Narizinho, Pedrinho e Emília nasceram da imaginação do genial escritor taubateano Monteiro Lobato (1882-1948) e encantaram o mundo.
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Mas havia uma menina que encantava Lobato mais do que as suas criações. Era a pequena Joyce Campos, neta do escritor e que disse ter aprendido com o avô “tudo o que uma criança não deveria fazer”.
Joyce Campos Kornbluh – sobrenome herdado do marido Jorge – morreu nesta sexta-feira (26), aos 94 anos. A informação foi confirmada pela filha Cleo Monteiro Lobato nas redes sociais.
ESTADOS UNIDOS
Ela nasceu em Nova York em 1930 quando o avô trabalhava como adido comercial nos EUA. Os pais Martha Lobato Campos e Jurandir Ubirajara Campos, este ilustrador do The New York Times, não queria sair dos estados Unidos. Mas, por conta da Revolução de 32, resolveram voltar. Joyce tinha dez meses.
No Brasil, Joyce pode conviver com o avô escritor e contador de histórias, que ela tinha o privilégio de escutar e se deleitar, além de inspirar Lobato. O escritor era chamado de Juca pela menina e familiares.
A história de ambos é contada no livro “Juca e Joyce - Memórias da neta de Monteiro Lobato” (2007), da escritora, jornalista e historiadora Márcia Camargos.
“A menina travessa e curiosa foi ouvinte das histórias que ele ia criando. Suas ideias mirabolantes e palpites engraçados eram muitas vezes incorporados aos textos do avô carinhosamente chamado de Juca”, diz texto sobre a obra.
DETALHES DE LOBATO
O livro revela aspectos desconhecidos de Lobato, como seus pratos prediletos, as leituras de cabeceira, os filmes, os artistas e os programas de rádio que mais apreciava.
A área de Museus de Taubaté informa que Joyce foi uma grande divulgadora da obra de Lobato e uma grande responsável por manter viva a memória do escritor, trabalho herdado pela filha de Joyce e bisneta do taubateano, Cleo Lobato.
Em entrevista ao jornal da Unicamp, em 2000, Joyce falou sobre o relacionamento com o avô famoso. Segundo ela, ser neta de Lobato é “uma das profissões mais difíceis do mundo”.
Ela contou que a relação com o avô não se deu como a maioria das pessoas imagina. Além de viajar muito, como durante a campanha do petróleo, Lobato não era do tipo afetuoso. “Nunca me pôs no colo”, disse Joyce.
OBRA
No entanto, ela garantiu que a falta de um avô que a embalasse não impediu de respeitar e venerar a figura de um homem aventureiro e divertido.
“Só tive noção da dimensão da obra dele depois de sua morte. A gente admira o avô porque é avô, não porque é Monteiro Lobato”, afirmou.
Joyce contou que se lembrava de Lobato como um homem que não se abalava e cuja teoria era simples: “Ele dizia que ‘remédio pra tudo, é chapéu’. Diante de um problema, protegia a cabeça do sol e saía para caminhar e pensar na vida”.
Quando voltou ao Brasil, Joyce estudou numa escola americana em São Paulo. No último ano, uma professora fã de Lobato descobriu o parentesco e fez Joyce a fazer o papel de Tia Anastácia numa peça. Os desenhos e os figurinos foram todos desenhados por ela. E ainda convidaram Lobato para assistir. Em 1941, Joyce foi para o Mackenzie formar-se arquiteta.
“Não foi uma relação intensa, como todo mundo pensa. Houve épocas em que ela foi próxima, em outras não. Ele vivia viajando, principalmente durante a campanha do petróleo. Ele morava na casa dele, eu na dos meus pais. Meu avô nunca foi afetuoso”, disse ela na entrevista à Unicamp.
“A sensibilidade que demonstra na obra é uma coisa. Todos pensam que, por ele ter escrito para crianças, era aquele avô que mima. Mas não. Ele me tratava como adulta. Tinha conversas que obrigavam, a mim e a outras crianças, a pensar. Muita gente viu foto dele com crianças no colo e acha que ele era assim. Mas nunca fiquei no colo dele. Aquilo era pose para fotografia.”
E completou Joyce: “Ele gostava de crianças, mas quando elas eram inteligentes, falantes, até pernósticas. Eu tinha muito ciúme das outras meninas. Passeávamos juntos, mas nunca de mãos dadas. Primeiro, porque eu saía correndo, e outra porque ele não era disso. Meu avô nunca me deu bronca, nunca se exaltou comigo e eu era uma criança tremendamente reinadeira. Não era malcriada, mas tinha imaginação fértil para fazer coisas esquisitas”.
Sobre a obra de Lobato, Joyce contou que leu tudo, “o que devia e o que não devia”.
“Há livros que não li totalmente, porque participei da confecção. Eu tinha outro hábito, de dormir com ele e minha avó, na cama deles, mesmo depois de grandinha, já com 11, 12 anos. E meu avô lia trechos dos livros que estava escrevendo, perguntando o que a gente achava. Então, esses eu não li, porque já sabia o que ia acontecer. ‘Reforma da Natureza’, por exemplo, li bem mais tarde – na época achei que era dona do livro, tipo de besteira que criança inventa”, afirmou.