07 de dezembro de 2025
OPINIÃO

Verborreia de clichês


| Tempo de leitura: 3 min

Já sabemos que o ambiente de salão de beleza, do cabeleireiro e das manicures é permeado por fofocas, sejam elas das novelas, ou da vida alheia, as cores das roupas para o próximo verão, lançamento de novos cremes hidratantes, shampoos, etc, etc, etc. Bem o conteúdo conhecemos de cor, mas a forma como ouvi serem descritos, neste último fim de semana, foi estarrecedor. Uma verborreia de clichês, frases feitas, ou retiradas das mídias sociais, sem filtro.

Uma cliente falou durante uma hora, sem parar, sobre tudo e todos. Sem pausa para uma pequena vírgula ou algum intervalo um pouco mais demorado para se mudar de linha e iniciar um novo parágrafo... emendava um assunto no outro, imaginando-se atualizada, empática e informada... ledo engano!

Tempos de internet. Imediatamente, me lembrei do escritor, filósofo e semiótico, Umberto Eco, aquele que escreveu o livro, O Nome da Rosa, entre outros. Ele disse o seguinte, numa célebre entrevista concedida à Universidade de Torino, em junho de 2015: “As redes sociais deram voz a uma legião de imbecis que antes falavam apenas no bar, depois de um copo de vinho, e não causavam dano à coletividade. Agora, eles têm o mesmo direito de palavra que um prêmio Nobel.”
 
A crítica de Umberto Eco é muito pertinente nos dias atuais. Estamos presenciando o nivelamento (para baixo) dos conteúdos produzidos pelo público em geral e promovido pelas plataformas digitais. Para ele, “a palavra constrói realidades por meio do discurso político que cria crenças; organiza a memória coletiva já que a história é narrada por palavras; define identidades pelo modo como nomeamos algo.” Em síntese, “quem controla o significado das palavras, controla o mundo.”

O que presenciei neste fim de semana comprovou o que Eco disse: “o esvaziamento da palavra, pela banalização nas redes, pela repetição automática ou pelo discurso publicitário vazio, é também o esvaziamento do pensamento. Quando a palavra perde profundidade, a cultura se torna superficial e a comunicação vira apenas ruído.” 

Talvez o mais grave seja a confiança performática que as mídias sociais promovem, favorecendo a ascensão de desinformados carismáticos, com conteúdo sem fundamento, o chamado Efeito Dunning-Kruger. São “pessoas com baixo nível de competência em uma área que superestimam suas próprias habilidades, enquanto pessoas realmente competentes tendem a subestimar sua capacidade. Quanto menos alguém sabe, mais acredita que sabe, e, quanto mais alguém sabe, mais consciência tem do quanto ainda ignora,” segundo definição do autor.

As redes funcionam como amplificadores de autoconfiança e sistemas de recompensa imediata como likes, views, seguidores, o que reforça a fala dos que menos sabem, mas se expressam com convicção; desestimulando o diálogo qualificado, pois o tempo de reflexão não é premiado e cria uma ilusão de sabedoria coletiva, onde opinião e conhecimento têm o mesmo peso.

A autoridade simbólica da palavra, antes conquistada pelo estudo e pela experiência, na qual o saber passava pelos filtros dos professores, editores, jornalistas ou cientistas, foi substituída pela autoridade do engajamento e o filtro é o algoritmo, ou seja, quem fala mais alto ou é mais visível parece “saber mais”. Há uma completa inversão de valores, que transforma a opinião em verdade provisória, o especialista em suspeito e o ignorante confiante em influenciador.

É o que temos para hoje.


Rosângela Portela é jornalista, mentora e facilitadora