O neurocientista Miguel Nicolelis propôs em uma postagem nas suas redes sociais ressignificar o 11 de Setembro. Foi nessa data, em 2001, que Osama Bin Laden coordenou o ataque com aviões que culminou na queda das Torres Gêmeas, em Nova Iorque, nos Estados Unidos.
Neste ano, outro fato histórico ocupou o mesmo dia no calendário. Também foi em um 11 de Setembro que Jair Bolsonaro foi condenado pelo STF a 27 anos de prisão por coordenar um golpe de Estado para manter-se no poder, após ser derrotado de forma legítima nas urnas.
A insurgência transformou Brasília em campo de batalha. Ao final, a democracia resistiu e saiu vitoriosa. Esse é um marco que deve ser lembrado. Pela primeira vez na história, um ex-presidente e militares de alta patente foram condenados na Justiça comum por atentarem contra a democracia no Brasil.
Sejamos francos, esse é o crime pelo qual Bolsonaro irá pagar, mas ele poderia estar sentado no banco dos réus também por outros motivos. A lista de desserviços é longa, mas quero aqui me ater àquele que considero um dos mais graves: a omissão diante da pandemia de covid-19.
Mais de 700 mil brasileiros perderam a vida durante a maior crise sanitária já registrada na história moderna. Famílias despedaçadas, que jamais se esquecerão da forma irresponsável – para dizer o mínimo – como o então presidente da República conduziu o país.
Enquanto o vírus ceifava vidas, Bolsonaro zombava do sofrimento e do pânico que se espalhou entre os brasileiros. Chamou a covid-19 de “gripezinha”, disse “eu não sou coveiro” quando as mortes se multiplicaram e zombou das vacinas com “se tomar e virar jacaré não tenho nada a ver com isso”. Palavras que ecoam como fantasmas em cada história de perda e dor.
Bolsonaro protelou ao máximo a compra de vacinas que protegeriam a população e foi crítico contumaz do lockdown, que previa o fechamento de estabelecimentos públicos e o trabalho remoto em um esforço para tentar conter a disseminação do vírus.
O resultado foi trágico. O Brasil foi um dos países com maior número de mortes por covid-19 em todo o mundo. Essa é uma dor que teremos que carregar e que tem como principal responsável Jair Bolsonaro. Talvez ele nunca seja julgado pela Justiça por esse crime, mas certamente já foi condenado moralmente pelos brasileiros.
Em memória das vítimas, Nicolelis fez uma provocação. Propôs que o 11 de Setembro seja reconhecido como o Dia em Homenagem às Vítimas da Pandemia de covid-19. Eu abracei a iniciativa e apresentei um projeto de lei na Assembleia Legislativa para incluir a data no calendário oficial do Estado de São Paulo.
Não é reparação. É respeito. Uma lembrança viva das vidas perdidas pela omissão de um governo frio que ignorou o sofrimento do povo e mostrou descaso com a vida.
Que o nosso 11 de Setembro nos ensine que esquecer é permitir que a história se repita. Que o luto de milhões de brasileiros se transforme em memória, e a memória em vigilância permanente da democracia e da vida.
Mário Maurici de Lima Morais é jornalista e deputado estadual e primeiro secretário da Assembleia Legislativa de São Paulo