A oposição ao governo Anderson Farias (PSD) na Câmara de São José dos Campos apresentou um projeto que visa impedir a aplicação de uma lei municipal de 2017 que permitiu, nos primeiros sete anos de vigência, a utilização de R$ 1,592 bilhão de aplicações financeiras do IPSM (Instituto de Previdência do Servidor Municipal) para abater de aportes que a Prefeitura de São José dos Campos deveria ter feito ao órgão.
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Segundo o projeto apresentado pela vereadora Dulce Rita (União), a lei não poderia ser aplicada quando houver "déficit atuarial do Regime Próprio da Previdencia Social do Muncipio de São José dos Campos".
O déficit atuarial citado no projeto ocorre quando a projeção dos resultados do órgão previdenciário para os próximos 35 anos é negativa. Isso foi apontado no último estudo atuarial, encomendado pelo IPSM em 2023. Em São José, desde 2011, a previdência é dividida em dois grupos. No grupo 1 (plano financeiro, dos servidores mais antigos), o déficit entre 2024 e 2058 seria de R$ 5,795 bilhões. No grupo 2 (plano previdenciário, dos servidores que ingressaram após 2011), haveria superávit de R$ 1,5 bilhão no período.
Ou seja, caso o projeto seja aprovado, a lei municipal de 2017 não poderia ser mais aplicada - ao menos, enquanto esse déficit não for sanado.
A Assessoria Jurídica da Câmara apontou que o projeto seria inconstitucional. Segundo o órgão técnico, "por tratar de organização administrativa e destinação de receitas financeiras de entidade da administração pública indireta local", apenas o prefeito poderia apresentar propostas dessa natureza. Além disso, a Assessoria Jurídica afirmou que, por implicar "gastos ao erário municipal", a propositura deveria ter sido acompanhada de "estudo de impacto orçamentário-financeiro", o que não ocorreu.
O parecer da Assessoria Jurídica não impede a tramitação do projeto, que passará pela análise das comissões de Justiça, que é dominada pela oposição, e de Economia, na qual o governo tem maioria. Caso alguma das comissões emita parecer favorável, a proposta poderá ser votada em plenário.
Lei de 2017.
Antes da lei em questão, que é de autoria do ex-prefeito Felicio Ramuth (PSD), que é o atual vice-governador de São Paulo, o cálculo de eventual aporte era simples: a Prefeitura precisava fazer repasses mensais ao instituto sempre que a receita do órgão (essa parte vem da contribuição descontada em folha, que atualmente é de 14% para servidores e 28% para o poder público, como Prefeitura e Câmara) fosse inferior à despesa (valor gasto para o pagamento de aposentados e pensionistas).
Para reduzir a necessidade dos aportes, a lei de outubro de 2017 passou a permitir que, de eventual diferença entre receita e despesa, seja deduzido o excedente financeiro (tudo que o IPSM obtiver além da meta com suas aplicações de recursos) ou dois terços do total de rendimentos (correção monetária e juros das aplicações do instituto).
Apenas de outubro a dezembro de 2017, por exemplo, essa lei serviu para abater R$ 23,5 milhões de possíveis aportes. Em 2018 foram R$ 215,4 milhões. Em 2019, R$ 334 milhões. E em 2020 o maior valor, de R$ 394,7 milhões. A partir de 2021, houve uma redução de patamar. O valor abatido naquele ano foi de R$ 151,4 milhões. E 2022, de R$ 171,8 milhões. Em 2023, de R$ 167,1 milhões. E esse ano, até setembro, de R$ 134,5 milhões.
Dívida.
Essa redução coincide, justamente, com a dívida contraída pelos governos do ex-prefeito Felicio e do atual prefeito, Anderson Farias (PSD), com o IPSM. Como o uso do excedente financeiro e dos dois terços dos rendimentos deixou de ser suficiente para equilibrar as contas do instituto, passou a ser necessário que a Prefeitura realizasse aportes mensais ao órgão, mas os repasses não têm ocorrido no patamar devido.
De janeiro a outubro de 2021, por exemplo, a Prefeitura deixou de repassar R$ 165,9 milhões ao instituto. Em junho de 2022, após aval da Câmara, foi assinado acordo para que esse montante seja pago em 20 anos. Em janeiro de 2024 foi assinado novo acordo, dessa vez para quitar em cinco anos uma dívida de R$ 320,3 milhões referente a repasses não efetuados de novembro de 2021 a dezembro de 2023.
Além disso, de junho a setembro de 2024, a Prefeitura já deixou de repassar mais R$ 56,3 milhões ao IPSM - ainda não foi firmado novo acordo para quitar essa dívida.
Patrimônio.
Quando a lei entrou em vigor, em outubro de 2017, o patrimônio do instituto, que é uma espécie de poupança do órgão, estava em R$ 2,14 bilhões (valor que, corrigido pela inflação, representaria hoje R$ 3,08 bilhões). No último balancete, de setembro de 2024, chegou a R$ 1,4 bilhão. Ou seja, em sete anos, o patrimônio teve uma queda de 54,45% (de R$ 1,677 bilhão).
Em junho de 2022, durante audiência pública, o superintendente do IPSM, Devair Pietraroia da Silva, culpou a lei criada em 2017 pela queda no patrimônio do instituto.
"Qual é o motivo da queda do patrimônio? É a utilização dos dois terços dos rendimentos. É simples esse cálculo. Se você utiliza dois terços do rendimento todo mês para cobrir parte do aporte, a tendência do patrimônio é ir caindo, não é subir. Se fosse ao contrário, se não utilizasse, esse patrimônio só subiria", disse na ocasião.