Acabo de ler a “Exortação Apostólica ‘DILEXI TE’ DO SANTO PADRE LEÃO XIV SOBRE O AMOR COM OS POBRES”, que me foi enviada por Dom Arnaldo Carvalheiro Neto, Bispo de nossa Diocese, que me é muito querido.
Uma reflexão intensa e profunda, que nos remete para o verdadeiro cristianismo. Como é explicado no início, o Papa Francisco preparava uma Exortação Apostólica sobre o cuidado da Igreja pelos pobres, intitulada “Dilexi te”, imaginando Cristo a dirigir-se a cada um deles dizendo: “Tens pouca força, pouco poder, mas ‘Eu te amei’ (Ap 3,9). O Papa Leão XIV a assumiu, acrescentando reflexões suas, partilhando o desejo de seu Predecessor de que todos os cristãos possam perceber a “forte ligação existente entre o amor de Cristo e o seu chamamento a tornarmo-nos próximos dos pobres”.
Enquanto lia a Exortação, passavam diante de meus olhos a menina, de minha idade, que conheci em 1962, abusada sexualmente pelo pai; a primeira mulher em situação de prostituição, que se tornou minha amada, em 1969; o primeiro morador de rua e o primeiro egresso da cadeia que entraram no meu coração. Em 1973, veio, para minha emoções, o menino de nove anos, cujo pai matara a mãe e seu amante e ele ali permaneceu, até o amanhecer, junto ao cadáver dos dois, cuidando da irmã menor. Com o passar do tempo, vieram tantos outros, que traziam no rosto os sinais da face ensanguentada de Jesus. Foi o Senhor que me deu a Graça, na Igreja, junto a Bispos e Padres que buscavam e buscam a santidade – eu tão miserável e na época preocupada com minha imagem - de encontrá-los e com um olhar de acolhimento enxugar um pouco os seus rostos sofridos. Recordei-me de nossos pais. Levaram-me ao Batismo e foram presença em minha caminhada na Igreja. Ela, mulher de fé, cuidou de minha avó materna na cama por 17 anos, em época que não existia fralda descartável para idoso. Jamais a ouvi murmurar. Ele, homem de crença,era saudado e pagava café para egressos que o reconheciam por, na década de 40, comprar peças de cerâmica que faziam no presídio. Fizeram parte, de maneira concreta, de minha evangelização.
O Papa Leão XIV insiste, nesta Exortação, que busquemos ser santos, reconhecendo Jesus nos pobres e atribulados. Levar escuta, presença, paciência, doçura a quem se encontra na dor, sozinho, necessitado; aos descartados pela indiferença, pela exclusão, pelos maus-tratos, pela violência, pela invisibilidade. A partir disso coloca alguns santos como exemplo de atender o grito dos pobres que se encontram em escassez material, moral, cultural, espiritual. Diz também de nosso compromisso em favor dos pobres e de fazer parte da erradicação das causas sociais e estruturais da pobreza, pois a salvação não é ideia abstrata, mas gesto concreto. Afirma que “é inegável que o primado de Deus no ensinamento a Jesus é acompanhado como princípio fundamental, segundo o qual não se pode amar a Deus sem estender ao próprio amor aos pobres”.
Dentre as citações, a de São João Crisóstomo: “Quando pretendemos honrar alguém, devemos prestar-lhe a honra que ele prefere e não a que mais nos agradas. (...) Assim deves também tu prestar-Lhe aquela honra que Ele mesmo ordenou, distribuindo aos pobres as tuas riquezas. Deus não precisa de vasos de ouro, mas de almas de ouro”.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista