17 de dezembro de 2025
OPINIÃO

Quando o Natal perde o rosto de Cristo  


| Tempo de leitura: 2 min

O silêncio do Natal já não é o mesmo.

Onde antes havia espera, hoje há pressa.

Onde havia contemplação, agora há ruído.

As ruas se enchem de luzes, as vitrines disputam atenção, as músicas se repetem até a exaustão.

Tudo anuncia que algo grandioso está para acontecer. No entanto, paradoxalmente, quanto mais o Natal se aproxima, mais difícil parece encontrar Aquele que deveria ser o centro de tudo. O Menino Deus vai desaparecendo em meio ao excesso. E essa ausência dói.

Para a fé católica, o Natal é o coração da esperança cristã. É o momento em que Deus rompe o silêncio da história e se faz carne. Não nasce com alarde, não ocupa manchetes, não exige holofotes. Nasce pobre, vulnerável, dependente. O Filho de Deus aceita o limite humano para revelar que o amor verdadeiro não se impõe, se oferece. O Natal é, antes de tudo, um mistério a ser acolhido, não um produto a ser consumido.

O consumismo, porém, tem outra lógica. Ele não sabe esperar, apenas exige. Não convida ao silêncio, mas à comparação. Ele ensina que o valor das pessoas está no que conseguem comprar e no que conseguem oferecer. O Natal passa a ser medido por sacolas, por ceias fartas, por presentes cada vez mais caros. A alegria, que deveria brotar do encontro, é substituída pela ansiedade. A gratidão dá lugar à frustração. E o nascimento de Cristo se torna um detalhe quase decorativo.

Não se trata de rejeitar os gestos concretos de afeto. Presentear faz parte da linguagem humana do amor. O problema surge quando o gesto perde o significado e se transforma em obrigação social.

Quando o presépio é menor que a árvore.

Quando a manjedoura é menos importante que a vitrine.

Quando sabemos exatamente o dia da promoção, mas já não sabemos narrar o Evangelho do nascimento de Jesus.

Nesse cenário, o Papai Noel assume o protagonismo. Uma figura simpática, carismática, amplamente explorada pelo mercado. Ele promete recompensas, distribui bens, alimenta fantasias. Mas não salva. Não questiona. Não convida à conversão. Cristo, ao contrário, nasce sem prometer conforto. Ele não entrega coisas, entrega sentido. Não oferece consumo, oferece vida. Seu nascimento não nos infantiliza; nos responsabiliza.

Talvez por isso o consumismo seja tão incompatível com o Natal cristão. Porque o Deus que nasce em Belém desmonta todas as lógicas de poder, acúmulo e aparência. Ele revela que a verdadeira riqueza está na doação, que a grandeza se esconde na pequenez e que a alegria mais profunda não se compra.

Recuperar o sentido do Natal é um gesto profundamente contracultural.

É escolher menos barulho e mais silêncio.

Menos pressa e mais presença.

Menos vitrines e mais presépio.

Enquanto houver menos Cristo e mais marketing, menos Evangelho e mais consumo, o Natal continuará existindo no calendário, mas não necessariamente no coração dos que dizem crer. E essa é, talvez, a maior tristeza deste tempo.

Samuel Vidilli é cientista social