Após Israel anunciar ter matado na véspera o líder do Hamas, Yahya Sinwar, o grupo terrorista palestino confirmou sua morte nesta sexta-feira (18) e prometeu seguir em guerra contra o Estado judeu - compromisso reiterado também pelos aliados Hezbollah e Irã.
Leia também: Israel diz ter matado líder do Hamas, arquiteto do 7 de Outubro
"Choramos a morte do grande chefe, o irmão e mártir Yahya Sinwar", disse Jalil al-Hayya, porta-voz do Hamas no Qatar, onde parte de sua cúpula vive no exílio.
A facção reafirmou que não vai libertar os reféns israelenses em seu poder na Faixa de Gaza até que a guerra termine, Israel retire suas tropas do território, e os prisioneiros palestinos sejam libertados.
Com isso e a afirmação do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, de que "a guerra não acabou ainda", a sugestão feita pela Casa Branca de que a morte de Sinwar poderia abrir caminho para um cessar fogo no conflito que matou mais de 42 mil palestinos parece inócua.
Sinwar, 62, foi morto ao lado de dois outros integrantes do Hamas na região de Rafah, no sul de Gaza. "O Hamas é um movimento de libertação nacional liderado por pessoas que buscam liberdade e dignidade, e isso não pode ser eliminado", disse nesta sexta (18) à agência France Presse Basen Naim, da ala política do grupo.
"Parece que Israel acredita que matar nosso líderes significa o fim do nosso movimento", declarou. O antecessor de Sinwar, Ismail Haniyeh, vivia no exílio no Qatar e foi morto em um ataque atribuído a Israel em Teerã, no dia 31 de julho.
Sinwar era especialmente temido em Israel, onde passou 22 anos preso. Ele enganou Tel Aviv, que adotara uma política de promoção do Hamas ante a enfraquecida Autoridade Nacional Palestina, na linha "dividir para governar". Ao fim, foi o responsável por planejar o ataque de 7 de outubro de 2023, que disparou a guerra atual.
Já o Hezbollah, que virou alvo preferencial de Tel Aviv há um mês e viu quase toda sua liderança ser liquidada em ataques aéreos e com a incursão israelense no sul do Líbano, afirmou que a morte de Sinwar leva "à transição para uma nova e ascendente fase no confronto".
Em nota, o grupo, que também viu seu líder, Hassan Nasrallah, assassinado no atual conflito, disse que 55 soldados de Israel já morreram na invasão do vizinho, iniciada em 30 de setembro. Tel Aviv não tem balanço, mas anuncia quase diariamente baixas ?só na quinta (17) foram cinco mortos da unidade de elite Golani.
Apesar de falarem grosso, ambos os grupos estão em pedaços. O Hamas passou de uma força organizada comandando Gaza a um grupo insurgente, perigoso, mas incapaz neste momento de ações de grande porte como a do 7 de Outubro.
Já o Hezbollah parece ter retirado boa parte de suas forças da área do sul do Líbano onde Israel está operando, mantendo bolsões de resistência. Segundo observadores militares ouvidos pela Folha, isso pode sinalizar uma tentativa de preservar recursos enquanto o grupo busca um cessar-fogo, apesar da retórica.
Um sinal disso foram as repetidas falas de um de seus últimos líderes vivos, o número 3 do grupo, Naim Qassem, sobre a necessidade de trégua. Em uma evidência de fraqueza, o antigo rival Nabih Berri, presidente do Parlamento libanês, está a cargo de tentar negociar em nome do Hezbollah.
Por fim, ainda na noite de quinta, a missão do Irã na ONU disse que "o espírito de resistência se fortalece" com a morte de Sinwar.
A posição de Teerã, que provavelmente será alvo de uma retaliação por ter atacado Israel com 181 mísseis há pouco mais de duas semanas, é complexa. Ao perder a capacidade militar de seus principais prepostos regionais, expõe-se e vê a estratégia montada nos últimos 20 anos ser desarranjada.
Sintomaticamente, até o enfraquecido governo interino do Líbano criticou a teocracia. O premiê Najib Mikati disse nesta sexta (18) que estava "surpreso" por comentários feitos na véspera pelo presidente do Parlamento do Irã, Mohammad Baqer Ghalibaf.
O iraniano havia dito ao jornal francês Le Figaro que seu país poderia negociar com Paris a implementação da resolução da ONU que tentou acomodar Israel e Hezbollah depois da guerra de 2006, que nunca foi respeitada pelo grupo.
"Isso é uma interferência flagrante em assuntos libaneses e uma tentativa de estabelecer uma guarda que rejeitamos sobre o Líbano", disse, resumindo a realidade política até aqui, já que os governos em Beirute nunca controlaram o Hezbollah, por sua vez agindo em consonância com as ordens de Teerã.
Em Israel, as especulações sobre o que o governo de Netanyahu irá escolher para atacar no Irã seguem. A teocracia diz diariamente que vai reagir, mas relatos na imprensa israelense sugerem que recados foram passados dizendo que uma ação contida evitaria uma guerra ampla - a exemplo da retaliação ao ataque com mísseis de Teerã em abril, o primeiro da história.
Mas há também a sugestão de que a linha-dura está estimulando o premiê a ir na jugular do regime, o programa nuclear e suas instalações petrolíferas, o que é desaconselhado publicamente pelos Estados Unidos.
A saída alternativa, um ataque a instalações militares, é o consenso entre os mais moderados, mas é incerto a essa altura o que ocorrerá.
Ainda no campo diplomático, o chanceler israelense, Israel Katz, voltou a criticar duramente o secretário-geral da ONU, o português António Guterres, que segundo ele segue "uma agenda anti-Israel e antijudia".
"Guterres não recebeu favoravelmente a eliminação do arquiterrorista Yahya Sinwar, tal como se recusou a declarar o Hamas uma organização terrorista após o massacre de 7 de Outubro. Continuaremos a designá-lo como persona non grata e proibir sua entrada em Israel", escreveu no X.