afirma que as empresas operadoras associadas à entidade "não estão poupando esforços para honrar com suas obrigações trabalhistas com os empregados do setor, inclusive solicitando um maior prazo para o pagamento do 13º salário, em conformidade com o que a legislação estabelece".
Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirma que os repasses às empresas de ônibus estão em dia e o pagamento do 13º salário dos trabalhadores é de responsabilidade exclusiva das concessionárias.
No texto, a Secretaria Municipal de Transportes e Mobilidade e SPTrans afirmam que, a pedido de Nunes, registraram boletim de ocorrência contra as empresas que aderiram a "uma paralisação sem aviso prévio, ferindo gravemente a legislação".
A gestão afirma ainda que se solidariza com todos os usuários que dependem do transporte público e que hoje sofrem com o descaso, irresponsabilidade e falta de compromisso dessas companhias com a população.
Em vídeo, o prefeito afirmou que o reajuste quadrienal "nada tem a ver com a obrigação de todos os empresários de pagarem em dia seus colaboradores". "A questão desses empresários irresponsáveis, quem vai tratar com eles sou eu", disse.
Na semana pasada, ao ser questionado sobre possível reajuste na passagem de ônibus, a partir de janeiro próximo, Nunes afirmou que a revisão quadrienal pode influenciar na decisão sobre aumento das tarifas, mas que era cedo para falar do assunto.
Passageiros que precisam de transporte ferroviário também enfrentam uma terça-feira difícil. Por volta das 14h55, a linha 11-coral registrou falha de sinalização entre as estações Palmeiras-Barra Funda e Luz.
Enquanto as equipes de manutenção da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) atuam no local, alguns trens estão circulando até a Luz, sem seguir até a Barra Funda.
Os trens do Expresso Aeroporto também embarcam e desembarcam da estação da Luz desde as 16h. Não há alteração nos intervalos programados para o horário de pico entre as estações da Luz e Estudantes. "A CPTM pede desculpas pelos transtornos causados aos passageiros".
Com tantos problemas no transporte coletivo, os cidadãos que tentam pedir um carro de aplicativo acabam levando outro susto, com valores muito acima do normal para o horário, devido ao que é chamado de preço dinâmico, quando o valor aumenta com a demanda.